Autonomia do BC hoje é inferior à pensada em 1964, diz Campos Neto

06/10/2021 12:29
Por Eduardo Rodrigues e Thaís Barcellos / Estadão

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, avaliou nesta quarta-feira que a autonomia do BC aprovada neste ano é inferior à pensada em 1964, pois ocorreria em menos dimensões do que a autonomia usufruída por seu avô Roberto Campos no comando da instituição. Nos anos 60, a autonomia do BC era administrativa, operacional e financeira, enquanto hoje a autonomia é apenas operacional e um pouco financeira – sem a parte administrativa.

“Presidentes e diretores do BC tinham mandatos de prazos fixos de seis anos, superiores ao mandato de presidente da República que era de cinco anos. Essa autonomia durou pouco tempo, acabando em 1967. Roberto Campos chegou a dizer ao presidente Costa e Silva que o fim da autonomia era um equívoco, porque o BC é o guardião da moeda. O então presidente retrucou: o guardião da moeda sou eu”, relatou. “Quando nós elaboramos os documentos para defender a autonomia do BC, busquei muito do que já tinha sido pensado em 1964, que é moderno para os padrões de hoje. Foram necessários 40 anos para uma confluência de fatores que restabelecem a autonomia do BC”, completou.

Em cerimônia de lançamento do livro “Roberto Campos: diplomata, economista e político – O constituinte profeta”, que reúne artigos publicados por seu avô em diversos veículos jornalísticos entre 1987 e 1996, Campos Neto considerou que o detalhamento que venceu a perenidade do texto constitucional de 1988 é uma das razões pelas quais a Constituição sofreu mais de 100 emendas nos últimos 32 anos.

“Para Roberto Campos, a Constituição de 1988 estabeleceu um amplo conjunto de direitos nem sempre compatíveis com as fontes de receita e atribuiu ao Estado um papel fundamental em empreendimentos estratégicos e apresentou em sua forma final um caráter anacrônico, muito vezes não alinhado com i avanço da globalização e do livre mercado, que dificultava a criação de um ambiente favorável à livre iniciativa, à acumulação de capital e ao progresso tecnológico”, afirmou.

Campos Neto lembrou que seu avô defendeu como senador constituinte as liberdades individuais e econômicas, a redução da intervenção do Estado na economia, o intercambio tecnológico entre o Brasil e outros países e o tratamento homogêneo ao capital. “Roberto Campos foi autor de 186 emendas, das quais 24 foram aprovadas e 28 parcialmente aprovadas. Ou seja, teve mais derrotas que vitórias. As emendas tratavam do pensamento liberal e tinham como objetivo aumentar a eficiência da atividade econômica e os incentivos à iniciativa privada”, completou.

Entre as propostas havia medidas para flexibilizar as relações de trabalho, aumentar a eficiência na exploração de petróleo e garantir o tratamento isonômico ao capital, independentemente de sua origem. Campos Neto citou ainda emendas propostas por seu avô para reduzir o nível de detalhamento do texto constitucional, para que ele se tornasse mais estável ao longo do tempo.

A publicação tem entre seus organizadores o jurista Ives Gandra da Silva Martins e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes. “São textos que marcavam episódios no ambiente pré o e pós constituinte, que traduzem um pensamento crítico a propósito aquele momento. De alguma forma, soubemos fazer as corrigendas de equívocos apontados por Roberto Campos em diversos pontos da Constituição”, avaliou Mendes.

No evento, o ministro do STF aproveitou para elogiar o governo FHC (no qual atuou como advogado-geral da União), que considerou uma exceção ao combater o estatismo criticado por Roberto Campos. “Registro o governo que tive a honra de integrar como um governo de saudosa memória. Oxalá a gente volte daqui a pouco para padrões razoáveis de racionalidade no que concerne a governança e governabilidade”, acrescentou.

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