Capitalismo selvagem
Acho que hoje ninguém mais tem dúvida sobre o conceito da expressão “capitalismo selvagem”. Basta olhar para as queimadas na região amazônica para se ter um exemplo dos frutos da ganância, da irracionalidade, da busca do lucro a qualquer custo. Constata-se a clarividência “da força da grana que ergue e destrói coisas belas, da feia fumaça que sobe, apagando as estrelas” como cantara Caetano em “Sampa”.
É triste ver a insensatez respaldada politicamente. O desenvolvimento econômico é possível de forma racional, respeitando a natureza, investindo em educação, ciência e tecnologia, com uma política preservacionista, sem deteriorar o ambiente em que vivemos. Não há incompatibilidade entre o progresso e a preservação do meio natural.
Em nosso país, assistimos a um aumento das queimadas e do desmatamento exatamente em um período em que se evidencia uma política de cunho nacionalista, erguendo as cores da bandeira nacional.
— Que patriotismo é esse que se omite diante da destruição das nossas matas, que defende a venda do patrimônio nacional?
— Que política é essa que se acha incompetente para administrar os bens públicos, por isso prefere privatizá-los?…
Para exemplificar essa lesiva destruição do nosso verde, basta também dizer que de 1º de janeiro a 28 de agosto do corrente ano, foi constatado, no Estado de Rondônia, um aumento de 164% no número de focos de incêndio em relação ao mesmo período em 2018. No Estado do Pará, esse aumento chegou a 169%. Esses dados são do Programa de Queimadas do Inpe.
Muitos que atuam irracionalmente nesse processo de grilagem irão sofrer depois com o desequilíbrio do ecossistema, porque as variações climáticas são drásticas. O dito “agronegócio” depende de uma sistematização de períodos de chuvas. E estas, diante dessas agressões ao meio ambiente, tendem a causar grandes tragédias por meio de enchentes, ou ficam escassas, provocando secas por um longo período. Certos de que essas queimadas provocam um desequilíbrio ambiental, propiciando o surgimento de pragas na lavoura, é que, neste ano, também se constatou um aumento na liberação do uso de agrotóxicos. Em 2019, até agora, já foram liberados 290 produtos. Esses venenos vão parar na mesa da população por meio das frutas e legumes.
É válido ressaltar que também cresceu o número de doenças respiratórias provocadas pela fumaça, por agentes poluentes oriundos dessas queimadas. Crianças e idosos são os mais atingidos. Há sequelas irreversíveis por causa dessas ações contra a natureza, uma vez que há extinção de determinadas espécies tanto na fauna como na flora. É triste ver a insensibilidade das pessoas cegas pelo capital, só enxergam o lucro.
A defesa do meio ambiente consiste, inquestionavelmente, em uma ação política, porém não deve ser atrelada às bitolas do sectarismo partidário. É a vida que está em jogo. Pensar no bem comum consiste em priorizar a coletividade, deixando de lado os posicionamentos egocêntricos.
O homem não é o único animal que habita este planeta. E não estamos aqui para viver apenas em função do vil metal. E os que professam uma vivência cristã devem saber que “não se pode justificar uma ação má com boa intenção”, pois “os fins não justificam os meios”. O capitalismo é sem pátria, além de ser a ferrugem da ética e da moral.
O universo que há em uma floresta não pode ser destruído para a criação de pastos. A Amazônia não pode tornar-se uma selva de pedra. A mobilização mundial diante das queimadas é o reflexo de uma consciência de que a ação humana é que pode exterminar a vida na Terra.