Amazônia já possui regiões que emitem mais gás carbônico do que absorvem

15/07/2021 11:37
Por Redação, O Estado de S.Paulo; colaborou Ítalo Cosme / Estadão

Algumas áreas da Floresta Amazônica já passaram a emitir mais dióxido de carbono do que absorvem. É o que mostra um estudo publicado nesta terça-feira (13), na revista científica Nature. Fatores como o desmatamento causado pelo homem e os efeitos das mudanças climáticas parecem ter influenciado a capacidade do bioma de atuar como um “filtro” de um dos principais gases responsáveis pelo efeito estufa.

O estudo levou em consideração centenas de amostras de ar coletadas na parte mais baixa da atmosfera terrestre, entre 2010 e 2018, e constatou que a parte sudeste da Amazônia se tornou uma grande fonte de emissão de CO2. Durante os últimos 50 anos, as plantas e o solo absorveram mais de 25% das emissões de gás carbônico. Já as emissões aumentaram em até 50%, segundo mostrou a pesquisa publicada ontem.

A pesquisa foi liderada por Luciana Gatti, do Instituto Nacional de Investigação Espacial (Inpe), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia. O estudo também descobriu que as emissões de carbono são maiores na parte oriental da Amazônia do que na ocidental, sobretudo por causa de incêndios.

Nos últimos 40 anos, o leste da floresta sofreu mais desmatamento, aquecimento e estresse hídrico do que a parte oeste, especialmente durante as temporadas de seca. Essa tendência foi observada de forma ainda mais forte na porção sudeste da floresta, segundo a pesquisa.

Mais recentemente, o bioma vem sofrendo aumento dos impactos humanos, com a redução das fiscalizações sobre crimes ambientais que ocorrem na Amazônia. Desde 2019, a gestão Jair Bolsonaro tem sido alvo de críticas no Brasil e no exterior diante da explosão de queimadas e do desmatamento na região. Para combater crimes ambientais, o governo tem apostado em operações militares, mas os registros de perda vegetal continuam altos.

No mês passado, por exemplo, os alertas de desmatamento na Amazônia bateram novo recorde para o período. Dados do sistema Deter, do Inpe, mostram que a área sob alerta de desmatamento foi de 1.062 km², a maior para o mês de junho desde o ano de 2016. Os últimos quatro meses foram de alta recorde nos alertas de desmate do bioma.

A pesquisa publicada confirma achados anteriores sobre a degradação do bioma. Nos últimos anos, um número crescente de estudos sugeriu que a capacidade da Floresta Amazônica de remover carbono do ar e armazená-lo de forma que não contribua para o aumento das temperaturas globais estava sendo degradada.

Em 2018, um artigo publicado na revista Science Advances alertou que a combinação de desmatamento, mudança climática e queimadas fizeram com que partes da floresta tropical mudassem para savana. “O ponto de inflexão é aqui, é agora”, escreveram os autores, o climatologista Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP) e o biólogo americano Thomas E. Lovejoy.

De acordo com os autores da nova pesquisa, os resultados encontrados agora podem ajudar a contextualizar melhor os impactos de interações entre o clima e as populações humanas a longo prazo, assim como o balanço de carbono na maior floresta tropical do mundo.

Desde 1970, as florestas tropicais da região foram reduzidas em 17%, sobretudo para dar lugar a pastagens para a pecuária. Elas geralmente são incendiadas, o que libera grandes quantidades de CO2 e reduz o número de árvores disponíveis para absorvê-lo.

A própria mudança climática também é um fator chave. As temperaturas da estação seca aumentaram em quase 3ºC em comparação com os níveis pré-industriais, o triplo da média global ao longo do ano.

Ao revelar uma associação entre o desmatamento e as mudanças climáticas em toda a Amazônia, o estudo sugere também que essas interações humanas podem ter consequências duradouras e negativas tanto para o déficit de carbono da região como para a fragilidade de seus ecossistemas.

Espécies

Outro estudo divulgado nesta terça mostrou mais uma faceta da destruição da Amazônia: mais de 10 mil espécies de plantas e animais correm o risco de extinção por causa da devastação da floresta. Produzido pelo Painel Científico para a Amazônia, o relatório de 33 capítulos reúne pesquisas sobre a maior floresta tropical do mundo de 200 cientistas. É a avaliação mais detalhada do estado da floresta e deixa claro o papel vital da Amazônia ao clima.

Segundo o relatório, a contínua destruição causada pela interferência humana na Amazônia coloca mais de 8 mil plantas endêmicas e 2,3 mil animais em alto risco de extinção. Reduzir o desmatamento e a degradação da floresta a zero em menos de uma década é crucial, aponta o relatório, que também pede por um grande reflorestamento em áreas já destruídas.

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