De onde virá a desinflação nos EUA é questão sempre levantada, diz Campos Neto

24/maio 15:35
Por Juliana Garçon, Daniela Amorim e Gabriel Vasconcelos / Estadão

A inflação dos Estados Unidos é tema recorrente de discussão e as autoridades financeiras vêm debatendo a situação, disse nesta sexta-feira o presidente do Banco Cenrtral, Roberto Campos Neto, durante o 10º Seminário Anual de Política Monetária, do Centro de Estudos Monetários (CEM) do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), no Rio de Janeiro. “A gente está sempre discutindo os EUA, perguntando de onde virá a desinflação americana”, comentou.

Ele destacou que, nos EUA, há forte pressão nos custos, inclusive para promoção da sustentabilidade nas cadeias produtivas. “O custo da sustentabilidade tem sido mais alto do que o imaginado anteriormente. O custo de realocação das cadeias também.” Assim, haveria elevação da perspectiva da taxa de juros terminal no país.

Campos Neto disse haver um debate sobre o canal de transmissão da inflação, se seria efeito da poupança acumulada. “Há um debate se o padrão de consumo dos EUA mudou”, afirmou.

Mundo

O presidente do BC disse ainda que, com os preços de energia parando de cair, o segmento não dará contribuição importante no controle da inflação ao redor do mundo.

“O desafio que a gente tem agora é o preço da energia parando de cair. A energia não vai ser grande contribuidora. E a alimentação é uma grande incógnita. Parece que não temos mais grandes elementos para dizer que vamos ter uma inflação de alimentos caindo no mundo”, comentou Campos Neto. “Quando olhamos para alimentos e energia, teve um grande pedaço da desinflação que veio dessa parte. Mas (o preço da) energia parou de cair. Na Europa, elementos indicam que isso não vai ser mais um grande contribuidor (para o controle da inflação)”, continuou.

Ele observou que os índices de anomalia de temperatura têm piorado ao longo do tempo. “Quais os impactos disso em termos de preço para alimentos e energia? Há um debate muito grande no mundo entre os banqueiros centrais, que é o quanto esse tema de sustentabilidade cabe na agenda do Banco Central. Nós temos defendido que isso é muito importante porque influi na estabilidade de preços”, disse.

Incômodo

O presidente do Banco Central disse que, no início do ano, se sentia “desconfortável” com o pressuposto de que a inflação já estava sob controle. “Lembro de um evento recente de um banco em São Paulo. Todos falavam que a última milha da inflação já tinha ido, que a inflação já tinha convergido. Aquilo me deixava muito desconfortável”, afirmou.

Campos Neto assinalou, ainda, que o custo da crise de 2008 foi maior que o da pandemia de covid-19. “A gente viu que a crise de 2008 custou muito mais à economia global em termos de crescimento de longo prazo.”

Capacidade ociosa de empresas na China

Para o presidente do BC do Brasil, é preciso observar qual será o custo da capacidade ociosa em um grande número de fábricas chinesas. “A China é outro tema que a gente tem discutido bastante”, contou, lembrando que o país asiático tem passado por uma fase de forte desinvestimento do setor imobiliário e investimento grande no setor industrial. “Dos investimentos no setor industrial, mais de 60% estão ligados a temas de eletrificação”, comentou.

Ao mesmo tempo, disse, as restrições comerciais contra o país estão subindo num padrão acima do observado no passado. “Isso faz com que haja uma capacidade ociosa grande na parte de eletrificação. Vemos em várias fábricas de carros elétricos, algumas inclusive ligadas a empresas de real state que deram errado no passado.”

Neste cenário, apontou, pode ter ocorrido uma alocação ineficiente que terá impactos ainda desconhecidos. “Ficamos pensando se esse movimento de manada, conduzido por uma ideia ou um setor, não gera uma alocação ineficiente e qual o custo que isso vai ter lá na frente (na China).”

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