Conquista da mulher no mercado de trabalho deve retroceder 4 anos com pandemia

09/03/2021 15:31
Por Karla Spotorno e Thaís Barcellos / Estadão

O segundo ano da pandemia de covid-19 em 2021 indica um retrocesso de quatro anos em termos de conquistas das mulheres no mercado de trabalho. E os prejuízos causados na empregabilidade e aqueles envolvendo a diferença de salário na comparação com homens só devem ser neutralizados em 2030 caso o ritmo dos progressos vistos antes dobre e os esforços de boas práticas empresariais e políticas públicas aumentem, diz relatório anual da PwC.

“Por nove anos, os países registraram ganhos consistentes, mas com a covid-19 essa tendência foi revertida. É estimado que o índice caia 2,1 pontos entre 2019 e 2021, voltando ao patamar de 2017, de 62,4 pontos”, destaca a consultoria no documento intitulado Women In Work Index 2021. O relatório avalia a situação do mercado de trabalho feminino nos 33 países integrantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), da qual o Brasil ainda não faz parte.

No exterior, o fenômeno chamado “shecession” (recessão feminina, em português) evidencia o quadro de prejuízos. Segundo os pesquisadores, a recessão provocada pela pandemia atingiu mais fortemente os setores que empregam mais mulheres que homens.

Na anterior, pela crise financeira global de 2008-2009 que desestruturou mercados, os segmentos mais penalizados foram os que empregam mais homens. Atualmente, nos 17 dos 24 países da OCDE que relataram aumento da taxa de desocupação em 2020, as mulheres eram a maioria dos desempregados.

A crise sanitária e econômica atual também aumentou a carga de trabalho doméstico – com cuidados com crianças, idosos e manutenção da casa -, retirando mais mulheres do mercado de trabalho. De acordo com levantamento da ONU Mulheres, elas já gastavam em torno de 6 horas semanais a mais do que eles com esses afazeres, não remunerados. E, com a pandemia, a diferença subiu para uma média de 7,7 horas por semanas. “A carga horária semanal das mulheres representa cerca de 31,5 horas de trabalho por semana, praticamente tanto quanto um emprego em período integral”, cita o estudo da PwC.

Potencial ao PIB

Cálculos da PwC sugerem que dobrar o ritmo dos avanços da mulher no mercado de trabalho pode resultar em ganho “impressionante” para os países. Se a taxa de ocupação feminina em todos 33 integrantes da OCDE subisse à da Suécia, líder consistente no ranking da consultoria, o PIB cresceria US$ 6 trilhões por ano, ao passo que acabar com a diferença de remuneração entre homens e mulheres aumentaria os ganhos delas em US$ 2 trilhões por ano.

Esse prêmio todo, porém, só deve chegar a muito longo prazo. Levando em consideração o ritmo dos avanços registrados nos últimos nove ano, a consultoria projeta que deve levar 22 anos para a taxa de participação das mulheres na força de trabalho ficar igual à atual taxa dos homens; 112 anos para acabar a diferença na remuneração de homens e mulheres nas mesmas posições; 60 anos para a taxa das mulheres empregadas em período integral ficar igual à dos homens; e, esse no curto prazo, 4 anos para a taxa de desemprego das mulheres cair à taxa dos homens.

A liderança no Women in Work Index 2021 ficou com a Islândia, que teve aumentos nos cinco indicadores da pesquisa, sobretudo na redução da diferença salarial entre elas e eles. A Suécia veio em segundo lugar e, em terceiro, a Nova Zelândia. Os cinco indicadores são a diferença de remuneração entre homens e mulheres; a participação feminina na força de trabalho; a diferença dessa participação com a masculina; a taxa de desemprego das mulheres e a taxa de mulheres empregadas em período integral.

“Infelizmente o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo para as mulheres. Por ser um país onde o sexismo e o machismo ainda perduram fortemente, não conseguimos avançar efetivamente na superação da discriminação e desigualdade de gênero”, diz Andrea França, da PwC. Ela pontua que numa sociedade como a brasileira, “onde elas são minoria na política, nos cargos de liderança e nos conselhos das grandes empresas” e alvo de poucas políticas públicas, é necessário “avançar muito para que a equidade de gênero se transforme em uma realidade”.

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