‘As Meninas Velhas’ traz Lucinha Lins no elenco e trata etarismo com humor

09/04/2022 11:30
Por Danilo Casaletti, especial para o Estadão / Estadão

“Eu trepei em árvores até cinco ou seis anos atrás. Hoje, olho para ela e penso: acho que não vou.” É com essa leveza que a atriz e cantora Lucinha Lins, de 69 anos, encara o passar do tempo. Esse comportamento guarda certa semelhança com as personagens de As Meninas Velhas, peça estrelada por ela e em cartaz no Teatro Vivo.

Escrito pelo ator, dramaturgo e bailarino Claudio Tovar, marido de Lucinha, o espetáculo conta a história de uma grande e longa amizade entre quatro mulheres que, companheiras, envelhecem juntas – sem qualquer amargor ou medo do calendário.

“São mulheres louquíssimas, muito engraçadas. Elas começam o espetáculo na faixa dos 60 anos. Entre uma cena e outra, elas envelhecem, mas sem perder o lado menina. Por isso, o título As Meninas Velhas”, explica Lucinha. Ao lado dela, no elenco, estão as atrizes Barbara Bruno, Sônia de Paula e Nadia Nardini.

A personagem de Lucinha na peça é Zuleika, uma atriz medíocre que, apesar de ter feito diversos cursos, não evoluiu na carreira. Ela interpreta o tempo todo. Fala alto, tem momentos de puro drama e se veste como sempre estivesse em cena. “Ela se acha uma atriz espetacular”, diverte-se Lucinha.

Zuleika, claro, é acolhida pelas amigas. Afinal, amizade é isso. Todas, cada uma com sua personalidade, acabam embarcando no universo dela. A relação entre as amigas, além das visitas que fazem umas às outras, se dá em uma praça, onde se encontram. Ali, aos olhos do público, elas envelhecem.

Para além do lado cômico proposto pelo texto, a peça levanta reflexões importantes, sobretudo em uma sociedade em que o etarismo, infelizmente, é uma realidade. Às quatro amigas é permitido se apaixonar e sentir tesão – seja por alguém ou pela vida. O importante para elas é o hoje. A frase “você não tem mais idade para isso” não faz sentido para elas.

Neto

“Ser avô hoje em dia é isso. É ir à praia surfar com o neto, andar de bicicleta. Não é mais como no tempo dos meus avôs, que eles se aposentavam e acabou. Eles participam da vida dos jovens, sorriem”, conta a atriz, que é avó de três meninos de 13, 10 e 9 anos. Para eles, Lucinha é a vovó Lulu.

Na vida pessoal, Lucinha lembra que não teve crises com o avanço da idade. “Não deu tempo”, resume. Ela pontua a fase da menopausa, que ela chama de “bomba”. Mas só. Diz que envelhecer faz parte da vida.

Ela também não se queixa de falta de oportunidades profissionais. “Claro, não posso mais fazer a Mocinha de Roque Santeiro (um de seus grandes personagens na TV). Posso fazer a mãe, a avó. Tenho outros a descobrir. Essa é a magia da minha profissão”, afirma.

Na sala de casa

As Meninas Velhas estreou no Rio de Janeiro em setembro de 2021. O texto escrito por Tovar estava pronto há algum tempo. Em uma dessas “arrumações” nos arquivos do computador, Claudio Lins, filho de Lucinha, que assina a trilha sonora da peça, achou o original que o autor havia lhe enviado. Ele releu e sugeriu que Tovar e a mãe fizessem o mesmo.

A peça, então, foi enviada ao diretor Tadeu Aguiar que se encantou com o texto e pediu para dirigir a montagem. Os ensaios foram feitos na casa de Lucinha, ainda durante a pandemia, entre máscaras e álcool em gel. Tovar fez cenários e figurinos.

Aguiar, que tem no currículo a direção de peças e musicais como Love Story, A Cor Púrpura e Bibi, Uma Vida em Musical, quis que as quatro atrizes fizessem a leitura de forma variada. Não havia definido quem faria qual personagem. Zuleika foi a última que Lucinha leu, pegando-a de surpresa.

“Foi o alimento de nossa alma, trouxe um conforto em nosso coração em meio ao desespero e a saudade de trabalhar. O ator precisa se mostrar, caso contrário, ele morre de tristeza”, confessa Lucinha.

As Meninas Velhas ficará em cartaz até o fim do mês no Teatro Vivo. Lucinha, no entanto, revela que já há outro espaço em vista para que a peça siga sendo apresentada em São Paulo. “É um sucesso, não podemos parar! Se já era difícil fazer teatro no Brasil, agora está dez vezes mais”, comenta.

A história de uma gata

Apesar de a peça ter uma trilha sonora original, Lucinha não canta no espetáculo – salvo em um pequeno momento. Ela, que também tem uma carreira consolidada como cantora, é muito lembrada por uma canção que gravou há mais de 40 anos que – sem exagero – povoa o imaginário coletivo e se renova com as redes sociais.

Trata-se de História de uma Gata, de Luis Bacalov, Sergio Bardotti e Chico Buarque, que ela gravou para a trilha do filme Os Saltimbancos Trapalhões, de 1981 – Nara Leão havia gravado a canção em 1977. Aquela que tem o refrão “Nós, gatos, já nascemos pobres/ Porém, já nascemos livres/ Senhor, senhora ou senhorio/ Felino, não reconhecerás”.

“Essa música nunca me abandonou. Sou um ponto de referência dela. Costumo brincar que eu era uma gatinha, agora sou uma gatona a caminho de ser uma gata velha. Uma vez, apresentando uma convenção de médicos, no final, alguém pediu para eu cantá-la. Eu cantei e aquela plateia de adultos cantou comigo. E saiu todo mundo feliz e sorridente”, conta.

Além da peça, Lucinha poderá ser vista, a partir de 15 de abril, na série Sentença, produção original da Amazon Prime, com Camila Morgado como protagonista. Criada por Paula Knudsen, e produzida por Carla Ponte e Santiago López Rodríguez, da Cimarrón Cine, a produção foi filmada no Uruguai.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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