Falta de acessibilidade ainda é pouco discutida entre o poder público; Petrópolis ainda não abraçou a causa

04/11/2022 08:30
Por Helen Salgado

A falta de acessibilidade nas ruas de Petrópolis permanece sendo uma pauta importante, mas pouco discutida entre o poder público.

A inclusão dos deficientes físicos é fundamental para que os seus direitos de ir e vir sejam assegurados. No entanto, nem sempre isso acontece devido à falta de acessibilidade nos prédios e nas ruas da cidade.

Para Michele Wayand, que possui paralisia cerebral e faz uso da cadeira de rodas, nem sempre é fácil circular pela cidade. Ela conta que pelo Centro Histórico há lugares em que é possível percorrer, mas em outros locais, mais distantes, como nos distritos, é impossível.

Michele faz fisioterapia em uma clínica localizada em um prédio na Avenida Tiradentes, no Centro. Na ocasião, alguém precisa carregá-la para subir as escadas, já que o edifício não possui acessibilidade.

Natália Kochem é graduada em Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Mestranda em Urbanismo no programa de Pós-graduação em Urbanismo da UFRJ, o PROURB. Ela afirma que, para melhorar a acessibilidade nas ruas de Petrópolis, é necessário que o poder público e a sociedade encarem a questão como uma obrigação. “A Lei Brasileira de Inclusão torna obrigatório o acesso das pessoas com deficiência e mobilidade reduzida”, lembra.

Embora seja obrigatório, a acessibilidade ainda não acontece da forma que deveria. Natália diz que isso ocorre por conta de alguns profissionais não terem domínio no assunto e pela sociedade, que constrói e segue construindo sem responsabilidade técnica – um item obrigatório. A profissional afirma que quase 70% das construções no Brasil são ilegais, são autoconstruções que não possuem um responsável técnico assessorando a obra.

A Norma de acessibilidade – NBR 9050/20 trata sobre a acessibilidade, essas são as mais importantes no âmbito da construção civil. Embora existam e precisem ser seguidas, no município nenhuma delas é, de fato, respeitada. “Isso em Petrópolis é evidente, não só no tecido urbano. A pouca ocorrência de calçada que temos na cidade também tem irregularidades, na sua inclinação, na sua manutenção, tem buracos e são quebradas. Isso prende uma roda, a pessoa na cadeira de rodas pode até cair, se machucar, se acidentar por achar que tem espaço para passar, mas não vai conseguir por conta de um bueiro, de um ralo no meio do caminho. É muito grave”, afirma.

Natália é mãe do Arthur, que possui paralisia cerebral e epilepsia. A cadeira de rodas é o principal meio de locomoção do pequeno. A mãe sofre na pele a dificuldade de se locomover na cidade com o filho. Ela lembra que foi procurar um prédio para morar com Arthur e diz que foi impossível encontrar um local na cidade com acessibilidade.

“Todos os prédios que eu visitava, apesar de possuírem elevador, tinha uma grande escadaria para acessá-lo. Essa é a realidade que a gente tem. E não só prédios históricos, eles são um caso. Inclusive, eles podem ter, sim, garantia de acessibilidade por meio de inúmeros de planejamentos e estruturas – que um especialista é o mais indicado para poder projetar e propor aos órgãos competentes”, afirma.

A arquiteta, que também faz parte da comissão temporária de acessibilidade do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU/RJ) como conselheira convidada, diz que é possível propor aos órgãos competentes, o Iphan e o Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac), um plano de acessibilidade. “Dependendo de onde esse bem histórico é tombado, quando o plano é coerente, nada os órgãos têm a opor”, diz. Nesses casos, Natália explica que é avaliada a qualidade do planejamento.

Em resposta à Tribuna, o Iphan informou que as intervenções em bens tombados que são exigidas por lei, seja para acessibilidade, seja para segurança dos prédios e das pessoas (em caso de incêndio ou outras situações, por exemplo), podem ser feitas, desde que os projetos sejam apresentados e analisados pelo Iphan. Sobre isso, o Instituto vai procurar meios para minimizar o impacto da intervenção, sem prejudicar a acessibilidade e segurança do imóvel.

Além dos prédios históricos, as lojas, as ruas, os prédios comerciais e residenciais não são acessíveis – fato limitante aos deficientes. Muita das vezes, para cumprir com a obrigação da acessibilidade, os locais colocam apenas um quadrado acessível, o que inviabiliza que esse público escolha por onde quer percorrer. A arquiteta define a situação como cruel.

A falta de acessibilidade é a exclusão daqueles que possuem dificuldade de se locomover – o que torna ainda mais intenso o preconceito com os deficientes. Natália, como mãe, afirma que isso precisa ser combatido para que seja possível ter uma sociedade mais coerente, inclusiva e gentil.

Para ela, o fato de Arthur estar no meio de crianças faz com que elas aprendam, desde cedo, que nem todas possuem as mesmas habilidades; apesar disso, todas elas possuem os mesmos direitos, podem ser amigas e se entenderem.

“Esse é um ganho para a sociedade. A sociedade precisa aprender muito mais sobre compreensão, tolerância, como que o outro é. Isso é algo que é construído socialmente. Se a sociedade não permite que a gente chegue lá, porque a arquitetura não permite, porque a escola não é acessível, porque calçada em torno da escola não deixa, é impossível. A acessibilidade arquitetônica é uma das coisas que a gente precisa garantir e o combate ao preconceito é outra questão que a gente precisa muito combater”, afirma.  

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