A ponta do iceberg

20/out 08:00
Por Ataualpa A. P. Filho

– Eureka! Eureka! Eureka!…

Foi assim, eufórico, que Arquimedes saiu nu da banheira. Corria e gritava, pelas ruas da cidade, que havia descoberto um jeito de provar que a coroa do rei não tinha sido confeccionada com ouro maciço.

Reza a lenda que esse matemático grego, que vivia em Siracusa, Cidade-Estado da Grécia Antiga, antes de Cristo, não se deu conta que estava nu no meio do povo, pois vibrava euforicamente pelo fato de ter encontrado uma maneira de provar a qualidade do metal usado na coroa do rei.

O conhecido “Princípio de Arquimedes” é um dos fundamentos da Física, bastante usado na fabricação de navios, pois constata que todo corpo mergulhado num fluido recebe um impulso de baixo para cima igual ao peso do volume do fluido deslocado, por esse motivo, os corpos mais densos que a água afundam, enquanto os menos densos flutuam.”

Arquimedes se deu conta desse fato quando entrou em uma banheira completamente cheia d’água. Ao entrar, percebeu o volume do transbordamento. Repetiu a experiência e constatou que a quantidade de água que saía era proporcional ao volume do seu corpo. Com base nessa experiência, foi estabelecido o conceito de empuxo ou impulsão. Por meio desse princípio, descobriu a ilicitude do ourives que fez a coroa usada pelo rei: pegou uma barra de ouro maciço com massa igual à da coroa e outra barra de prata com massa idêntica. Colocou primeiro a barra de ouro em um recipiente com água e mediu o volume transbordado. Depois colocou a prata e viu que a quantidade de água expelida era diferente. Pegou a coroa e colocou no mesmo recipiente com o mesmo volume do líquido e constatou: a quantidade de água transbordante era maior do que a do bloco de ouro e menor do que a do bloco de prata. Conclusão: a coroa do rei não era de ouro maciço. Não foi confeccionada, conforme ele havia ordenado.

Moral da história: o rei tem que conhecer a idoneidade de quem a quem ele delega as suas ordens.

Hoje não é necessário ter a genialidade de um Arquimedes para identificar a impureza da coroa do rei. Basta olhar as ilicitudes que transbordam nos departamentos da gestão pública. Como exemplo, podemos citar o recente caso de seis pacientes infectados com HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana), após o recebimento de órgãos transplantados, que não foram rigorosamente examinados pelo laboratório conveniado com a Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro.

As pessoas que receberam os órgãos terão agora que conviver com esse vírus que é o causador da AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida). A fiscalização sanitária estadual, se não pecou por conivência, carrega o ônus da ineficiência. Os pacientes esperaram pelos órgãos com a expectativa de que teriam uma qualidade vida melhor. Mas foram surpreendidos com a notícia de que são portadores de um vírus que pode afetar severamente a saúde deles.

– E quem é que vai pagar por isso?…

Outro caso que podemos citar, como exemplo da impureza da coroa do rei, consiste na vulnerabilidade social que afeta a população. A fome, a miséria de um povo consistem em um problema que está vinculado às ações prioritárias de uma gestão governamental. Em São Paulo, há um “apagão” tão sério quanto esse que ocorreu recentemente pela falta de energia elétrica: a falta de acolhimento das pessoas em situação de rua. Esse problema se arrasta por longos anos…

Os casos mencionados são apenas a ponta de um iceberg. A parte que se encontra imersa no oceano de lamas é maior. Segundo alguns estudos, apenas 10% dos icebergs ficam expostos. A maior parte fica submersa.  

Vale ressaltar que um iceberg é um bloco de gelo de água doce que se desprende de geleiras. Como possui uma densidade menor do que a água oceânica, flutua. 

O aquecimento global tem contribuído para a aceleração do derretimento de iceberg, o que aumenta o volume de água incorporada aos oceanos. Isso interfere nas questões climáticas.

Desmatamento, queima de combustíveis fósseis são outras impurezas do reino do nosso país que afetam não somente o povo, mas também o planeta. O tributo que pagamos pelas omissões, pelas ações lesivas, tanto no plano social, quanto ambiental, é muito alto, uma vez que, a nossa sobrevivência fica comprometida.  O perigo não está exposto aos nossos olhos. Mas pela ponta desse iceberg, podemos deduzir a gravidade dele.

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