Filme ’45 do Segundo Tempo’ revive o passado com afeto
Se a vida humana pudesse ser comparada a uma partida de futebol, a do trio de protagonistas estaria (quase) no fim, 45 do Segundo Tempo. Lembrem-se de que nenhuma partida está ganha e sempre pode haver prorrogação, pênaltis. Luiz Villaça já havia dirigido Tony Ramos na série de TV A Mulher do Prefeito. A mulher dele na ficção já era a dele na realidade, Denise Fraga.
O filme 45 do Segundo Tempo é predominantemente masculino. O trio é interpretado por Tony, Cássio Gabus Mendes e Ary França. Embora pontuais, as mulheres têm participações decisivas. Villaça furta-se a falar sobre Denise. Pede a Tony que o faça. “Foi um dos encontros mais felizes da minha vida profissional. Amo esses dois.” Sobre Louise Cardoso, é Villa quem fala. “O cinema ama essa mulher. Louise deveria fazer mais filmes.”
CRISE
45 do Segundo Tempo estreia nesta quinta, 18. Três amigos de infância e juventude, chegados à idade madura, atravessam momentos de crise. Tony tem uma cantina italiana no Bexiga que talvez tenha de fechar. Tenta um empréstimo no banco, mas não consegue. Cássio, aparentemente o mais bem-sucedido do trio, está vendo seu casamento desmoronar. A mulher, o filho gay – ele terá de aprender a ser respeitoso com o mundo, os outros, e tolerante com ele mesmo. Ary virou padre, mas atravessa uma crise espiritual. O desejo o consome, não pode ver rabo de saia. O trio embarca numa viagem à cidadezinha em que nasceram. 45 é um road movie.
É também uma homenagem de Villaça à grande comédia italiana. Impossível não pensar em Mario Monicelli (Meus Caros Amigos), em Dino Risi (Os Monstros). “Você foi diretamente ao ponto”, diz o diretor e roteirista. “Desde criança, fui nutrido por aquelas comédias. Federico Fellini, Os Boas Vidas, Ettore Scola. Não diria que eram dramas cômicos, mas comédias dramáticas. A vida como ela é, com suas alegrias, tristezas e dificuldades, mas a necessidade humana de afeto, de diversão, não mudou.” Cássio e Ary concordam. “Adoro o cinema do Luiz (Villaça). Essas pequenas histórias, as pessoas comuns com as quais podemos nos identificar. É um cinema humanista, e mais do que nunca estamos necessitados disso.” Ary: “O Villa filma como vive. Somos um grupo de amigos que se reúne em torno de uma mesa para se analisar, e analisar o mundo”.
Os amigos parecem adultos que se recusam a amadurecer. “O reencontro traz de volta a molecagem”, reflete Tony. O cinema simples, humano, com pitadas sociais, de Villaça adquire sua dimensão política. “Falar de afeto nessa época marcada por discursos de ódio é uma atitude política.” Nesse dia em que o repórter do Estadão conversa com o diretor e elenco de 45 do Segundo Tempo está começando a propaganda política. Os quatro estão de acordo. “Sem democracia não há solução.” Tony evoca sir Winston Churchill: “Ele dizia que, por mais defeitos que possa ter, a democracia é sempre melhor do que as outras alternativas”.
PARCERIA
O filme começou a nascer de um desejo. Villaça gostou tanto da parceria com Tony em A Mulher do Prefeito que iniciou a escrita de 45 do Segundo Tempo com ele em mente para fazer o Pedro. Enviou-lhe o roteiro. “Comecei a ler e, na página 12, deu o clique. Já estava ligado.” Essa página 12 do roteiro corresponde a que no filme? “É uma forma de dizer. Se não for fisgado na página 10, na 15, até a 20, é porque não deu liga.”
Uma das melhores cenas é sobre o tempo. Os caros amigos voltam à pequena cidade. Crianças, galgaram a caixa d’água, na praça central. Que grande aventura! Adultos, a torre e a vista parecem insignificantes. “Uma m…”, como diz Cássio. O tempo passa, ressignifica as coisas. Talvez seja a cena favorita do próprio Villa. “É um filme para ver no cinema. Tem gente que se acostumou ao streaming nessa fase de pandemia, mas 45 do Segundo Tempo ficará muito melhor na tela grande do cinema”, finaliza Tony.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.