Com todo respeito
Na manhã do dia 02/06, recebi a ligação de um amigo leitor assíduo que sempre tece comentários sobre o que escrevo. Mas, no citado dia, o tom do “alô” dele estava diferente. Após o cumprimento, indagou:
— Você não escreveu nada sobre as profissionais do sexo? Não sabe que hoje é o dia das prostitutas?
Já na defensiva, respondi:
— Confesso que não sabia que existia o dia das prostitutas.
— Como assim? Logo você, um cara antenado, não sabe que hoje é o Dia Internacional da Prostituta! Dia dedicado às mulheres que prestam um serviço imprescindível à sociedade. Responsáveis pelo equilíbrio de vários relacionamentos conjugais. Servem a muitos homens carentes que vivem afogados na solidão, por isso procuram amor nos seios das mulheres que a sociedade, injustamente, tende a discriminar e a dizer que levam uma vida fácil. Diz isso quem não sabe o que elas enfrentam.
Pela forma como argumentou, senti-me como se estivesse cometido um grande lapso. E, em legítima defesa, tentei amenizar a minha culpa:
— Isso foi instituído por agora? Não sabia…
Em tom didático, ele falou:
— Desde de 1976, que se comemora, em 02 de junho, o dia das prostituas. Isso devido ao fato ocorrido na França em 1975. Mais de 100 prostitutas ocuparam a Igreja Saint Nizier, em Lyon, com o propósito de chamar a atenção da sociedade para a situação precária em que viviam: descriminadas, exploradas…
— Fizeram greve?…
— Sim. Ficaram na igreja durante 8 dias. Depois a polícia entrou, bateu e tirou todo mundo de lá.
— Prometo que, na próxima semana, escreverei sobre esse assunto.
Só que a semana passou e não escrevi. Quando desliguei o telefone, o meu pensamento passeou por várias obras ligadas ao tema. A primeira que saltou à lembrança foi o livro de Gabriel García Márquez “Memórias de minhas putas tristes”, depois veio a coletânea “Livro das Cortesãs” e vários quadros de pintores famosos que registraram imagens de prostituas: Toulouse-Lautrec, Munch, Picasso, Van Gogh, Manet…
Se entrarmos no mundo mitológico, a questão da prostituição vai muito além. É considerada a profissão mais antiga do mundo.
Na manhã do sábado, 15/06, o telefone tocou de novo, atendi. Era o referido amigo:
— Você mandou alguma nota pro Gois?
— Não. Por quê?…
— Tem uma nota hoje com o título “Puta Day”, que diz: “Com duas semanas de atraso, a Vila Mimosa, região do Rio conhecida pela prostituição, celebra hoje o Dia Internacional da Prostituição, com palestra, shows e desfiles.”
Mais uma vez, entrei na defensiva:
— Viu! Muita gente também não lembrou a data. Ainda bem que você me ligou, já vou me adiantando aqui pra pedir desculpa. O texto que lhe prometi escrever ainda não saiu. Mandei pro jornal um outro que já estava escrito. O assunto até tangenciou o que você me sugeriu. Mas não deu. Andei muito atarefado, com vários pacotes de provas pra corrigir.
Dessa vez, como ele estava mais calmo, falei da Casa Rosa que havia na Rua Alice em Laranjeiras, no Rio, da rua Paissandu em Teresina…
Hoje cumpro o prometido. Para mim, um leitor assíduo é mais do que um cliente preferencial. Merece tratamento vip.
E, para explorar o contexto semântico, fiz até um poema com o título “Muito prazer”:
“A Poesia dá pra todo mundo./ Mas nem todo mundo dá pra Poesia./ Que pena…!/ Quem dá pra Poesia tem um prazer enorme./ O tesão de ler cura impotência./ Em um livro,/ quanto orgasmo/ na arte de usar a língua!”
Caro amigo, vamos combinar uma coisa: essa homenagem é só para as genuínas, as autênticas; as que não assumem e as que andam na boca do povo como xingamento devem ficar de fora.