Extração bilionária de manganês ilegal leva a ‘jogo de empurra’ entre responsáveis

16/05/2022 21:01
Por André Borges / Estadão

As imagens de centenas de caminhões e maquinário pesado agindo ilegalmente dentro de uma área de concessão mineral da Vale – áreas que a empresa nunca explorou – para retirar milhares de toneladas de manganês, trouxeram um questionamento adicional à tona: quem é, afinal de contas, o responsável por evitar o crime de proporções industriais como esse?

O Estadão ouviu representantes municipais, estaduais e federais ligados ao tema, além da própria Vale. Nem a empresa, nem o poder público e nem os órgãos envolvidos assumem o ônus pela atividade industrial e criminosa, e se eximem de responsabilidade de combater as ações ilegais e dar fim ao dano ambiental e à evasão de dividas.

A rigor, o subsolo mineral é um bem da União, mas que, dada a complexidade de acesso e fiscalização de outros órgãos e esferas públicas, o controle deste deveria envolver uma série de gestores, cada qual responsável pela execução de seu dever na proteção do solo.

A prefeitura de Marabá (PA), onde se concentra boa parte da extração clandestina, foi questionada sobre as atividades ilegais que, há anos, dominam seu território minerário. Por meio de nota, a prefeitura, sob gestão do prefeito Tião Miranda (PSD), limitou-se a declarar que “a exploração mineral e a sua fiscalização cabe necessariamente aos órgãos de fiscalização Estadual e Federal, já que o subsolo de todo o território brasileiro se enquadra sob jurisdição dos entes acima descritos”.

O governo do Pará declarou, por meio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) do Estado, que “o minério, ou qualquer outro recurso mineral encontrado no subsolo é um bem da União, portanto, a responsabilidade sobre a fiscalização da atividade ilegal de exploração do manganês é da União”.

A partir deste posicionamento, o governo de Helder Barbalho afirmou que “cabe, prioritariamente aos órgãos federais fiscalizar a extração ilegal do minério, não isentando o papel fiscalização ambiental comum a todos os entes federados”, conforme prevê Lei Complementar 140/2011, que disciplina a competência sobre questões ambientais entre os entes federativos, fixando normas para União, Estados, Distrito Federal e municípios.

A mineradora Vale, que detém os direitos minerários da região, procurou justificar que não é dona da terra, mas sim de títulos que lhe garantem a exploração mineral, embora a empresa detenha esses direitos há mais de 20 anos e nunca os tenha exercido, ou seja, ficou apenas com os papéis nas mãos, mas nunca fez nada na região. Hoje, com a área tomada pela extração ilegal, pretende vender esses direitos a outras empresas e, assim, escapar do imenso passivo ambiental que estas passaram a acumular.

Ao comentar as responsabilidades sobre as áreas, a Vale declarou à reportagem que “não é proprietária dessa área e sequer tem acesso ao local ou legitimidade para retirar eventuais invasores”. Por essa razão, a empresa justificou que “promoveu denúncias junto aos órgãos competentes, municiando-os das informações de que dispunha a fim de contribuir para a apuração e fechamento das atividades clandestinas”.

Já Agência Nacional de Mineração (ANM), órgão ligado ao Ministério de Minas e Energia responsável por conceder os títulos minerários e fiscalizar essas concessões, procurou se esquivar de sua responsabilização direta e declarou que “comunicou aos órgãos policiais e ao Ministério Público Federal sobre o fato”.

“Cabe, portanto, às forças policiais a realização de operações nesse sentido, o que tem ocorrido”, declarou a agência. Perguntada sobre os danos ambientais que se espalham por toda a região, a ANM afirmou que não tem nada a ver com isso. “Todas as questões atinentes à responsabilidade ambiental são de competência dos órgãos estaduais e municipais de meio ambiente”, declarou.

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