20/03/2022 08:00
Por Mons. José Maria Pereira

O chamamento à conversão constitui o tema central do terceiro domingo da Quaresma.

O Profeta Ezequiel diz: “Convertei-vos, senão vós morrereis” (Ez 33,11). Deste modo uma questão se impõe: Que significa converter-se? Trata-se, antes de tudo, da conformidade das ações com a vontade divina, à qual cumpre uma adesão total. É a obediência da fé.

O Papa Bento XVI assim se expressou: “converter-se significa não viver como todo mundo vive, não fazer o que todo mundo faz, não se sentir justificado fazendo ações duvidosas, ambíguas ou más pelo fato de que outros assim procedem; começar a olhar a própria vida com os olhos de Deus, portanto, procurar o bem, mesmo se isto contesta a sociedade. Não se submeter ao julgamento dos homens, mas, sim, à avaliação de Deus, ou em outras palavras: procurar um novo estilo de vida, uma vida nova”. Não se trata assim de um falso moralismo, mas de não se perder de vista a essência da mensagem de Cristo, mantendo firmemente o dom da nova amizade, o dom da comunhão com Jesus.

No Evangelho (Lc 13, 1-9) é forte o apelo à conversão: o texto fala de dois acontecimentos trágicos daqueles dias: a matança de Pilatos… e a queda da torre de Siloé: 18 mortos.

Jesus não concorda que a desgraça é sinal do castigo de Deus, pelo contrário, é um apelo de conversão aos sobreviventes: “Vocês pensam que eles eram mais pecadores do que vocês? Se vocês não se converterem, morrerão todos do mesmo modo…” (Lc 13, 2-3). Palavras severas que nos fazem compreender que, com Deus, não se pode brincar; e, no entanto, palavras que procedem do amor de Deus que, por todos os meios, quer a salvação de todas as suas criaturas.

Conversão não é apenas uma penitência externa, ou um simples arrependimento dos pecados; é um convite à mudança de vida, de mentalidade, de atitudes, de forma que Deus e os seus valores passem a estar em primeiro lugar. Significa abraçar a Cruz!

Já ensinava o Mestre: “Se alguém quiser vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua Cruz e siga-me” (Mt 16,24). Não existe verdadeira conversão, nem autêntico seguimento do Senhor sem a Cruz. As palavras de Jesus Cristo têm plena vigência em todos os tempos, uma vez que foram dirigidas a todos os homens, pois quem não carrega a sua Cruz e me segue – diz – nos Ele a cada um – não pode ser meu discípulo.

Carregar a Cruz – aceitar a dor e as contrariedades que Deus permite para nossa purificação, cumprir com esforço os deveres próprios, assumir voluntariamente a mortificação cristã – é condição indispensável para seguir o Mestre.

“Que seria de um Evangelho, de um cristianismo sem Cruz, sem dor, sem o sacrifício da dor?, perguntava-se o Papa Paulo VI. Seria um Evangelho, um cristianismo sem Redenção, sem salvação, da qual – devemos reconhecê-lo com plena sinceridade temos necessidade absoluta. O Senhor salvou-nos por meio da Cruz; com a sua morte, devolveu-nos a esperança, o direito à vida…” Seria um cristianismo desvirtuado que não serviria para alcançar o Céu, pois “o mundo não pode salvar-se senão por meio da Cruz de Cristo” (São Leão Magno).

São Paulo escrevia que a Cruz é escândalo para os judeus, loucura para os gentios. E mesmo os cristãos, na medida em que perdem o sentido sobrenatural das suas vidas, não conseguem entender que só possamos seguir o Senhor através de uma vida de sacrifício, junto da Cruz.

O Cristão que vive fugindo sistematicamente do sacrifício, que se revolta com a dor, afasta-se também da santidade e da felicidade, que se encontra muito perto da Cruz, muito perto de Cristo Redentor. “Se não te mortificas, nunca serás alma de oração” (Caminho, 172). E Santa Teresa ensina: “Pensar que (o Senhor) admite na sua amizade gente regalada e sem trabalhos é disparate”.

Devemos perder o medo ao sacrifício, à mortificação voluntária, pois quem quer a Cruz para cada um de nós é um Pai que nos ama e que sabe o que mais nos convém.

O Senhor quer sempre o melhor para nós: “Vinde a mim todos os que estais fatigados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei…” (Mt 11,28). Ao lado de Cristo, as tribulações e penas não oprimem, não pesam, e, pelo contrário, levam a alma a orar, a ver a Deus nos acontecimentos da vida.

Rumo à Páscoa, o Senhor nos conceda a graça de uma verdadeira conversão!

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