Apesar de elegante, manter imóvel tombado é um desafio para proprietários

25/02/2019 14:30

A beleza arquitetônica de centenas de residências em Petrópolis ainda arranca suspiros, seja de moradores e turistas que se encantam com a estrutura de moradias, algumas delas, inclusive, remontam o povoamento do município. Afinal, quem não gostaria de residir em um espaço onde alguma celebridade do passado já esteve? Encantos à parte, a tarefa de manter um imóvel tombado pelo patrimônio histórico é um desafio para aqueles que adquiriram o bem.

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Um conjunto de rígidas leis norteia aquilo que se pode apontar como um imóvel tombado. Duas entidades, o Iphan e o Inepac, de cunho federal e estadual, respectivamente, elaboraram uma série de regras para que o local seja considerado um espaço histórico. O objetivo é evitar que locais onde parte da história foi construída seja demolido. Como diria um velho ditado, um povo que não conhece a sua história não saberá escrevê-la no futuro. Sendo assim, com o apoio dos municípios, o país pôde, finalmente, criar uma linha que separa o passado e o presente através de uma ação conservacionista.

Para corroborar essa linha de trabalho do Iphan e Inepac, a parte arquitetônica ganha uma importância central, já que legalmente um imóvel tombado não pode modificar a sua faixada. A arquiteta Cris Moura afirma que o proprietário que adquire uma casa com este estilo precisa saber que haverá onerações em decorrência de como ela foi erguida. Ela ressaltou que, no caso de Petrópolis especificamente, foram construídas residências de acordo com o estilo da época, sendo, portanto, fundamental preservar a estética original.

“Os conceitos arquitetônicos não podem ser modificados, se tratando de casas tombadas. Por isso, quem compra um patrimônio como este, deve ter em mente que haverá gastos para mantê-lo como fora erguido. Entre os custos, está a revisão da estrutura do imóvel para saber se está seguro, como por exemplo a parte elétrica. A preservação estética precisa ser mantida”, explicou Cris, que é especialista também em urbanismo. Para ela, o proprietário terá que combinar a sua satisfação em morar em um local histórico com o ônus que ela produz. 

Em tempos de crise, falar em custos é algo que incomoda muito as pessoas. Exatamente por isso, há quem encare essa missão com gosto. É o caso da carioca radicada em Petrópolis, Myrian Born, que na juventude se encantou tanto com Petrópolis que adquiriu uma residência tombada na Rua Piabanha. Embora o local seja funcional, como fora construída na década de 40, a residência tem custos elevados para ser mantida. Lá, é quase que um museu a céu aberto. A cozinha, por exemplo, tem um piso com ladrilhos ingleses e adornos da janela que remontam uma época cujo estilo arquitetônico não se vê mais por aí.

De acordo com Myrian, a casa tem uma memória cultural que ela defende a unhas e dentes. Crítica feroz de espaços tombados em comerciais, a aposentada lembrou que há um preço a se pagar para manter viva uma residência que conta um pouco da história do município. “Uma casa tombada, por mais que a pessoa seja dona, pertence a toda sociedade petropolitana porque ela fala da história do crescimento da cidade. Não se pode abrir mão disso, porque senão corremos sérios riscos de perdemos a nossa identidade”, disse a moradora, que reconhece as despesas altas para deixar o imóvel do jeito que ele era nos tempos de sua construção. “Existe um preço a se pagar por isso. Tem pontos da casa que, dependendo do conserto, nem há profissionais para isso”, emendou ela.

Os valores da conservação, por outro lado, não tiram a satisfação em manter uma das casas que, outrora, chegaram a ser badaladas no início do século passado. Uma das mais importantes clínicas de ortopedia fica justamente na icônica casa erguida pela milionária família carioca Guinle, em 1895. Quem já morou lá também foi o segundo prefeito da cidade, Oscar Weinchenk. Em 1998, o médico Pedro Labronice, comprou o imóvel com a promessa de manter intacto os detalhes arquitetônicos da época. 

A Traumacenter, uma clínica que é ao mesmo tempo o exemplo de uma residência de família com alto padrão financeiro, se transformou em um objeto de admiração dos turistas. O sócio de Pedro, o ortopedista Arnaldo Rippel, contou que o local foi restaurado com profissionais especializados no serviço, um custo ou investimento (dependendo do ponto de vista) na manutenção que não passa batido. Rippel, que tem uma visão preservacionista da arquitetura municipal, deu como exemplo o arabesco existente na recepção. O detalhe, em dourado, só pode ser mexido ou pintado por um restaurador especialista.

“Fizemos tudo de acordo com as regras estabelecidas pelo Iphan. São detalhes que nos exigiram e que mantemos até hoje. É caro manter uma casa como aquela, principalmente porque é grande e repleto de questões que até nos surpreendeu antes da inauguração. Achamos, numa parte debaixo da casa, uma banheira enorme. Hoje, funciona, neste espaço, o setor da fisioterapia”, afirmou o médico, que neste ano comemorará os 20 anos da clínica.

Considerado um dos mais importantes historiadores da cidade, Joaquim Eloy dos Santos, sabe como poucos o valor de um imóvel tombado e, como tanto, resolveu adquirir um em 1993, justamente o que ficava quase que ao lado da antiga Fábrica Cometa, no bairro Morin. No entanto, achando que era um bem histórico fácil de ser administrado, lhe deu muitas dores de cabeça. Ele recordou que chegou a ser advertido pelo Iphan sobre pequenas mudanças feitas no local, sendo que os problemas não foram o bastante para desistir do negócio. Fez as modificações e hoje um neto dele mora lá, sem problemas. “É uma casa pequena, histórica e que gostei muito de ter adquirido na década de 90. Mas tive dores de cabeça com ela, não apenas por conta de obras como as pessoas que lá moraram. Gastei um bom dinheiro e ela está até hoje, cumprido com todos os requisitos exigidos em lei”, sentenciou Eloy.     


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