A linguagem do afeto
Todos nós sabemos, mesmo intuitivamente, que a aprendizagem está diretamente relacionada ao afeto. Esse afeto é, na maioria das vezes, representado pela vontade de conhecer. Aprendemos bem tudo o que desejamos saber. Buscamos aprender aquilo que nos desperta curiosidade. Tal relação entre afeto e aprendizagem já está cientificamente comprovada. Nesses tempos de isolamento, tenho escutado mães, pais e adolescentes reclamando que não aguentam mais aulas online. Por que será?
Não tenho resposta exata, científica. Tecerei suposições, baseadas na minha experiência profissional. Nossas crianças e jovens usam o computador como forma de brincadeira, de passatempo, de entretenimento. Não percebem o ambiente virtual como local de aprendizado. Até mesmo os estudantes mais velhos ainda pensam assim. A partir do momento que esse lazer se transformou em obrigação, perdeu a graça e o gosto.
Tenho visto e ouvido mães desesperadas. Famílias desorientadas, principalmente as que possuem estudantes mais novos. Ouço pais (pai e mãe) que dizem: “Ele passava horas conectado, falando com amigos, jogando… agora não quer nem ligar o computador!” E completam: “Antes, eu brigava para ele sair da frente do computador, agora eu brigo para ele ligar a máquina e estudar!” Tudo o que é obrigação perde a graça, principalmente, quando se é jovem.
O que as Instituições de Ensino Básico (Fundamental e Médio) estão fazendo para motivar seus alunos, orientar os pais? Como estão envolvendo, mobilizando, engajando a comunidade escolar na adaptação a este novo processo de aprendizagem? Sim, adaptação! Qual suporte emocional está sendo oferecido? Que políticas de cuidado foram adotadas? Até onde sei, ouvindo de pais e professores, até mesmo de alunos, a ordem é bem simples: “Cumpra-se!”, ou então: “Isso vale nota”. Com prazos curtos para a entrega das tarefas postadas. Semanalmente, todas as disciplinas postam tarefas.
Já comentei sobre a formação dos professores, sobre a adequação da linguagem para o ambiente virtual e sobre o hipertexto… Fiz algumas ponderações. E repito que as TICs (Tecnologias da Informação e Comunicação) já deveriam fazer parte, como ferramentas facilitadoras e mediadoras de aprendizagem, do sistema educacional há muito tempo. a situação ficou especialmente grave agora, na pandemia. Trouxe à luz o atraso. Além disso, a falta de amparo e de políticas de cuidado com alunos e suas famílias não ocorre só no sistema público, mas no privado também e em grande parte. Isso é desastroso para o aluno, para a sociedade e para o país.
Dentro do sistema educacional, usando uma linguagem mercadológica, os alunos e respectivas famílias são os clientes; a aprendizagem é o produto; e, professores e funcionários, os colaboradores. Se as “empresas” não adotaram políticas de cuidados e de reforço dos vínculos afetivos com seus “consumidores” o que dirá com seus colaboradores!
O fato de o estudante não estar frequentando o espaço escolar, não significa que a responsabilidade pelo cuidado deva estar restrita à família. Se o aluno é obrigado a frequentar um ambiente virtual de aprendizagem, ele merece e tem direito a um suporte emocional. A acolhida tem papel fundamental na construção e preservação de vínculos afetivos, tão necessários ao processo de aprendizagem.
Há instituições de ensino que, preocupadas com o ranking nacional do ENEM, estão simplesmente “esticando a corda”. Não estabeleceram uma conexão afetiva e efetiva com seu estudante. Não ofertam nenhum cuidado com a saúde física e emocional deste jovem que, por inúmeros fatores externos e atuais, vivem em elevado nível de ansiedade.
Aprender precisa ter sabor, precisa dar prazer. A linguagem do afeto ensina mais do que mil palavras!