24% dos internados com síndrome respiratória grave têm entre 30 e 59 anos
O aumento nas internações por síndrome respiratória aguda grave (SRAG) no País nas duas últimas semanas, entre 15 e 29 de março, aponta que o número de pessoas infectadas com o novo coronavírus deve ser maior do que o oficial – uma vez que os testes não foram concluídos e não há indício de um grande surto de outro vírus respiratório. E indica que não são apenas os idosos que apresentam um quadro severo.
Nessas duas semanas, de 11.616 internações por SRAG relatadas no sistema InfoGripe, da Fiocruz, idosos eram de fato a maioria: 2 830 tinham mais de 60 anos (24% do total). Mas o grupo entre 30 e 49 anos também chama a atenção. Eles representavam 15,5% do total (1.799 hospitalizados). Se forem somadas as pessoas de 50 a 59, a fatia sobe para os mesmos 24% dos mais de 60.
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É uma distribuição etária bastante diferente da que ocorre normalmente nas notificações de SRAG no País. Em geral, a síndrome gripal severa sazonal, que traz sintomas como febre alta, tosse e dificuldade de respirar, atinge mais fortemente as crianças com menos de 2 anos.
No ano passado, nessas mesmas duas semanas, elas respondiam por 55% dos casos de internação (1.062 de um total de 1.910 casos). Já o grupo acima de 60 anos representava apenas 9,8%. Os mais jovens, de 30 a 49 anos, ficaram menos doentes ainda: eram só 6,7% do total.
Neste ano há um número absoluto de hospitalização dos menores de 2 anos próximo ao do ano passado: 902. Mas isso responde por só 7,8% dos casos totais, indicando uma confirmação da tendência mundial de que o coronavírus afeta menos os pequenos. “O número de casos em crianças neste ano está seguindo o padrão que já estava sendo observado desde o início do ano e em temporadas anteriores”, explica o pesquisador Marcelo Gomes, coordenador do InfoGripe.
Os dados totais de internações estão sendo atualizados diariamente. No balanço do Ministério da Saúde divulgado nesta quinta-feira, as duas últimas semanas já somavam mais de 14.265 internações por SRAG no Brasil, mas não foram indicadas faixas etárias. Dessas, o governo confirmou como coronavírus apenas 1 143, mas a maioria dos demais ainda não foi testada ou aguarda resultado.
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Médicos
As estatísticas do InfoGripe, apesar de um pouco desatualizadas, ajudam a ilustrar relatos de médicos que estão na linha de frente dos tratamentos. Eles afirmam com espanto que têm internado um número considerável de pacientes jovens, alguns deles sem nenhuma comorbidade, que desenvolvem quadros graves. Mesmo nem sempre chegando a óbito – de acordo com o ministério, 89% de 256 óbitos em decorrência da covid-19 até esta quinta tinham mais de 60 anos -, os jovens estão com síndromes gripais graves e demandando leitos hospitalares. O governo informou que 39 dos 256 não tinham nenhuma comorbidade e 23% deles tinham menos de 60 anos.
“É uma percepção coletiva de que o padrão no Brasil, pelo menos até agora, está diferente do que vimos na China ou na Itália, por exemplo”, afirma a intensivista Viviane Cordeiro Veiga, coordenadora de unidade de terapia intensiva da BP (Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo). “É uma surpresa vermos jovens evoluindo a casos graves.”
Alexandre Biasi, que é intensivista e pesquisador do HCor e marido de Viviane, relata um quadro semelhante. “Pelas estatísticas internacionais, não esperávamos internar paciente de 40 anos muito graves. Mas estamos fazendo isso. Ainda não sabemos por que essa diferença. Pode ser que isso ocorra porque os primeiros casos foram mais de viajantes, que tendem a ser mais novos, e isso mude quanto mais transmissão comunitária tivermos. Devem aumentar muito os casos nas próximas semanas e pode ser que tenha um perfil diferente mais para frente, com bem mais idosos”, complementa.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, a também intensivista Amanda Veiga, do Hospital Geral do Grajáu, afirmou ter recebido pacientes de 40, 45 anos sem nenhuma outra doença que tiveram quadros tão graves quanto o de idosos. “Essa história de que jovens não apresentam quadros graves a não ser que tenham alguma doença associada ainda é um território bem desconhecido para a gente afirmar”, contou.
“Por isso não concordo em acabar com a quarentena agora. Porque não sabemos. Não dá para correr o risco de pegar e esperar que seja uma forma leve”, afirma a médica, que conta já ter perdido nas últimas semanas pacientes jovens e idosos com suspeita de covid-19, mas que ainda não foram confirmados com a doença.
Natal
Nesta semana, a Secretaria Municipal de Saúde de Natal, no Rio Grande do Norte, confirmou a morte de um homem de 23 anos pelo novo coronavírus, a vítima mais jovem relatada até agora no Brasil. Matheus Aciole morreu em um hospital privado da capital potiguar. De acordo com as autoridades locais de saúde, Aciole era obeso e apresentava pré-diabete, fatores considerados de risco para o coronavírus.