Ação do crime na fronteira complica plano de Petro para a Venezuela
O controle imposto pelo crime organizado na fronteira entre Colômbia e Venezuela e a atuação de grupos armados na imigração ilegal e no narcotráfico representam um desafio para a normalização das relações entre os dois países, que começou a ser retomada após a eleição de Gustavo Petro.
A iniciativa do presidente Petro, dizem analistas, esbarra na atuação de grupos como o ELN (Exército da Libertação Nacional), guerrilha que ainda não depôs as armas, e o Trem de Aragua – grupo criminoso criado na Venezuela que se expandiu para outros países sul-americanos.
O fechamento das passagens entre os dois países em agosto de 2015 causou forte impacto para as economias fronteiriças, dando força a grupos criminosos. As passagens ilegais, controladas por essas quadrilhas, passaram a ser mais usadas, e a presença criminosa se alastrou para outros países da região.
O grande fluxo de venezuelanos fugindo da crise econômica do país também contribuiu para o aumento da criminalidade, ao facilitar o recrutamento dessa população empobrecida por grupos criminosos na fronteira. Por isso, é provável que a Colômbia tenha cuidado na retomada das relações, apesar da proximidade ideológica entre os presidentes Gustavo Petro e Nicolás Maduro.
“Para a Colômbia o problema venezuelano é complicado, não apenas pela questão da criminalidade, mas também pelo fluxo migratório. Imagino que o governo de Petro será cauteloso na maneira como a fronteira será aberta”, explica o professor da Universidade Simón Bolívar Erik del Bufalo.”Acordos bilaterais já foram citados, mas ainda estão longe de ser realidade.”
A falta de uma política de controle fronteiriço e os atritos políticos entre Iván Duque e Nicolás Maduro levaram o ELN, segundo analistas políticos, a ser classificada como uma guerrilha binacional.
Um relatório da organização Human Rights Watch, publicado em março deste ano, mostra que a guerrilha recebeu ajuda e realizou operações conjuntas com forças militares venezuelanas contra dissidências das Farc. O comandante da guerrilha Pablo Beltrán nega que o grupo seja binacional. “Temos uma presença muito ampla nos 2.200 km de fronteira e as comunidades que vivem ali são binacionais. Mas o ELN é uma organização colombiana”, diz.
Trem de Aragua
A criminalidade na fronteira aumentou também em virtude da ação de grupos criminosos egressos do território venezuelano. O principal deles é o Trem de Aragua. Criado no interior da Venezuela, o grupo se expandiu rapidamente entre 2020 e 2021, marcando presença nas fronteiras com a Colômbia e com o Brasil.
A quadrilha é responsável pelo tráfico de migrantes venezuelanos até o Chile. De acordo com o InSight Crime – grupo que monitora o crime organizado na América Latina -, esse foi o primeiro grupo criminoso venezuelano a se expandir para outros países.
O modus operandi do Trem de Aragua consiste em abordar migrantes venezuelanos sem documentação na Venezuela, Colômbia ou nas passagens fronteiriças que ligam os dois países e obrigá-los a levar drogas até o país de destino.
De acordo com a Promotoria da Colômbia, o Trem de Aragua realiza a passagem com o auxílio do grupo criminoso colombiano Los Rastrojos, presente no Departamento (Estado) Norte de Santander.
Para além da Colômbia, o Trem de Aragua tem criado ramificações em outros países na América do Sul, principalmente no Peru – ponto de passagem para o Chile, destino final da viagem. Ali, o número de venezuelanos sem documentação que entraram no país passou de 2.905 em 2017 para 56.586 em 2021, segundo um relatório feito pelo Serviço Jesuíta a Migrantes.
Segundo uma investigação do InSight Crime, o grupo consolidou sua presença na cidade chilena de Tarapacá e é responsável pelo tráfico de drogas, armas e contrabando até o país. A crise migratória no norte chileno, segundo analistas, é um dos motivos que impulsionou a queda de popularidade do presidente Gabriel Boric, eleito em março.
O sucesso nas negociações para a normalização das relações entre Colômbia e Venezuela é vital para a queda da criminalidade na região. A analista política Silvia Otero ressalta que a forma como a nova cúpula militar colombiana vai atuar será fator importante.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.