A menina que salvou os livros

12/06/2017 12:20

Uma imagem comovente circulou pelas redes sociais nas duas últimas semanas: a menina de 8 anos, Rivânia Rogéria dos Ramos Silva, salvou seus livros e o material escolar da enchente causada pelas chuvas que caíram no distrito de Várzea do Una na Zona Rural do Município de São José da Coroa, na Zona da Mata Sul de Pernambuco.   

Quando viu o nível da água subindo dentro de casa, a avó pediu para que ela pegasse o que havia de mais importante. A menina colocou os livros didáticos e o material escolar em uma mochila e saiu. Foi fotografada ajoelhada em cima de uma balsa abraçada com a mochila e com um par de sandálias nas mãos. Não havia roupa nem brinquedo, somente os livros na referida mochila. Ela cursa o 3º ano do Ensino Fundamental na Escola Municipal Várzea do Una. Tem três irmãs e um irmão. Mas somente ela mora com os avós.

Diante da repercussão desse acontecimento, até o distrito onde ela mora ganhou destaque na mídia. Várias emissoras de tv estiveram na localidade para entrevistá-la e destacaram a precariedade da região. As reportagens evidenciaram a simplicidade da moradia e as dificuldades financeiras da família. 

Se não fosse esse fato, o distrito seria apenas mais um a sofrer com as consequências causadas pelas chuvas que caem no território nacional em determinadas épocas: todos lamentariam o ocorrido, fariam campanhas para recolher donativos, seriam distribuídos entre as famílias atingidas como uma prática rotineira, porque isso se repete todos os anos nas diversas regiões do país. Os políticos apareceriam para fazer as promessas que nunca são cumpridas. 

A atitude da Rivânia mudou uma realidade. Além das lamentações sobre as mortes e perdas materiais, evidenciou-se o valor do livro para uma criança que sonha com dias melhores. Entre as diversas entrevistas que concedeu, ela disse a uma repórter: “o meu futuro está dentro destes livros…”

Depois de ver tantas vezes, pelos telejornais, a imagem de um ex-deputado correndo, puxando uma mala com quinhentos mil reais, saindo de uma pizzaria, comecei a pensar na lição de vida que a Rivânia deu para quem precisa entender a importância dos valores educacionais. Quando foi indagada sobre o seu futuro profissional, falou que gostaria de ser ou bailarina, ou professora, ou médica…

O sorriso espontâneo, a maturidade precoce de quem vive com dificuldades são evidentes no semblante dela. A esperança atrelada aos livros sempre aparece quando se sonha com a mudança de vida, quando se pretende alcançar condições dignas de sobrevivência. Isso geralmente traz consigo referências de honestidade. 

A dor quando passa pela resignação marca, mas não suplanta a ternura. Rivânia é mais uma “criança-Silva” que demostra já ter assimilado as limitações econômicas da família. 

Em outra entrevista, ela externou o desejo de ter um celular, como ferramenta de acesso ao mundo digital. Apesar de não possuir esse acesso, ela tem consciência da importância da interação via internet, que a fez ser conhecida até mesmo fora do país.

Não foi somente o gosto que tenho pelos livros que me levou a admirá-la, nem a possibilidade de tê-la como colega de profissão, mas também o reconhecimento da tenacidade que a vida severina nos aponta pela via educacional.

Aqui, publicamente, peço a Deus que a proteja. Que na mochila onde carregou os livros nunca entre dinheiro adquirido de forma ilícita. Está provado que a educação alimenta a esperança de ver um país melhor, sem ocultar a verdade.

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