Casal transforma movimento modernista em livro infantil

22/03/2021 08:49
Por Estadão Conteúdo

Com criatividade e lirismo, o livro Colorindo a Semana de Arte Moderna de 22 (Editora Datum) apresenta para as crianças diferentes artistas que permearam o movimento, enquanto propõe atividades lúdicas – como, por exemplo, produzir as próprias tintas a partir de uma gema de ovo, técnica utilizada pelo pintor Alfredo Volpi (1896-1988). O casal de autores, Leandro Thomaz e Mayra Correia, contou com o apoio dos dois filhos para produzir uma bela obra modernista. O livro, lançado pela plataforma de financiamento coletivo Catarse, foi contemplado com o Programa de Ação Cultural (ProAc) em 2019, em uma iniciativa para promover produções sobre a Semana de Arte Moderna de 1922.

Os autores fogem de lugares-comuns que podem surgir a partir do tema, lançando luz a personagens menos conhecidos entre o grupo, como os arquitetos Antonio Moya (1891-1949) e Georg Przyrembel (1885-1956). E, diferentemente do que se pode imaginar, não vivem de arte ou literatura: Mayra é formada em enfermagem, e Leandro é geólogo. Na seguinte entrevista, respondida por e-mail, Mayra mostra o que eles têm em comum com os artistas de 1922 e o anseio de mudar a realidade pela arte.

Como foi o trabalho de uma enfermeira e um geólogo para escrever um livro infantil sobre a Semana de Arte Moderna de 22?

Nossas profissões são apenas uma parte do que somos. Ter visões em distintas áreas potencializa a criatividade. O que acontece é que esse geólogo e essa enfermeira se encontraram e tiveram filhos. Diante da construção da família, entendendo que o Brasil vem enfrentando desafios cuja base está relacionada com a educação, nos questionamos: que tipo de mundo deixaremos para nossas crianças? Diante do cenário atual, sabemos que essa resposta não é muito otimista. Buscamos encontrar caminhos para transformar essa realidade. Passamos então a criar livros que tornassem a arte, a ciência e a cultura acessíveis, principalmente às crianças. Colorindo a Semana de 22 mostra justamente isso, um grupo de artistas que acreditaram que a realidade daquela época poderia ser transformada através da arte. As atividades foram discutidas não só entre nós dois, mas também com nossos filhos: Rodrigo, de 7 anos, e Felipe, de 3. Eram nosso “departamento de testes”, sendo os responsáveis pela aprovação final de cada atividade, a dupla foi bem rigorosa (risos). A atividade do Vicente do Rego Monteiro, por exemplo, foi uma sugestão do irmão mais velho, o Rodrigo. Ele entendeu as cores terrosas da obra do artista e sugeriu a atividade de pintar utilizando café e carvão.

Qual a importância que vocês destacariam para uma criança dos anos 2020, de estudar e conhecer a Semana de Arte Moderna de 1922?

A pandemia trouxe uma nova realidade para as crianças, com menos liberdade de passeios e interação social. Nesse contexto, a arte pode agir como uma válvula de escape, uma terapia, uma forma de expressão para a angústia que pode surgir. Aqui em casa, percebemos que os nossos filhos passaram uma boa parte do tempo criando brinquedos com papelão, pintando e desenhando. E que essa foi uma forma encontrada por eles para lidar com a ansiedade. Uma surpresa foi a aceitação do nosso livro por crianças com necessidades especiais, por exemplo, crianças que estão no espectro autista – recebemos diversos feedback positivos de famílias que adotaram o Colorindo a Semana de 22.

Nas escolas, o livro pode ser usado por professores de Arte, de História, também de Português e até de Química (com a produção das tintas). Vocês pensaram nisso na hora que estavam fazendo a produção?

Quando fizemos a proposta do livro ao ProAC, já indicamos a possibilidade de trabalhar a vertente de pintura e de poesia. Quanto mais nos aprofundávamos sobre o tema, percebemos o quanto o movimento era interdisciplinar, englobando inclusive música, escultura e arquitetura. E vimos que cada modernista influenciava o outro. Por exemplo, o escritor Mário de Andrade muitas vezes se inspirava nas pinturas de Anita Malfatti. E o escultor Victor Brecheret foi influenciado pelo arquiteto Moya. Por conta disso, expandimos as atividades em relação à proposta inicial. A arte tem a capacidade de se expressar por qualquer que seja a área. Aqui, miramos no público infantil, mas o que queremos mostrar é justamente que toda pessoa pode fazer arte. Tanto que temos aqui um geólogo e uma enfermeira mostrando que a arte é possível e pode ser acessível. Precisamos desfazer esse conceito de que arte, ciência, cultura e educação são um privilégio para poucos.

Quais são os planos para o centenário da Semana de 22?

O Centenário da Semana de Arte Moderna de 1922 é um marco histórico importante. Terminamos o livro com um ano de antecedência justamente para haver tempo de divulgação ao público em geral e até mesmo de adoção do livro pelas escolas. Nesse ano, começamos com uma venda por meio do Catarse, mas com pronta entrega. Para o ano que vem, pretendemos que o livro esteja disponível nas principais lojas online do país, e em algumas livrarias estratégicas. Fazia parte do projeto a criação de oficinas presenciais para realização das atividades do livro, porém com a chegada da pandemia, essa contrapartida precisou ser repensada e adaptada para a modalidade à distância. Já está sendo elaborada, neste momento, uma alternativa acessível e segura. Acreditamos que a arte pode ser adaptada a qualquer cenário, e é isso que vamos praticar.

COLORINDO A SEMANA DE 22

Editora: Datum (54 págs., R$ 44,

informações: editoradatum. com.br

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