‘Crianças devem ler sobre o que foi a 2ª Guerra’, diz Elisabeth Gifford
“Quando Putin fala de nazismo na Ucrânia, é uma longa história, complicada”, diz a escritora inglesa Elisabeth Gifford sobre as acusações do presidente russo, citando o contexto da 2ª Guerra. Gifford é autora do livro O Bom Doutor de Varsóvia (Editora Jangada), que conta a atuação do pediatra Janus Korczak, oficial do Exército polonês, que retirou milhares de crianças do gueto de Varsóvia. A seguir, os principais trechos da entrevista ao Estadão:
Por que decidiu escrever esse livro?
Quis escrever o livro para disseminar as ideias de Korczak sobre como criar crianças e, claro, trazer sua história para as pessoas. Mesmo que se trate de um evento passado, as ideias dele sobre crianças têm impacto até hoje. Quando eu era professora e mãe de filhos pequenos fui fazer um curso sobre contação de histórias para crianças. Vi algumas citações incríveis e perguntei se podia copiar. A mulher me perguntou se eu conhecia Korczak e me contou sobre ele. Fui me interessando e decidi que queria escrever um livro.
Como foi o processo de pesquisas de um tema que envolve a 2ª Guerra?
Quis escrever uma espécie de reconstrução, o que pode ser um pouco ingênuo, afinal foi um tempo muito difícil. Então, li tudo que podia sobre Korczak e me deparei com Roman, filho de Misha – discípulo de Korczak e um dos protagonistas do livro – que me deu muitos detalhes importantes. Comecei a pesquisar sobre o campo de Varsóvia e aí percebi que teria de pesquisar também sobre a Ucrânia, afinal Misha era ucraniano. Acabei escrevendo uma ficção histórica. O romance de Misha e Sophia está no centro da história, com toda a questão do Holocausto de pano de fundo. Fiquei um pouco traumatizada ao tentar reconstruir o que era o campo de Varsóvia e, ao fim do livro, eu estava ansiosa, precisei passar por algumas sessões de aconselhamento para me acalmar.
Como foi a repercussão do livro?
As pessoas estavam interessadas na história. Acredito que, na Inglaterra, muitos não conhecem muito sobre a história da Polônia e como as coisas se desenrolaram lá durante a 2ª Guerra. Mas parte da minha ideia era apresentar Korczak às pessoas e creio que muitos gostaram de saber sobre ele.
Qual é a importância de falar sobre esses eventos atualmente?
Como você pode ver com a guerra na Ucrânia, esses eventos não estão tão no passado assim, não é? As pessoas precisam entender o que aconteceu para não serem surpreendidas novamente. Então, um exemplo, quando (o presidente russo) Putin fala de nazismo na Ucrânia, é uma longa história, complicada. Os ucranianos foram entusiastas de fazer parte dos atos nazistas com o povo judeu, pois equiparavam os judeus aos líderes russos que levaram a fome à Ucrânia. Isso porque, naquela época, os judeus recebiam condições de igualdade na Rússia para que pudessem subir na vida. Naquela época era mais seguro viver no campo de Varsóvia do que em algumas cidades. Sophia e Misha foram para o campo, pois havia uma retaliação brutal contra os judeus em Lviv (Ucrânia). Grupos nazistas na Ucrânia acreditavam que, sendo um grupo nazista, Hitler chegaria e diria ‘ok, vocês gostam da gente, vamos continuar juntos’. Mas perceberam que o que ocorreu com os judeus poderia ocorrer com poloneses e ucranianos.
Acredita que pode haver um novo regime nazista?
Creio que o regime nazista foi único porque, apesar de existirem tantos casos de opressões e genocídios, o nazismo tinha a filosofia de que algumas pessoas eram sub humanas.
Qual é a importância de falar com crianças sobre a 2ª Guerra?
É importante haver livros históricos sobre a 2ª Guerra, nos quais não haja distorções dos fatos. Você sabe o que ocorreu com Korczak no fim. Por ele ser famoso, teria saído facilmente do local, mas ficou e chegou a ajudar 4 mil crianças a deixarem o campo em trens em um único dia.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.