Falta alguém em Nuremberg

04/10/2018 12:00

Sou avesso à torturas, mas peço licença aos que perderam seus entes no movimento de ´64 e os que ainda sofrem com lembranças (entre os quais alguns amigos que nunca se toca no assunto), se a vida será sempre uma via de mão dupla onde não se pode olhar somente para um lado, evitando  acidentes circunstanciais. E do mesmo modo não se pode omitir ou fantasiar a verdade para não fugir da responsabilidade primordial consigo mesmo. A História se faz com a verdade, por mais dura que seja, não mascarada como foi desde os primórdios da civilização, desde Pedro II – o injustiçado.

Tinha conhecimento do fato mas nunca me aprofundei pelo muito que se falou durante todos esses anos. Permaneci na ignorância sobre torturas talvez, pelo ranço que trago da era Vargas, inclusive de assassinatos – o que todos querem ignorar. Assim, procurei e achei para clarear minha mente. E lá está reproduzido um dos mais repugnante e hediondo crime, por uma sórdida vingança – não com o verdadeiro culpado, José  Genoino, mas com um simples coadjuvante – inocente por inexperiente erro de um jovem, por ter ensinado aos militares, o acampamento dos rebeldes do Araguaia.

O depoimento é do coronel Lício Maciel na Câmara de Deputados, perante a Comissão Especial de Anistia – Audiência Pública de 2008, cujo texto reproduzo somente a pequena parte mais relevante:

“Genoino, toda a Xambioá sabe disso, do pobre coitado do Antônio Pereira, pai do João Pereira, e vocês nunca tiveram a coragem de pedir perdão, nem uma desculpa por terem esquartejado o rapaz! Cortaram primeiro uma orelha, na frente da família, no pátio da casa; cortaram a segunda orelha –  o rapaz urrava de dor; a mãe desmaiou. Cortaram os dedos, as mãos, e no final deram a facada que matou João Pereira, de 17 anos (em 29.6.72, justiçado exemplarmente pelo PC do B, conforme relato de Angelo  Arroyo). Foi o crime mais hediondo de que eu soube; nem na Guerra da Coreia, nem na do Vietnã fizeram isso. Algo parecido só encontrei quando trucidaram o Tenente Alberto Mendes Júnior que havia se apresentado voluntariamente para substituir dois companheiros feridos. A turma do Lamarca pegou o rapaz, trucidou-o, castrou-o e o obrigou a engolir os órgãos genitais. O crime contra o João Pereira foi muito mais grave, muito mais horrendo. Revelou que só foi possível acabar com a guerrilha devido à traição de militantes, principalmente a de José Genoino”.

Um fato que nunca poderá ser esquecido nem desprezado, apesar de a Comissão de Anistia ignorá-lo para usar somente a mão única, mas a verdade sempre tem que aparecer ou este não seria seu nome – verdade! 

jrobertogullino@gmail.com

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