Brasileiro pode economizar 80% ao trazer vinho da Argentina na bagagem
A desvalorização do peso não apenas deixou baratos os restaurantes na Argentina, mas também se apresentou como uma oportunidade para os brasileiros aficionados em vinhos. Tanto é assim que, segundo lojistas do comércio especializado na bebida de Buenos Aires, os brasileiros já representam a maior parte da clientela. E esse interesse tem razão de ser: vinhos que saem por R$ 100 ou mais no Brasil podem sair entre 40% e 80% mais em conta quando trazidos na bagagem.
Isso fica claro nos bairros Palermo, Recoleta e Retiro, que concentram muitos hotéis frequentados por turistas brasileiros. Gerente da loja de vinhos Go Bar, no shopping Patio Bullrich, em Palermo, Florencia Ibarra conta que os brasileiros são seus principais clientes. A maioria busca rótulos de Malbec e Cabernet Sauvignon, principalmente de vinícolas da região de Mendoza, no Norte do país.
“Os brasileiros vêm querendo provar vinhos diferentes e acabam comprando muito porque a diferença de preço é muito grande. Temos clientes uruguaios e dominicanos também, mas os brasileiros são 80% do movimento dos vinhos”, diz Florencia. “Os argentinos, curiosamente, compram mais destilados.”
Na loja Go Bar, uma garrafa de DV Catena Malbec 2019, por exemplo, sai por 2.600 pesos. Na conversão do câmbio paralelo do fim de junho, quando a reportagem do Estadão esteve em Buenos Aires, o real valia 53 pesos. Logo, os 2.600 pesos se traduziam em cerca de R$ 51. No Brasil, o mesmo rótulo varia de R$ 100 a R$ 150 em supermercados online.
Enrique “Quique” Martínez é gerente de uma enoteca na Recoleta, outro ponto muito frequentado por brasileiros em Buenos Aires. Ele calcula entre 60% e 80% a proporção de brasileiros que frequentam sua loja. E concorda com a percepção de que eles são atraídos pelo câmbio favorável.
“Os preços são, em média, um terço menores do que no Brasil. E como temos muitos hotéis na região eles acabam vindo comprar conosco”, explica. Ali, o Rutini Malbec 2019 custa 2,5 mil pesos, cerca de R$ 47 reais. No Brasil, esse vinho não sai por menos de R$ 130.
Três caixas na bagagem
A família Belo veio de carro a Buenos Aires para visitar a produtora audiovisual Fernanda Belo, de 37 anos, que está morando na cidade. A visita às lojas de vinho foi obrigatória. E o clã Belo vai voltar para o País com o porta-malas cheio, segundo João Marcos, de 67 anos: “Estamos de carro e temos autorização para levar até três caixas. Vamos levar uma caixa por família.”
Segundo o patriarca, vale a pena levar vinho na bagagem. “Está valendo muito a pena não só comprar vinhos, mas em geral. A comida também é muito barata. A Argentina como um todo ainda é muito barata para nós. Sempre que eu venho pra cá, o pessoal que gosta de vinho pede alguma coisa… Então, a gente leva uma lembrança – e nada melhor que vinho”.
A família Gonçalves também aproveitou para passar em uma loja de vinhos antes de voltar para o Brasil. “Os preços estão bons para alimentação, e os preços dos vinhos também”, diz o farmacêutico e bioquímico Maurício Gonçalves, ao lado da esposa Ingrid e do filho Enzo. A família, de Iracemápolis (SP), visitou pela primeira vez Buenos Aires e aproveitou para conhecer a neve em Bariloche.
“Compramos muitos vinhos de Argentina e do Chile. Agora, vamos aproveitar pra levar duas caixas, que eu acho que é o que podemos levar. Fazendo a conversão do peso por real, em média o valor dos vinhos que conhecemos está saindo por R$ 60 ou R$ 70, e lá a gente paga mais caro”, diz Maurício.
Somando tudo isso, você consegue pagar uns 70% mais barato (nos vinhos).”
Sílvio Barros, engenheiro
Grande consumidor de vinho, o engenheiro Sílvio Barros, de 69 anos, está aproveitando para levar para casa rótulos que no Brasil têm alto preço, como Catena Zapata, Marcelo Pelegrini, Salentein, Vale del Uco e El Enemigo. Considerando todos os descontos, ele diz que a economia em relação aos preços praticados no Brasil pode facilmente ultrapassar os 50%.
“Vale a pena. Primeiro, tem a questão do preço, em relação ao Brasil. Depois, aqui na Argentina, pagando em ‘cash’ (dinheiro vivo), você ganha ainda mais 10% de desconto. No free shop, tem também 14% em devolução de impostos. Então, somando tudo isso, você consegue pagar uns 70% mais barato”, diz o engenheiro de São Paulo.
Há ainda uma última opção, caso as garrafas não caibam na mala: é o freeshop do Aeroporto de Ezeiza. O segredo é gastar os últimos pesos da viagem, já que as lojas aceitam a moeda local na conversão do peso oficial – muito abaixo do valor praticado nas ruas, o que na prática favorece o turista.
Ali, vinhos como o Rutini Cabernet Malbec 2020 custam o equivalente a R$ 50. O El Enemigo sai por R$ 90 e o Angelica Zapata, por R$ 100. A vantagem, claro, é que o turista não corre o risco de sujar a bagagem caso a garrafa quebre, já que é possível levar as compras no avião como bagagem de mão.
Outra opção para quem busca vinhos baratos em Buenos Aires são os supermercados de bairro. Todos possuem setores de vinho, ainda que não possuam uma variedade de rótulos tão grande quanto a das as enotecas. A reportagem por exemplo encontrou um DV Catena Malbec 2019 por 1.800 pesos em um supermercado no bairro de Retiro – R$ 33 na conversão do fim de junho. Para quem busca vinhos bem baratos é possível encontrar garrafas por menos de R$ 20, como é o caso do San Valentín.
Apesar dos brasileiros, setor está preocupado
Apesar do bom momento nas vendas, catapultadas pelo retorno do turismo à Argentina com o avanço da vacinação contra a covid-19, e o próprio aumento no consumo de álcool na pandemia de covid-19, a crise econômica e a alta inflação no país prejudicam o setor.
Um dos principais problemas é a escassez de garrafas de vinho. A Argentina tem apenas duas fábricas do material e precisa muitas vezes importar o material de países como a França. Com a restrição à compra de dólares para importadores imposta desde junho pelo governo de Alberto Fernández, fontes do setor relatam dificuldades.
Outro problema são os reajustes. As lojas têm dificuldades em segurar os preços diante de uma inflação que pode chegar a 90% neste ano. É comum nas lojas do centro os vendedores brincarem: “Hoje está mais barato que amanhã”. Eles relatam ainda que um mecanismo comum para atrair clientes é repassar o aumento que vem dos fornecedores e anunciar promoções com algum desconto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.