Crônica do Ataualpa: A maternidade

08/05/2022 08:00
Por Ataualpa Filho

Sempre tive dificuldade para escrever sobre o segundo domingo de maio, dia dedicado às mães. Tenho dificuldade para definir “Mãe”. Como definir o Amor? Fala-se mais do que ele proporciona quando se manifesta de forma plena. A maternidade em plenitude não se dissocia do ato de amar. Mãe não tem cor, nem classe social. Nos barracos ou nas mansões, o calor do amor materno é o mesmo. Por isso, sempre digo o óbvio: “Mãe é mãe”. E pronto. Nenhum adjetivo tem a amplitude conceitual para qualificar o ser “Mãe”. Se alguém diz: “Mãe é tudo”. Esse “tudo”, na frase, exerce função adjetiva com sentido vago. E se afirmar que “mãe é tudo de bom”; o “tudo de bom” precisa de um referencial: o bom para quem? Para quê? Em que condições? O “bom” está em uma posição relativa. “Mãe é mãe”. Em qualquer sentido que se faça a leitura, a significação se mantém em equilíbrio.

Neste mundo tão relativizado, as concepções absolutas precisam ser expostas: entre os primatas, são as fêmeas que, por natureza, carregam o ventre em que a vida pode ser gerada. Inquestionavelmente o ser Mãe está relacionado a uma concepção feminina. E, na espécie humana, a mulher traz consigo esse mistério da procriação. Mas é válido ressaltar que não basta parir para ser Mãe na essência plena, é preciso amar imprescindivelmente: mãe – ame. Mamãe – a amem, amém. Até a palavra “Mãe” é poética em si, não precisa ser lirificada.

Não fiz nenhuma estatística, mas me atrevo a afirmar que ninguém é feliz por agredir a própria mãe. Quando vejo uma mãe chorando sobre o corpo de um filho assassinado, ou humilhada numa fila de um presídio para ser revistada, porque deseja visitar o filho que foi preso por furto, roubo ou tráfico, ou levando-o para casa bêbado, drogado, tenho a verdadeira noção do imensurável amor materno. Nenhuma mãe desiste do filho. Principalmente na dor, enxerga-se a força do amor de mãe. Vide Maria ao lado do Filho Crucificado. A dor também é inerente à maternidade. As lágrimas de uma mãe são facilmente identificadas. “O padecimento no paraíso” é muito mais em função do rumo do destino que os filhos tomam do que pelas dores da gestação.

Não há dúvidas de que o maior presente que um filho pode ofertar a uma mãe consiste em ter uma vida digna, que possa proporcionar a ela o orgulho de tê-lo colocado no mundo. Todas as mães trocam qualquer presente pela satisfação de ver, no fruto do seu ventre, um exemplo de vida. Não se compra o amor de mãe, não está exposto nas vitrines. Para uma verdadeira mãe, os bens materiais não superam os gestos de carinho, de afeto e acolhimento. A dimensão da relação “mãe e filho” não se restringe ao âmbito comercial.

Nunca fui ao shopping levado pelo modo imperativo dos verbos das publicidades que tornam “o dia das mães” uma simples data para aquecer o consumo. Acho isso um abuso da imagem materna. O pior é que esse fato contribui para o surgimento de ações demagógicas, hipócritas: alguns filhos passam o ano tratando mal a mãe e, nessa data, apresentam-se afetuosos, oferecendo presentes sem nenhum sentimento verdadeiro. As mães não são idiotas. Sabem discernir um gesto de carinho, por mais simples que seja.

Dentro dos limites masculinos, reconheço, louvo a essência mulher que dá vida, que dá à luz um filho. Se Deus é Amor. Mãe é a presença de Deus na Terra, porque esta é Amor também. Pela paz que há no ventre de uma mulher, até Jesus passou. Há de ser louvada eternamente essa Mulher, como toda a maternidade.

O segundo domingo de maio é somente o segundo domingo de maio. O dia das mães começa na gravidez e vai pelo resto da vida, mesmo quando a mãe tem a profunda dor de levar o filho ao túmulo.

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