Empresários se manifestam contra apoio do Brasil à investigação de Israel por genocídio

18/jan 22:11
Por Jéssica Petrovna / Estadão

Empresários, executivos, pesquisadores e artistas assinaram um abaixo-assinado pedindo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que retire o apoio à ação da África do Sul contra Israel por genocídio. O manifesto direcionado ao petista afirma que a acusação é infundada e cobra a adoção de uma posição justa e equilibrada por parte do governo brasileiro.

No final da tarde desta quinta-feira, 18, a página da petição online mostrava mais de 17 mil assinaturas. A lista inclui nomes de relevo como Luiza Helena Trajano, presidente do conselho de administrac¸a~o do Magazine Luiza. Procurada pelo Estadão, ela confirmou o endosso por meio da assessoria.

Trajano está entre as 119 personalidades que apoiaram o manifesto. Também assinam a ex-ministra do Supremo Tribunal Federal Ellen Gracie, o empresário e economista Roberto Giannetti da Fonseca, o presidente da Suzano, Walter Schalka, o CEO de O Boticário, Artur Grynbaum, o presidente do conselho do Hospital Albert Einstein, Claudio Lottenberg, o presidente do Google Brasil, Fabio Coelho, o cientista político Christian Lohbauer, atriz Bruna Lombardi e a microbiologista Natália Pasternak.

O texto reconhece a complexidade do conflito e o sofrimento da população em Gaza, mas destaca que genocídio, por definição, implica na intenção de exterminar um povo e que esse não é o objetivo de Tel-Aviv. Argumenta que a guerra foi desencadeada pelo ataque terrorista do Hamas que, por outro lado, prega a destruição do Estado de Israel, usa civis como escudos humanos e mantém inocentes como reféns.

“É imperativo avaliar todos os aspectos antes de endossar tal iniciativa, principalmente quando se trata da séria acusação de genocídio”, diz o manifesto. “Instamos, portanto, uma reconsideração desse apoio (grifo original) e a adoção de uma abordagem justa e equilibrada. Enquanto buscamos aliviar o sofrimento em Gaza, é crucial pressionar não apenas Israel, mas especialmente o Hamas, para que cesse o uso de escudos humanos e liberte os reféns”, acrescenta.

O empresário Charles Putz, autor do manifesto, contou que ideia surgiu a partir de um grupo com empresários no Whats App. “Em essência, o que nós estamos dizendo é que buscamos uma abordagem mais justa e equilibrada. O governo brasileiro cobra Israel, mas não cobra o Hamas”, disse.

Segundo o relato do empresário, o texto foi apresentado diretamente para executivos e figuras públicas. Só no dia seguinte, o abaixo-assinado foi aberto para o público geral. Ainda de acordo com Charles Putz, o manifesto foi encaminhado à Presidência da República, que confirmou o recebimento, mas não deu retorno.

Decisão divergente da tradição diplomática

O respaldo à alegação de genocídio foi considerado divergente da tradição do Itamaraty no conflito árabe-israelense e rendeu duras críticas ao governo Lula. Para citar uma delas, o ex-ministro de Relações Exteriores e professor emérito de Direito da USP Celso Lafer escreveu uma carta endereçada ao chanceler Mauro Vieira em que apontava a decisão como incoerente com a diplomacia brasileira.

Em entrevista ao Estadão, ele explicou que considera leviano acusar Israel de cometer genocídio e alertou que o endosso à ação pode comprometer a imagem do Brasil lá fora.

“O lugar do Brasil no mundo, o tema de sua credibilidade, sobretudo no trato dos grandes temas internacionais, pressupõe coerência e isto passa pela consistência com a qual você se vale do direito nas suas decisões. Você se vale das normas, mas não instrumentaliza a norma”, disse. “Essa decisão compromete a credibilidade internacional do Brasil em muitas instâncias. E complica a presença do Brasil no mundo. É um entre outros equívocos da diplomacia do governo Lula”, completou.

O governo, por outro lado, disse que condenou os ataques terroristas do Hamas, mas que isso não justifica o que chamou de uso indiscriminado, recorrente e desproporcional da força contra civis. “À luz das flagrantes violações ao direito internacional humanitário, o presidente manifestou seu apoio à iniciativa da África do Sul de acionar a Corte Internacional de Justiça para que determine que Israel cesse imediatamente todos os atos e medidas que possam constituir genocídio”, dizia a nota que confirmou o apoio.

Acusação por genocídio

A acusação toca em um ponto extremamente sensível para Israel. Isso porque o termo genocídio foi cunhado pela primeira para descrever o Holocausto – trauma que está na raiz do apoio internacional à criação do próprio Estado israelense. O caso foi levado à Corte Internacional de Justiça, em Haia, e as primeiras audiências foram realizadas na semana passada.

A África do Sul argumentou que as declarações de autoridades israelenses comprovariam a intenção necessária para determinar o crime de genocídio. Como exemplo, foi apontado o ministro da Defesa, Yoav Gallant, que chamou os palestinos de “animais humanos” ao anunciar o corte de todos os serviços básicos (água, gás, comida e eletricidade) na Faixa de Gaza após o ataque terrorista do Hamas.

“Essas declarações genocidas não são feitas para interpretações ou racionalizações. São feitas por funcionários do Estado e falam de uma política. Se não fossem pretendidos, não teriam sido feitos”, disse o time de Pretória ao expor o seu caso no diante dos juízes.

Israel, por sua vez, nega categoricamente. Sua defesa lembra que a ofensiva sobre a Faixa de Gaza foi uma resposta ao ataque terrorista e evoca que o país tem o direito de se defender. Ainda de acordo com Tel-Aviv, o número de civis mortos no conflito é resultado do uso de palestinos como escudos humanos pelo Hamas, não da suposta intenção genocida. “O componente-chave do genocídio, a intenção de destruir um povo no todo ou em parte, está ausente”, rebateram os representantes israelenses na Corte Internacional de Justiça.

A guerra foi desencadeada pelo ataque sem precedentes de terroristas do Hamas contra Israel em 7 de outubro, quando 1.200 pessoas foram mortas e mais 240 levadas como reféns. Do lado palestino, 85% da população se viu obrigada a sair de casa e passou a viver em abrigos improvisados onde o risco de fome e doenças agrava o drama humanitário. O número de mortos passa de 24 mil, segundo o ministério da saúde de Gaza, controlado pelo Hamas.

O cenário de devastação no enclave aumentou a pressão internacional sobre Israel. Até mesmo os Estados Unidos, seu principal aliado, cobraram ações para proteger os civis em Gaza. Tel-Aviv, no entanto, tem dito que manterá os combates até o fim do Hamas. “Ninguém nos impedirá – nem Haia, nem o eixo do mal e nem mais ninguém”, disse o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, em uma referência ao Irã e aos grupos que Teerã financia (Houthis, no Iêmen, e Hezbollah, no Líbano).

LEIA O MANIFESTO NA ÍNTEGRA

Nós, cidadãos preocupados, expressamos nosso descontentamento com a decisão do governo brasileiro de apoiar a ação da África do Sul contra Israel na Corte Internacional de Justiça. Compreendemos a complexidade da situação em Gaza e o sofrimento da população local. No entanto, é imperativo avaliar todos os aspectos antes de endossar tal iniciativa, principalmente quando se trata da séria acusação de genocídio.

Genocídio, por definição, implica a intenção de exterminar pessoas com base em nacionalidade, raça, religião ou etnia. Não acreditamos que seja sua visão ou a percepção geral dos brasileiros que Israel tenha tal objetivo. Pelo contrário, reconhecemos que o conflito teve início com um ataque terrorista do Hamas, que declaradamente busca a eliminação de Israel e de seu povo.

O Hamas utiliza civis como escudos humanos e mantém reféns inocentes, o que contribui significativamente para a complexidade e gravidade da situação em Gaza. Ao apoiar o pedido da África do Sul, o Brasil pode inadvertidamente reforçar uma visão distorcida dos eventos, simplificando uma realidade complexa.

Instamos, portanto, uma reconsideração desse apoio e a adoção de uma abordagem justa e equilibrada. Enquanto buscamos aliviar o sofrimento em Gaza, é crucial pressionar não apenas Israel, mas especialmente o Hamas, para que cesse o uso de escudos humanos e liberte os reféns. A responsabilidade pela situação deve ser atribuída a todas as partes envolvidas, sem acusações infundadas, como a de genocídio praticado por Israel.

Apelamos por uma atitude que promova a verdade, a justiça e um ambiente propício para negociações de paz duradouras.

Brasil, 15 de janeiro de 2024

Charles Laganá Putz (empresário)

Betânia Tanure

Bruna Lombardi (atriz)

Claudia Sender Ramirez

Ellen Gracie (ex-ministra do STF)

Emilia Buarque

Luiza Helena Trajano (presidente do conselho de administrac¸a~o do Magazine Luiza)

Natalia Pasternak (microbiologista e divulgadora científica)

Patricia Rieper Leandrini Villela Marino

Sonia Hess

Marco Antonio Suplicy

Cecilia Dale

Marcello Brito

Malvina Muszkat

Bernardo Parnes

Maria Elena Cardoso Figueira

Christian Lohbauer

Susana Muszkat

Leonardo Viegas

Tania Casado

Ingrid Frare

Artur Grynbaum (CEO de O Boticário)

Monica Rosenberg

Carlos Alberto Júlio

Fabio Coelho (presidente do Google Brasil)

Rubens Panelli Junior

André Magalhães Pinto

Marco Antônio Tofanelli

José Jacobson Neto

Claudio Raupp

Mario Anseloni

Cassiano Scarambone

Oscar Vaz Clarke

Milton Longobardi

Roberto Oliveira Lima

Rômulo de Mello Dias

Sergio de Nadai

Paulo Fagundes de Lima

João Olyntho

Roger Ingold

Pedro Pace

Marcos Gouvêa de Souza

Roberto Giannetti da Fonseca (empresário e economista)

Paulo Kakinoff

Armando Henriques

Humberto Pandolpho

Antonio Rios

Carlos Foz

Handerson Castro

Milton Isidro

Sidney Klajner

Cesar Alberto Ferreira

Helio Ribeiro Duarte

Abramo Douek

Manoel Conde

Leon Tondowski

Georges Schnyder

Fernando Terni

Wilson Roberto Levorato

Gil Morgensztern

Walter Schalka (presidente da Suzano)

Paulo Meirelles

Piero Minarde

Rodrigo Abreu

Patrice Etlin

Alex Szapiro

Juarez José Zortéa

Sergio Cipovicci

João Rodarte

Israel Aron Zylberman

Valmir Pedro Rossi

João Pedro Paro Neto

Marcos Knobel

Alexandre Senra

Jorge Cavalcanti de Petribu

Guilherme de Noronha Dale

Claudio Lottenberg (presidente do conselho do Hospital Albert Einstein)

Norberto Birman

Angelo Augusto de Campos Neto

Alexandre Foschine

Avi Gelberg

Raul Doria

Roberto Klabin

Sergio Degese

Rui Aquino

Ricardo Bloj

Thomas Brüll

Renato Velloso

Francisco Carlos Mazon

Claudio Carvalho

Helio Rotenberg

Wilson Ferreira Jr

Sergio Zimerman

Dirley Pingnatti Ricci

Antonio Rubens Silvino

Milton Steagall

Armando Aguinaga Lowndes de Souza Pinto

Robert Wong

João Alceu Amoroso Lima

Welder Motta Peçanha

Fernando Biancardi Cirne

Refuah Shlêma

Kol Hakavod

Jean Grinfeld

Thais Blucher

Luiz Paulo Grinberg

Luiz Paulo de Azevedo Barbosa

Angelo Tadeu Derenze

Filinto Moraes

Marcelo Fernandes

Fatima Zorzato

Daniel Méndez

General Francisco Carlos Modesto

Moises Cohen

Gilson Finkel

Renato Veloso

Dorival Dourado

Marcelo Araujo

Fábio Colletti Barbosa

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