‘Evita Open Air’ promove experiência inédita fora do teatro

05/07/2022 08:00
Por Ubiratan Brasil / Estadão

O vento balança o figurino da atriz, que incorpora o movimento à ação; um helicóptero sobrevoa o palco no momento do canto, obrigando o ator a encorpar a voz; uma leve sensação de frio é sentida pela plateia, já devidamente agasalhada – fatores externos que jamais marcariam a apresentação de uma peça em um teatro fechado serão constantes ao longo da temporada de Evita Open Air, musical que estreia na quinta, 7, em um espaço ao ar livre especialmente montado no Parque Villa-Lobos.

Com 8.500 m², a estrutura abriga uma acomodação capaz de receber até 1.600 espectadores por sessão, um palco que tem quase quatro vezes o tamanho de um espaço convencional, e uma área de alimentação com comidas e bebidas diversas, especialmente da culinária argentina. “Quando fizemos a primeira sessão para convidados, levei um susto ao ver a plateia praticamente vazia, minutos antes do início do espetáculo – na verdade, as pessoas estavam na área de lazer”, diverte-se o canadense John Stefaniuk, responsável pela direção criativa do musical.

Seu desafio foi grande, pois há pouca referência desse tipo de montagem no mundo – a mais próxima também foi de Evita e aconteceu em 2019, no Regent’s Park, em Londres. “Busquei criar algo mais contemporâneo e intimista, apesar do grande espaço”, conta ele, que trabalhou com um cenário com quatro níveis de altura, permitindo maior movimentação dos atores. Isso se reflete em uma apurada ocupação do espaço, com o elenco apresentando a elegante coreografia criada por Floriano Nogueira, sábia ao não deixar espaços desocupados.

CLÁSSICO

Com produção do Atelier de Cultura, Evita Open Air traz a nova versão da ópera-rock de Tim Rice e Andrew Lloyd Webber, que estreou em Londres em 1978 e logo se tornou um clássico. A montagem ao ar livre utiliza novos arranjos musicais compostos por David Cullen e Lloyd Webber, em 2014. “Isso deixou a peça mais ágil e realista sobre uma figura tão atual”, observa Stefaniuk.

De fato, a trajetória de Maria Eva Duarte Perón (1919-1952) foi curta, mas fulminante: de atriz de radionovela, ela se tornou líder política e primeira-dama da Argentina, tecendo para si mesmo uma crisálida de beleza, que a transformou na rainha do povo. Para os ricos e poderosos, aquela morena de baixa estatura não passava de uma atriz de segunda linha, dentuça e alpinista social; para os pobres e descamisados, porém, a mulher, agora loira, era uma verdadeira diva por saber tocar os sentimentos mais doloridos das pessoas.

Santa ou oportunista, o fato é que Evita se tornou um mito. “Uma mulher carismática, que pede uma atriz à altura – e aqui temos Mira Ruiz”, derrete-se o diretor. De fato, uma das principais intérpretes do musical brasileiro, Mira domina as três qualidades pedidas pelo papel: dança, canto e interpretação. De quebra, uma boa dosagem da emoção. “Sem querer julgá-la, busco humanizar Evita, uma mulher que lutou por seus desejos, o que a torna ainda mais atual”, conta.

ESTRATÉGIA

A ascensão de Evita é apoiada por Juan Domingos Perón, que soube utilizar esse romance como estratégia política meio a desconfiança dos ricos e dos militares. Isso o transforma em um antagonista na peça? “Não acredito, pois Evita ajudou Perón a revelar suas imperfeições, o que humaniza o personagem”, acredita Cleto Baccic, intérprete do político. “Antes de conhecê-la, Perón já lidava com o poder – Evita lhe trouxe ainda mais combustível na presidência.”

O trio de protagonistas se completa com a figura do guerrilheiro Che Guevara, que tem o relevante papel de narrador da história, acompanhando a distância todo o desenrolar da trajetória de Evita até se tornar a senhora Perón. “Busco entender a ideologia do personagem, que é um contestador na trama, para encontrar o caminho da interpretação”, conta Fernando Marianno.

Ele se movimenta tanto no palco como na plateia, direcionando a atenção do público, o que lhe permite experiências inéditas. “Depois de um ensaio, notei que estava com as calças molhadas: era a umidade do sereno que tomou conta do palco”, relembra. Baccic também coleciona histórias. “Sons de aviões e helicópteros, além dos pássaros do parque entram como uma inesperada trilha sonora”, diz. Mas há também espaço para a poesia: “É emocionante levantar os olhos e ver o por do sol atrás da plateia na sessão da tarde, ou o céu estrelado, na da noite”.

Evita Open Air.

Pqe. Villa-Lobos (portão Cândido Portinari). 5ª e 6ª, 20h. Sáb. e Dom., 15h e 19h30. R$ 50 / R$ 300.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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