Eleições: manual de sobrevivência
Nestas eleições difíceis, pessoas têm sido acometidas de eleitorite aguda. Isso pega, dá úlcera e mata amizades. Se puder, estoque comida e não saia até tudo acabar. Mas se quer mesmo participar, cautelas são necessárias. Evite proclamar o seu candidato. Em caso de descuido com esta regra áurea, prepare-se. Cairão sobre você as pragas do Egito. Imbecil, alienado, idiota, coxinha, mortadela, fanático, cego, hipnotizado e burro são os impropérios mais corriqueiros. Ouça e cale, para não acabar num lodaçal de onde ninguém sai de alma limpa. Pois a eleitorite contamina, o sangue sobe e, como em fechadas no trânsito, você pode querer revidar. Daí, vem uma selvageria que você nem sabia ter e que te põe em crise de identidade. Porque lordes viram lobos. Não revide. Mas se vier forte o desaforo, use tampões de ouvido. Reforçados. Melhor não escutar mais. O propósito das falas nesse tipo de eleição maluca não tem sido convencer, argumentar ou coisa assim civilizada, mas esmagar o outro com lixo verbal.
Se estiver sem tampões, e quiser sobreviver com o coração em paz, tente não levar a mal os impropérios. Não tome como coisa pessoal. Trate como um bom balconista que recebe cliente já de paciência estourada com maus tratos de outros balcões. A raiva que ele acumulou é contra o Temer ou a Dilma, vai saber, mas que azar, em você é que ela vai transbordar. Então, capa e guarda-chuva, para não se afogar na raiva alheia. Não leve a mal.
Em redes sociais, oh céus, cuidado! Há os que estarão em missão de esmagar as mazelas brasileiras pisando em você. O mero comentário inocentemente postado vira um portal dos infernos. Vem a resposta irada e debochada. Você tenta apaziguar, mas então vem o insulto. Você pede: calma aí que eu não sou desses, mas não adianta, teu comentário te meteu na linha de tiro. Será perseguido até o final dos tempos porque ousou dizer: que sim, o candidato “Z” tem sido preconceituoso, ou que sim, o candidato “J” é réu por corrupção, ou que sim, tenho dúvidas sobre o candidato “W”. Pode ser tudo verdade no teu comentário, mas se puder, não o faça. Dá em batalha eterna, sem vencedor. A não ser que você se faça de morto e deixe o outro atirando sozinho. Já fiz muito isso, “faleci” em plena troca de chumbo. Ficou mais barato emocionalmente.
Em eventos familiares, não seja sensível demais quando vier climão ao saberem que você vota em “X” quando “Y” é o favorito dos outros. Seja um bom alvo e resista à saraivada. Se não aguentar, fuja para baixo da mesa até a festa acabar. Mas não guarde mágoas e rancores. Eleitorite faz de adultos, adolescentes revoltados, gatilhos mais rápidos do oeste, donos da verdade e gênios da política. Suporte os Aristóteles de botequim, os Sócrates de churrasco, os Marx de barbearia. Paciência. Com eles, com todos, com você mesmo.
Reserve tentativas de debater voto apenas para os que você sabe que não estão contaminados de eleitorite, e não se tornarão inimigos só porque pensam diferente. Mas até para os “inimigos”, guarde tolerância. Eles não estão lembrando, mas no dia seguinte à eleição, quando der problema na rua, encrenca no trabalho, missão a cumprir na igreja, trabalho difícil na faculdade, ou goteira em plena tempestade no teto da casa, vocês vão ter que contar mesmo é um com o outro. Se ele não sabe disso, saiba você. Essa eleição é séria e difícil, mas não precisa ser um apocalipse. Sobreviva!
denilsoncdearaujo.blogspot.com