Depois do isolamento, o colorido: conheça o ‘dopamine Dressing’

17/10/2021 09:00
Por Ana Lourenço / Estadão

A maneira de nos vestirmos afeta o nosso humor. E muito do nosso humor é refletido na maneira como nos vestimos. A influência da roupa nas emoções humanas é tanta que vestir algo que nos deixa feliz gera uma adrenalina no corpo, que está ligada à dopamina, o hormônio do bem-estar. É daí que vem a nova tendência da moda: dopamine dressing, ou “vestir-se de dopamina”, em tradução livre.

Dopamina é um dos três hormônios da felicidade, ao lado da endorfina e da serotonina. “A dopamina é produzida pelo sistema nervoso central e pelas glândulas suprarrenais. Quanto mais embebido o nosso sistema nervoso está com esse neurotransmissor, maior nossa sensação de prazer. Isso melhora nosso estado de humor e nossa disposição. Quanto mais baixo está, menor a nossa disposição e maior nossos estados de humor negativo”, explica a neuropsicóloga Luciana Xavier.

Assim, quando nos sentimos bem com o que vestimos, o sistema nervoso tem a tendência de começar a produzir a dopamina. Com o avanço da vacinação e o clima de otimismo, veio a vontade de vestir liberdade. “Tivemos um período de restrições e agora as pessoas querem se vestir de maneira que elas se sintam felizes”, conta a gerente de serviços do cliente da WGSN, empresa de previsão de tendências, Mariana Santiloni.

O estilo não é necessariamente novo – afinal, o conceito existe desde os primeiros estudos sobre a psicologia das cores -, mas o termo, sim. “A gente começa a viver, agora, um arco-íris depois da tempestade e por isso vemos as cores como parte de um momento muito importante, no qual vamos voltar a celebrar, a se reunir novamente. Dar um nome traz um certo pertencimento”, diz Mariana.

A tendência veio forte especialmente durante a semana de moda de Copenhague, em agosto. Na mesma época, o verão norte-americano também apostava em peças néon, tons vibrantes e mistura de estampas como animal print, xadrez e floral. Até nos desfiles deste semestre de marcas como Dolce & Gabbana (para o inverno) e Moschino (para o verão) a tendência estava presente.

“A moda sempre foi ditada pelos adultos. Nos anos 1970, eles começam a olhar a rua, mas ainda as maisons decidiam tudo. Nos anos 2000, a moda estava tão desatualizada, tão quadrada, que ela vira, então, essa grande mistura democrática de hoje. Olhando mais para o jovem, para rua”, diz a consultora de moda Manu Carvalho. Com isso, é possível ousar mais, se permitir e fazer misturas “loucas” – desde que elas tragam felicidade. “Sabe quando a Marie Kondo fala ‘Fique com aquilo que te traz alegria’? É totalmente sobre isso”, brinca, usando como referência a organizadora que ganhou uma série na Netflix.

INTERNET.

Com as redes sociais há uma multiplicidade de escolhas entre emoções e tendências. “Antes existiam os padrões da TV, das celebridades. Hoje, no Instagram, você tem todos os estilos ao seu alcance. Isso muda tudo. A geração de hoje tem muito mais informações de moda”, conta a influenciadora Amanda Pieroni.

A mesma regra serve para a nova moda. A ideia central não é ditar uma ou outra peça, cor ou acessório, mas sim vestir-se de modo que você se sinta bem. “Não tem peças-chave. É sobre usar as roupas para se sentir bem, porque elas têm um efeito em nosso comportamento, um significado pessoal para cada um. E o dopamine dressing nada mais é do que unir as cores com a sua personalidade”, diz Amanda. Claro que colorido, figuras divertidas, estampas, imagens de otimismo, palavras e frases positivas são mais óbvias ao associar o novo estilo. Porém, é importante situar que a dopamina de cada um está num lugar individual. “Pode ser que alegria para alguém seja vestir preto”, exemplifica Manu.

A falta de regras é reflexo de um período em que, mais do que se preocupar se está na moda ou não, você passa a se vestir para si mesmo. Justamente um dos motivos pelos quais Amanda começou a se interessar por moda. “Desde criança, sempre sofri bullying e sempre usei a moda como refúgio e um jeito de me expressar – já que eu não podia me expressar com palavras, porque as pessoas não queriam conversar comigo. E as pessoas falam muito na internet sobre isso: a maneira de se expressar”, diz. “Por ficar preso em casa por causa da pandemia a gente quer ousar, a gente quer usar o que comprou na quarentena.”

E se o futuro nos permite a ousadia, o passado nos ensina que o conforto deve vir acima de tudo. “Quando se fala em conforto, isso vem desde 2010, quando a gente começa a falar de peças esportivas. São nesses momentos que as pessoas tendem a olhar para essas peças mais clean, que são fáceis de combinar”, diz Mariana.

Além de pensar numa explosão de cores, existe a questão de a peça ser única e do trabalho manual. Por isso, houve um aumento no interesse por técnicas como crochê, tricô e tie dye durante os meses dentro de casa. “Isso tem uma relação direta com a pandemia porque, de certa forma, a gente se apertou de todas as maneiras. Então onde você pode ter conforto, é maravilhoso”, reflete Manu, citando malhas, moletons, modelagens esportivas, básicas, casuais e suéter como tecidos bem vistos na moda dopamine dressing.

Muito mais do que uma tendência de moda, o dopamine dressing traz uma mudança na indústria fashion ao trocar a pergunta “Isso está na moda?” por “Isso faz eu me sentir bem?”. E saber responder à questão pode garantir emoções positivas ao longo do dia – o que, convenhamos, é muito melhor do que andar com o pé dolorido por querer seguir os últimos lançamentos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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