Atrás em pesquisas, Le Pen atrai votos com novo discurso e foco na economia
Primeiro ela mudou o nome do partido, fundado por seu pai. A Frente Nacional virou Reunião Nacional (RN), em 2018. Depois, foi mudando sua atitude, seus gestos, sua imagem e seu material de campanha. Assim, pela primeira vez, Marine Le Pen leva um partido de extrema direita ao segundo turno com verdadeira chance de chegar ao poder.
Por trás da nova imagem de uma mulher moderna, sorridente, que posa com filhotes de gato, está a sua sobrinha Nolwenn Olivier. Ao contrário de sua prima Marion Maréchal, que, além de tirar o sobrenome Le Pen, apoiou o candidato Éric Zemmour no primeiro turno, Nolwenn é a responsável por seu guarda-roupa mais luminoso, sua atitude mais serena e seus posts nas redes sociais.
Aparentemente, suas fotos com gatos e alguns passos de dança ajudaram a melhorar sua imagem entre os jovens. Seus eleitores estão majoritariamente entre 18 e 24 anos – 59% deles votam nela, segundo pesquisa do grupo BVA.
Com três filhos e divorciada, Le Pen se declara uma “solteira descomplexada”. A revista Elle, nesta semana, destacou na capa: “Marine Le Pen no Eliseu? Para nós, é não!”, justificando a escolha editorial dizendo que “é uma mulher que não defende os direitos das mulheres”.
Marine, de 53 anos, que entrou para o partido de seu pai quando tinha 18, tenta pela terceira vez a presidência – e pela segunda chega ao segundo turno. Em 2017, teve 33,9% dos votos, ante 66,1% de Mácron.
Moderação
No seu folheto de campanha – entregue a todos os eleitores pelo correio, junto com as cédulas, alguns dias antes da votação -, ela trazia, no primeiro turno, apenas o seu nome: “Marine, mulher de Estado”. No folheto do segundo turno, nem nome nem sobrenome, apenas a frase: “Para todos os franceses”.
“Ela vem progressivamente mudando esta imagem, tentando se afastar ao máximo da imagem do seu pai, Jean-Marie Le Pen. Enquanto ele encarna o ódio, ela quer encarnar o amor. Ele posava com seus dobermanns, como símbolo de agressividade. Ela posa com gatinhos, filhotes, que são fofos. É uma estratégia de inversão”, afirma o diretor do programa Ipsos Flair, do instituto de pesquisas Ipsos, Yves Bardon.
Para a historiadora Maud Chirio, o processo de “desdemonização” de Le Pen foi abraçado por muitos setores da mídia e da política. Além disso, a chegada de Zemmour no cenário eleitoral a colocou como uma candidata mais ao centro. “Hoje, o RN é uma força muito mais integrada no sistema político”, disse. “O processo de desdemonização do RN também aconteceu no campo progressista.” Segundo ela, isso justifica o fato de muita gente de esquerda hoje dizer “Nem Macron nem Le Pen”, como se eles fossem equivalentes. “Não são”, garante Chirio.
O professor da Sciences Po e especialista em defesa e relações internacionais William Leday concorda. “Primeiro, houve uma banalização das ideias de extrema direita, iniciadas pela própria direita dominante. Recordamos os desabafos de Nicolas Sarkozy, como candidato e presidente, sobre a questão da segurança, que ele correlacionou com as migrações que produziram uma liberação do discurso racista”, disse Chirio. “Parte das pautas e do vocabulário da extrema direita foram abraçados pela centro-direita.”
Normalização
Muitos franceses são radicalmente contra a extrema direita, mas não conseguem votar em Macron, segundo ela, por não terem vivenciado a experiência de ter um país liderado pela extrema direita. “A semântica política reflete tanto as ideias quanto a intenção. Há uma atenuação de certas posições, em particular na Europa, onde Le Pen já não propõe sair do euro.
“Voto Le Pen porque ela é francesa. Eu sou francesa, com um espírito completamente francês, o que quer dizer livre, a liberdade antes de tudo. A gente ama todo mundo, os sul-americanos sabem bem, os argentinos, os bolivianos, a gente tem ótimas relações”, disse a septuagenária Anne Lavenier, eleitora de Marine. “Ontem, falei com um tuareg, um argelino que vota em Le Pen há 40 anos. Ele mesmo disse que é feio ter duas nacionalidades. É como ter um pé entre duas cadeiras, pois há um risco que quebrar e cair.”
Sobre a xenofobia do programa de Le Pen, ela rebate: “No seu país, você não pode ter alguém que te cospe na cara. É isso o que acontece aqui. Nós, franceses, somos mal vistos. Se somos católicos, então, é pior ainda”, disse Lavenier.
Identidade
Um outro cabo eleitoral de Le Pen se aproxima: “Eu sou judeu, negro e sobretudo francês. Voto em Marine Le Pen porque ela é a única capaz de unir todos os franceses, de todas as origens”, disse Christian Degbegni, de 58 anos, que tem origens no Benin e na Etiópia, mas apenas uma cidadania: a francesa. “Acho que ela faz uma boa política. Somos pelo fim da imigração selvagem e descontrolada e pela prioridade nacional. Porque a imigração selvagem causa delinquência.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.