Desrespeito à nossa inteligência

20/09/2016 12:00

As últimas notícias envolvendo o ex-presidente Lula são velhas de guerra. O diferente, neste momento, é que o Ministério Público, além da contundência das provas, com o fim da interinidade do presidente Temer, tem agora condições políticas para indiciá-lo. O procurador Deltan Dallagnol o identificou, apropriadamente, como o comandante máximo do esquema de corrupção sistêmica instaurado na Petrobras e em outros órgãos e entidades aparelhados pelo PT desde 2013. Curiosamente, os advogados de Lula alegam que a gravíssima denúncia nada mais é do que um “espetáculo deplorável de verborragia” e “truque de ilusionismo” para excluí-lo do pleito presidencial de 2018, como se ele pudesse resistir a um segundo turno e chegar à presidência.   

Note, caro leitor, que, pela enésima vez, o PT pixa no muro alheio o que lhe diz respeito. Espetáculo deplorável e truque de ilusionismo são especialidades do PT há muito tempo. Afirmam, reiteradamente, com cara de pau nada exemplar, que todo o dinheiro que foi bater nos cofres do PT tinha origem legal. Ou seja, absoluto despropósito, e ainda desrespeito à inteligência do povo brasileiro. Lula e Eduardo Cunha viraram irmãos camaradas. Tem coisa mais cretina do que este último dizer que os recursos estavam registrados num trust no exterior e que ele era apenas o beneficiário? Faltou pouco para Cunha declarar que sua intenção era doar o dinheiro de suas contas no exterior para instituições de caridade. Uma espécie de poupança com fins caritativos…

Mas, esse nível patético da vida pública nacional, dita republicana, vai além. Fatiar o impeachment de Dilma em duas partes não fica nada  a dever às declarações estapafúrdias da defesa de Lula. A ex-presidente, reconhecem, cometeu crime de responsabilidade. Mas, ato contínuo, o senado perpetrou o que poderíamos chamar de crime de irresponsabilidade, livrando-a da punição da perda dos direitos políticos por oito anos. Tudo isso presidido pela leviandade do senhor Lewandowski, que ainda era presidente do STF. Uma edição revisada da constituição de 1988 deveria eliminar seu artigo 52, que virou letra morta. O deplorável espetáculo, este sim, me fez lembrar de uma declaração, muitos anos atrás, do famoso, digno e competente advogado Sobral Pinto, após tomar conhecimento da nomeação de uma certa figura jurídica para o STF. Para ele, o Supremo passou a ser o Mínimo Tribunal Federal. Nesse episódio do desrespeito flagrante ao artigo 52, o Supremo corre, ao decidir, o mesmo risco.

Confúcio dizia que sua primeira providência para colocar um País nos eixos seria reformar a língua, restaurando o verdadeiro significado das palavras. Hora de lembrar aos nossos políticos e a certos magistrados que cara de pau não é sinônimo de cinismo. Cinismo encerra algo de (muito) mais grave. Ou seja, “atitude ou caráter de pessoa que revela descaso pelas convenções sociais e pela moral”. Pior ainda quando isso se dá em relação à própria constituição, que é a lei maior a ser cumprida. Em especial, na atual quadra da vida política, social e econômica do País. Mais que hora de restaurar valores permanentes que, quando esquecidos, levam uma Nação para o buraco. Essa sensação besta de contemplar o abismo pode ser apropriada para montanha russa em parque de diversão, mas não quando os destinos do País estão em jogo. Propor aumento salarial para o teto do funcionalismo público de R$ 33,7 mil para R$ 39,2mil, com seu brutal efeito cascata, num percentual de 16,3% bem acima do concedido ao salário mínimo, é rir na cara da Nação.

A população brasileira já deixou claro nas ruas que está de pavio curto. Não é hora de testar limites. Não obstante, Lula deita falação na sede do PT, retransmitida pela TV Bandeirantes, asseverando de cara limpa: “A perseguição que movem contra mim é pelas coisas boas que fiz”. Fico imaginando a indig-nação dos 12 milhões de desempregados quando ouvem o jararaca dizendo isso. É ou não desrespeito máximo à nossa inteligência, como se ele não tivesse responsabilidade alguma diante do desastre econômico-social e suas vítimas?

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