A década de 2020 pode ser diferente

28/12/2019 12:29

Na década de 1970, o musical “Brasileiro, Profissão: Esperança”, encenado com Paulo Gracindo e Clara Nunes, celebrava a obra de Antônio Maria e Dolores Duran com grande sucesso de público. De Paulo Gracindo, ainda me lembro de sua resposta numa entrevista sobre que papel desempenhava no início de sua carreira. A resposta veio com a saúde mental de quem é capaz de rir de si mesmo: “Um papelão, minha filha!” Clara Nunes tinha uma voz que nos encantava por sua intensa brasilidade, timbre envolvente e qualidade de seu repertório. Antônio Maria foi um jornalista que nos deixou letras inesquecíveis. Dolores Duran foi também letrista, e ainda cantora e musa da dor de cotovelo de alto nível como “A noite do meu bem”, dentre muitas outras.

E cá estamos nós, diante de um ano novo e nova década, carregados da mesma esperança de meio século atrás. Será que somos, mesmo, profissionais da eterna Esperança? Esta palavra não significa apenas ficar esperando. Ela vem do verbo esperançar que nos aponta caminhos como almejar, buscar e agir. Neste sentido, esperança tem conteúdo forte. Trazê-la em nosso íntimo é a garantia de ter forças para enfrentar os desafios da vida. Em outras palavras, de Vinicius de Morais, a vida é para valer, não é de brincadeira.

Mas o Brasil é um país sempre pronto a nos surpreender. E nem sempre de modo positivo. Dois personagens, a Sra. Política e o Sr. Economia, nos perseguem há décadas. Trata-se de um casamento tumultuado. Acordo e harmonia não são o ponto forte. A Sra. Política tem tido um comportamento inadequado para manter a casa em ordem. Faz promessas maravilhosas que, de concreto, não passam de miragens. Lembra a avaliação que o humorista português Raul Solnado fez da Revolução dos Cravos em Portugal: “O florista mandou a conta”. O Sr. Economia, por sua vez, acaba tendo que meter a mão no bolso para pagar a conta. E quando se dava conta de que o bolso não era suficientemente fundo, apelava para sua velha parceira, Dona Inflação. 

Idas e vindas têm sido a tônica nesse casamento bagunçado. Na verdade, a Sra. Política parece ter mais culpa no cartório do que o Sr. Economia. A Sra. Política se revolta dizendo que as promessas do Sr. Economia são papo furado. Ele argumenta que os resultados não surgem da noite para o dia. Frutos virão com o tempo. Ela se impacienta e mete os pés pelas mãos. Num primeiro momento, tudo parece uma maravilha, como aconteceu no governo Lula. Logo depois veio a conta no governo Dilma, como na Revolução dos Cravos.

E foi aí que a população começou a entender que havia sido enganada. Pior: que muito dinheiro havia sido desviado para as contas particulares de quem se dizia defensor dos trabalhadores. (Pensou no PT? Acertou!) Mas tudo foi revelado quando entrou em cena outro ator, o Sr. Informação, via redes sociais. A despeito das Fake News, ele escancarou para o grande público informações nem sempre expostas, ou transmitidas, pela grande mídia. 

A revolta do eleitor veio à tona quando se deu conta de que pagava a conta astronômica da corrupção sistêmica e ainda daqueloutra com ares de legalidade (imoral). Foi para as urnas e acabou elegendo Bolsonaro presidente. Mas este, após muitos anos de convivência com a Sra. Política, por vezes tem atendido a suas ponderações sem se dar conta dos danos a longo prazo.

O Sr. Economia, ministro Paulo Guedes, faz o possível para manter o casamento em bases sólidas, tentando contornar os chiliques da Sra. Política. Alguns frutos já vêm sendo colhidos em 2009 como empregos em alta e avanços no PIB trimestral (IBGE). Mas a Sra. Política precisa fazer seu dever de casa: a reforma de um sistema político falido, que deixa o eleitor sem condições de controlar os políticos. A esperança ardente para 2020 e anos seguintes é que ele e o Moro sejam bem-sucedidos.  E que a reforma política não tarde.

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