Angélica fala de empatia e de sua volta à TV em ‘simples assim

28/09/2020 12:00

Antes mesmo de a pandemia começar, a apresentadora Angélica já vivia uma quarentena antecipada, como ela próprio diz. É que, após o fim do programa Estrelas, na Globo, em 2018, com o qual ficou 12 anos no ar, Angélica se viu numa situação completamente nova: ficou longe da TV por dois anos. “Comecei a trabalhar com 4 anos de idade, não lembro de outro período em que tive esse tempo”, conta a apresentadora, de 46 anos, em entrevista ao Estadão, por Zoom, de sua casa, no Rio. Durante essa pausa, ela passou mais tempo em casa, com o marido, o apresentador Luciano Huck, e os três filhos. A rotina desacelerada se prolongou com a quarentena imposta pelo novo coronavírus. “Antes, a gente só ficava junto, todo mundo, em julho e janeiro. Agora é almoço e jantar junto.”

Esse período a fez refletir também sobre o que queria na carreira. Com a encomenda de uma nova atração, Angélica, que já tinha feito programa de entrevistas, comandado games, interpretado personagens na TV e no cinema, entre outras frentes, buscava um formato diferente. O que seria seu novo programa na Globo ganhou corpo, agregando, de certa forma, habilidades que a apresentadora desenvolveu ao longo de sua trajetória. Unindo jogos, entrevistas e esquetes de humor, Simples Assim estreia no dia 10 de outubro, e vai ao ar aos sábados, antes do Caldeirão do Huck, apresentado pelo marido. A atração terá convidados anônimos e famosos, como Paulo Gustavo, Marcos Caruso, entre outros.

Com direção-geral de Geninho Simonetti, o programa estava previsto para ir ao ar a partir de abril, mas, por causa da pandemia, tudo foi interrompido e a estreia, adiada. Na semana passada, as gravações foram retomadas, seguindo protocolos de segurança.

Como está o ritmo de gravação do programa neste momento?

Gravamos antes da pandemia. Tínhamos gravado dois programas. É uma temporada que vai até dezembro, e claro que a gente teve de adaptar o programa. Coisas que fizemos antes da pandemia não vamos poder fazer agora, como algumas matérias que eu fiz na rua. Agora o programa é todo em estúdio, essa foi a grande adaptação. Ele já não tinha plateia. É um programa que fala do comportamento humano, é mais um olhar para dentro. Então, ele comporta estar dentro do estúdio. Continua com os convidados, todo mundo testado, menos gente comigo ali. Os convidados, a gente divide entre palco e telão, porque não pode ter muita gente. Há dois meses, a gente começou a readaptá-lo e, na semana passada, a gente começou a gravar mesmo.

E vocês fazem testagem, que está dentro dos protocolos…

Testo toda semana, os convidados testam. E se um convidado anônimo testa positivo na semana – porque a gente tem que testar um dia antes -, cai aquele convidado.

Aconteceu isso?

Aconteceu com dois, e aí a gente tem que ter stand-by. A história que a gente queria era aquela outra, mas tem que adaptar.

Como é a dinâmica do programa? Você volta a interpretar depois de muito tempo e você já disse que gosta de fazer isso

É, gosto de brincar de atuar, sei que tenho jeito, então me sinto segura fazendo. Faço isso há bastante tempo também. Comecei, na verdade, pequenininha atuando, fazia comercial, novela, seriado. O programa vai trabalhar com temas: fé, vaidade, amor, dinheiro, família, felicidade. Não é baseado na minha vida, é baseado em pesquisa, no que as pessoas mais buscam hoje. Essa busca pela felicidade passa por onde? A gente abre o programa mostrando o tema, aí temos dois quadros. As esquetes intercalam esses quadros, são muito curtas. Na sequência das esquetes, tem microentrevista com o convidado famoso dando opinião naquele tema. É rápida essa entrevista, não é um programa de entrevistas, e ela segue no podcast. O final é um experimento social que aprofunda mais no que a gente brincou e conversou durante o programa, que é a nossa reflexão final. É uma delícia divertir, fazer rir, mas falei: quero alguma coisa a mais, quero provocar uma reflexão nas pessoas, quero fazer companhia mesmo na situação em que elas vivem, me colocando também numa situação de aprendiz, partilhando a minha história em algum momento. Não é falando da minha vida, mas, sim, dividindo com eles alguns momentos da minha vida. No fundo, as questões de família, a busca da felicidade que a gente tanto fala são muito parecidas. Os dilemas são bem parecidos.

Após Estrelas, ficou um longo período afastada da TV. Isso nunca tinha acontecido, não?

Foi muito doido. Da porta para dentro, que era o que eu estava vivendo, foi a época mais rica, pessoalmente falando, da minha vida. Comecei a trabalhar com 4 anos de idade, não lembro de outro período em que tive esse tempo. Então, vivi uma fase muito rica, muito diferente. Não só de ter tempo, mas de ter tempo para me olhar, entender o que eu gostava. Um exemplo bobo: emenda um trabalho no outro, sempre há um figurinista, um produtor de moda, e, aí, de repente, nesses dois anos, não tinha, eu podia dizer o que eu queria vestir, o que eu gostava. Esses dois anos foram um presente da vida para mim. Foi fundamental para meu crescimento, para minha sanidade mental, para minha família, porque, por mais que eu fosse uma mãe presente, e sempre fui, o dia a dia simples, da mãe que vai buscar na escola, volta, vai fazer o dever de casa, assiste à Sessão da Tarde com a criança, isso era bem difícil. E para o meu casamento também, porque era um em cada lado. Agora pude me dedicar um pouco mais a isso também. Da porta para dentro, estava tão quentinho, tão acolhedor, eu estava vivendo coisas que nunca imaginei e as pessoas especulando, falando coisas. É a imagem que as pessoas criam, que idealizam de você e que, às vezes, é muito longe da realidade.

Depois da entrevista que você deu para o Fantástico sobre o programa, houve críticas, porque você falou em encontrar felicidade nas pequenas coisas neste momento em que há muita gente passando por dificuldades financeiras e não pode pensar nisso. O que você acha dessas críticas?

Acho que no lugar em que estou, que é um lugar de privilégio, sim… Não importa se eu trabalhei muito, se eu abri mão de coisas, estou num lugar privilegiado. No Brasil, então, que é esse país totalmente desigual. Eu sou branca, ganho bem, tenho uma família saudável, que pode ter um homeschooling, coisa que muita criança não tem. É óbvio que a gente não é cego e não é leviano de ficar achando que está vivendo no mundo da fantasia. Ninguém vive aqui no mundo da fantasia. Mas acredito que, no lugar em que estou, com meus privilégios, posso olhar em volta. A gente pode tentar enxergar o outro através das minhas atitudes no dia a dia – e, por que não, através do programa? A gente aprende um com o outro, eu aprendo muito. Na verdade, não estou ali ditando regras: ‘faz assim que vai te fazer feliz’. Não, estou lá aprendendo também, dividindo. O programa não é em cima da minha vida. Acho que através do programa a gente pode tentar ajudar as pessoas também a fazer isso: a olhar para o lado e enxergar o outro. Acho que esse tipo de julgamento ou esse tipo de comentário é justamente o que o programa não quer na vida das pessoas. Essa cultura do ódio que foi criada não precisa existir, você não precisa olhar o outro com julgamento. Quando eu vi, falei: caramba, a gente está com um programa muito atual mesmo, porque esse tipo de comentário é justamente o que a gente não precisa hoje, com esse monte de problema que a gente está vivendo, com essa desigualdade bizarra, com as pessoas num sofrimento sem fim, com medo. Então, é isso. Essa comparação não existe.

Um dos momentos difíceis da sua vida foi o acidente de avião que vocês sofreram, em 2015. Que medos aquele episódio quase trágico desencadeou? Esses anos de pausa ajudaram nesse processo de alguma forma?

Acho que sim. Na verdade, o acidente foi um divisor de águas. Me colocou muitos questionamentos: Minha vida é isso? Para que mais estou aqui? Uma sensação de gratidão extrema, mas o que mais existe? A gente viveu uma coisa muito forte junto, de uma conexão com uma espiritualidade – não é de religião que estou falando. A gente viveu um momento em que a gente silenciou muito forte, a família toda, a gente sentiu coisas parecidas, e um ano depois comecei a desenvolver uma pequena Síndrome do Pânico. Digo pequena, porque eu resolvi logo, mas desenvolvi, sim, umas crises. Cada um aqui em casa resolveu de um jeito, as crianças do jeito delas, fizeram análise, o Luciano do jeito dele. Faço análise há 20 anos. Eu não queria tomar remédio, aí fui procurar o ioga, que eu já tinha feito um tempo atrás, a meditação transcendental, e ela me tirou do estado de pânico mesmo. Essas foram as ferramentas que usei na época para isso, mas, dali para frente, acho que as outras ferramentas foram minha postura diante da vida. Vieram as reflexões todas que culminaram nesses dois anos em que tive tempo para entender a quantidade de questões que estavam guardadas ali e eu não conseguia responder.

Fala-se de uma possível candidatura do Luciano Huck a presidência. Como é a ideia de, quem sabe, ser primeira-dama?

Realmente, acho que a gente pode fazer pelo outro, eu acredito nisso. Acho que uma forma maior disso, que é você ser um presidente da República, ter um cargo público, também é incrível, é um altruísmo gigantesco, porque você abre mão de muita coisa. No caso do Luciano, ele não precisa disso a não ser por uma questão de querer ver as coisas melhores no País. Não precisa trabalhar o ego dele, ele é uma pessoa pública bem-sucedida. Isso é meio destino, se tiver que acontecer, não vou impedir, não vou ser essa pessoa. Se eu tiver que estar do lado dele nessa situação, vou estar também. E feliz, e fazendo o que puder, como cidadã e como uma pessoa que quer ver um mundo melhor para os próprios filhos. (Nessa hora, Luciano entra no escritório). O presidente chegou (risos).

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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