A venda de ilusões na pandemia

26/03/2021 21:24
Por Ataualpa Filho

“Mentir é feio.” Várias mães já pronunciaram essa frase para conduzir o filho no caminho da retidão, destacando a importância de ser fiel à verdade.

A mentira regada a cinismo traz consigo o sabor da traição. Isso se agrava quando ela é sustentada por argumentos que subestimam a nossa inteligência. Falácias inverossímeis evidenciam o desrespeito e a falta de compromisso com os princípios exigidos em uma conduta social digna. Quando tais falácias partem do poder público, a demagogia impera e perde-se, com isso, a confiança nos gestores que manipulam informações com o propósito de enganar o povo a quem deve satisfações, por determinação constitucional.Hoje as inverdades são globalizadas com o nome de “fakenews”. São usadas como instrumentos políticos.

“As Aventuras de Pinóquio”, obra do escritor Carlo Lorenzo Fillipo Giovanni Lorenzini, que assina com o pseudônimo de Carlo Collodi, publicada em 1883, é considerada um clássico da Literatura Infantil por permitir uma reflexão sobre as consequências de uma mentira: – imagine se, a cada inverdade proferida, o nariz do cidadão crescesse como o do Pinóquio, o boneco de madeira que queria ser gente? Embora o nariz não cresça, muitos agem com a conotação popular da expressão “cara-de-pau”.

Nessa clássica história de Pinóquio, é fácil constatar que o grilo falante age como a voz da consciência, a referência ética que sinaliza o caminho correto a ser seguido, questionando interiormente, indicando as atitudes que devem ser tomadas a favor do bem e da verdade. Todos sabem que a pior mentira é aquela que a pessoa cria para enganar-se. 

Há um dano social quando alguém procura tirar proveito das inverdades, trapaceando, manipulando conceitos, apresentando-se como paladino da moral.

Na adolescência, já sem acreditar em fadas, ouvia dizer que as manchas brancas que aparecem nas unhas, as leuconiquias, eram consequências das mentiras inventadas. Quando algum amigo contava uma história que me deixava na dúvida, pedia para mostrar as unhas. Se estivessem com manchas, deduzia que se tratava de mais uma mentira. Claro que isso fazia parte da crendice do povo e a criançada sempre embarca nesse imaginário popular.  Mas, se isso fosse verdade, como estariam as unhas de alguns gestores públicos? Contudo, seria mais interessante o castigo da Fada Azul: fazer o nariz crescer. Muitos poderiam até fumar seus charutos em dia de chuva que o nariz protegeria.

É válido ressaltar que as mentiras de Pinóquio não foram influenciadas pelo marceneiro Gepeto que o fez. A retidão deste é que sensibilizou a fada que lhe deu um filho para colocar um fim na solidão.

“Deixe de pinoquice, o seu nariz vai crescer!” Essa era a frase bastante usada por uma professora que tive na escola primária em Teresina. Hoje, o que chamam de “pós-verdade”, vejo como pinoquice. Há a exploração da boa fé do povo, manipulando-a com sofismas que induzem a erros graves. E, neste período pandêmico, muitos aproveitam a desinformação das pessoas para vender remédios ou induzir a tratamentos ineficazes, sem nenhuma comprovação científica.

Já está provadoque o chamado “kit covid” é capaz de provocar danos irreversíveis. O dito tratamento precoce tem levado à hepatite medicamentosa. Há casos até da necessidade de transplante de fígado. Não se pode tomar remédios assimaleatoriamente, sem orientação médica. A Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou para os efeitos adversos. Como se não bastasse o caos no sistema de saúde por causa da Covid-19, agora estão surgindo os casos de internação, tendo como motivo o uso indevido de remédios que são apresentados comopreventivos no combate ao novo coronavírus.

Inquestionavelmente a melhor forma de evitar o contágio consiste no uso de máscaras, na higienização, no distanciamento social e na hidratação, o ato de beber água com frequência.  Não podemos nos deixar levar por especulações sem orientações da Ciência.

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