A necessária regulamentação
O distrato na compra de imóveis, ao lado dos atrasos nas entregas de unidades na planta, é um dos principais problemas que afetam as relações entre consumidores e construtoras e incorporadoras no Brasil. Tramita no Congresso Nacional um projeto de lei que regulamenta a “desistência” do contrato de compra de imóvel. Uma série de propostas se arrastam nas duas casas legislativas, mas teve um passo importante recentemente. A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou emendas ao PLC 68/2018, que fixa direitos e deveres das partes nos casos de rescisão de contratos de aquisição de imóveis em regime de incorporação imobiliária ou loteamento. Agora, o tema será avaliado no Plenário do Senado.
Ainda que questionado por parte dos senadores, é inegável que se trata de importante avanço, na medida em que regra consequências para o adquirente e para o incorporador e, assim, traz mais segurança jurídica às suas relações e para a economia do país, tão sensível aos reflexos do cenário imobiliário. A esse respeito, aliás, além de certamente contribuir para a retomada do crescimento do mercado imobiliário brasileiro, a conversão do projeto em lei possivelmente resolverá milhões de processos judiciais que tratam do tema e aguardam decisão no Judiciário, em especial porque, se aprovado, o projeto irá ao encontro da jurisprudência que vem se formando em nossos tribunais.
De acordo com o texto aprovado no Senado, o atraso de até 180 dias para a entrega do imóvel não gerará ônus para a construtora. Se houver atraso maior na entrega das chaves, o comprador poderá desfazer o negócio e terá direito a receber tudo o que pagou de volta, além da multa prevista em contrato, em até 60 dias. Se não tiver multa prevista, o cliente terá direito a 1% do valor já desembolsado para cada mês de atraso.
Além disso, permite que as construtoras fiquem com até 50% dos valores pagos pelo consumidor em caso de desistência da compra, quando o empreendimento tiver seu patrimônio separado do da construtora (mecanismo chamado de patrimônio de afetação). Tal sistema foi criado após a falência da Encol, pois, com o patrimônio afetado, as parcelas pagas pelos compradores não se misturam ao patrimônio da incorporadora ou construtora e não poderá fazer parte da massa falida caso a empresa enfrente dificuldades financeiras. Para os demais casos, ou seja, fora do patrimônio de afetação, a multa prevista para o consumidor é de até 25%.
Além de regrar o limite da multa aplicável, o projeto aprovado também traz maior segurança jurídica ao prever que haverá o desconto da comissão de corretagem, dos impostos incidentes sobre o imóvel, de eventuais taxas de condomínio e de espécie de aluguel, conforme valor previsto em contrato, ou se não houver essa previsão, conforme valor fixado em juízo, caso a desistência ocorra após o adquirente entrar no imóvel.
A devolução do dinheiro para o adquirente será feita em parcela única até 30 dias após o habite-se do imóvel construído sob o regime de afetação (e não mais de forma imediata, como tem sido entendido pelos nossos tribunais) ou em até 180 dias após a assinatura do distrato, quando o imóvel não estiver submetido a tal regime.
O projeto reforça a necessidade imediata de um norte regulatório sobre a desistência da compra de imóveis no país. Os consumidores e as incorporadoras necessitam de uma maior segurança jurídica para realizar seus negócios e firmar os contratos.