As virtudes da história alternativa para o Brasil

24/fev 08:00
Por Gastão Reis

A historiadora americana Barbara Tuchman se tornou mundialmente conhecida por ter tido a coragem de enfrentar a historiografia tradicional, que só se atém aos fatos acontecidos, ignorando o que poderia ter sido quando as alternativas já eram de conhecimento dos políticos na época. De seus vários livros publicados, talvez os dois mais famosos sejam: “Um Espelho Distante – O calamitoso século XIV” e “A Marcha da Insensatez – De Tróia ao Vietnã”. Neste último, ela explora as guerras de Tróia e do Vietnã, arguindo a brutal dose de insanidade com que foram conduzidas ambas estas guerras, ao ignorar as conhecidas alternativas então existentes.

No meu livro, “História da Autoestima Nacional – Uma investigação sobre monarquia, república e preservação do interesse público”, adotei a mesma metodologia proposta por Barbara Tuchman, com resultados bastante concretos. Nele, comprovo o descaminho histórico em que o Brasil se meteu, desde 1889, quanto à sua moldura político-institucional ao adotar nosso desastrado presidencialismo. (As instabilidades crônicas do regime republicano brasileiro foram arroladas no meu artigo anterior.)  Na segunda edição, terá um Anexo II – Os Equívocos da Historiografia Econômica Consolidada e as Novas Pesquisas” em que apresento as falhas gritantes de uma história mal pesqui-sada, a nossa, e seus efeitos deletérios sobre o desenvolvimento do País.

Antes que lhe passe pela cabeça, leitor e leitora, que a república já está aí, consolidada há mais de um século, eu lhe lembraria que a Holanda foi uma república por dois séculos, e voltou a ser uma monarquia parlamentar até hoje. Ou o que aconteceu com a antiga URSS, após 70 anos de existência. Acabou ruindo com Gorbachev ao se dar conta que sua organização econômica, baseada no planejamento central, não funcionava. Tiveram que reconhecer que Adam Smith, em seu livro “A Riqueza das Nações – Uma investigação sobre a natureza e causas da riqueza das nações”, já havia mostrado, desde 1776, o caminho das pedras do funcionamento dos mercados eficazes.

As disfunções institucionais do presidencialismo à brasileira vêm se agravando desde 1988. É impressionante a montanha russa política em que o País se meteu desde então. A pobreza de nossa moldura político-institucional se revela cada vez mais. Os meses que antecederam à posse de Lula foram marcados por concentrações de populares em frente a quartéis pedindo intervenção militar para impedir que Lula se tornasse presidente. Duas questões sérias estão por trás dessas manifestações.

A primeira delas é que eram grupos golpistas, que não se conformavam com o resultado das eleições. Estavam no exercício ilegal de atos antidemocrá-ticos inaceitáveis. A segunda, reveladora de nossa atual pobreza institucional, é a ausência de mecanismos legais que impedissem tal situação. Em outras palavras, diferentemente do que acontecia até 1889, não há dispositivos institucionais para lidar com as crises políticas. Ou seja, a população estava também protestando contra o STF, que ressuscitou Lula politicamente, como denunciou o ex-ministro Marco Aurélio Mello até em livro já publicado. Lula não poderia ter sido sequer candidato. A legitimidade das decisões tomadas pelo STF continua a ser questionada (e odiada) pela população. Simples assim.

Para tumultuar ainda mais o quadro político, Lula, sem público interno, resolveu viajar frequentemente em busca de um público externo que lhe desse ouvidos. E se autointitulou líder de peso no cenário internacional sem que fosse visto como tal por seus pares. Cada vez mais, menos levado a sério, ele se perdeu nas declarações feitas na Etiópia ao qualificar como genocídio o que Israel vem fazendo na Faixa de Gaza como se fosse um novo holocausto. Foi o bastante para receber o cartão vermelho de “persona non grata” em Israel, e desaprovação da Europa e de boa parte do mundo, exceto do grupo terrorista Hamas que lhe agradeceu. A imagem internacional do Brasil beijou a lona.  

No plano interno, a coisa pegou fogo, pois expressou uma opinião pessoal em lugar de manter o devido respeito pela opinião pública brasileira, que não comunga de suas diatribes vingativas. Ele, na qualidade de Chefe de Estado e de Governo, deveria se lembrar a todo momento que está falando em nome da Nação Brasileira. Para tanto, é preciso estar alinhado ao que a população pensa e defende. Ter sido eleito não lhe dá o direito de dizer o que bem entende. Em especial, no plano internacional.

E foi assim que entrou em erupção o vulcão político brasileiro, que já conta com cerca de 130 assinaturas de deputados a favor do impeachment de Sua (dita) Excelência. Décadas de respeito mundial pela diplomacia brasileira, onde sempre predominou a cautela e o bom senso, desde os tempos do Barão do Rio Branco, foram por água abaixo. Hora de o senado e da câmara dos deputados expressarem por escrito sua posição contrária ao despautério lulista, afirmando que ele falava em nome dele e não da Nação Brasileira.

As consequências já se fazem sentir e vêm se agravando. No plano interno, é perceptível uma paralisia de decisões empresariais e de investimento na espera do que vai acontecer, tendo em conta o evento que deverá ocorrer na Av. Paulista no domingo, 25 de fevereiro corrente. No plano externo, Lula reduziu brutalmente sua margem de manobra. Tiro no próprio pé. Na prática, e não só em Israel, se tornou uma pessoa indesejada em boa parte do planeta. Suas andanças internacionais perderam público. Sobraram visitas dele a ditadores em algumas partes do mundo.

Aparentemente, o País está se dando conta de que está nas mãos de um presidente a quem falta o devido equilíbrio. É também um momento para meditarmos sobre nossa pobreza político-institucional presidencialista que nos deixa sem instrumentos ágeis para combater as crises. É notável que, até 1889, sob o parlamentarismo monárquico, onde havia voto de desconfiança e o poder moderador independente da chefia de governo, dispuséssemos de ins-trumentos ágeis para gerir crises e evitar vexames internacionais para o País.

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