Governo tenta convencer TSE a adotar sugestões de militares sobre urnas
O governo Jair Bolsonaro deflagrou uma operação de bastidores para tentar convencer o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a adotar propostas das Forças Armadas sobre a segurança das urnas eletrônicas ainda nas eleições de outubro. Com o diálogo bloqueado entre o Ministério da Defesa e a atual presidência da Corte, ministros da ala política do Palácio do Planalto buscaram contato direto com o Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente com Alexandre de Moraes, que comandará a Justiça Eleitoral durante a eleição.
O acordo é visto no governo como uma saída para evitar que reações de bolsonaristas descontentes fujam do controle no 7 de Setembro ou caso Bolsonaro perca a eleição. A busca de entendimento começou há poucos dias e inclui conversas com Moraes e outros ministros do STF. Os emissários do governo são os ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), Fabio Faria (Comunicações) e Bruno Bianco (Advocacia-Geral da União).
O ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, acompanha as tratativas. Antes, a abordagem do governo era liderada por ele, pelo Ministério da Justiça e pela Controladoria-Geral da União (CGU). Após declarações divergentes, Paulo Sérgio e o atual presidente do TSE, ministro Edson Fachin, pararam de se falar.
Moraes assume a presidência do TSE em 16 de agosto. Os governistas não têm esperança de acordo antes da troca, mas acham possível construir a saída para o impasse até o fim de agosto. Embora os dois ministros estejam alinhados na defesa das urnas, Moraes tem perfil político e trânsito com militares. Sob Fachin, o TSE já disse que as propostas da Defesa seriam consideradas apenas para eleições futuras.
Quem conversou com Moraes disse que ele demonstrou abertura e disposição para “evitar confusão” enquanto estiver na presidência do TSE. Um ministro de Estado que participa das conversas disse ao Estadão que há abertura da parte de Moraes e que “tudo vai estar resolvido” antes do 7 de Setembro. Procurado, ele não se manifestou.
Para ministros palacianos, caso as propostas das Forças Armadas fossem implementadas, os militares dariam aval à confiabilidade e transparência do sistema eletrônico de votação. Com isso, Bolsonaro poderia baixar o tom e encerraria a escalada contra as urnas, que promove de forma recorrente, mesmo sem prova de fraude e à revelia do Centrão.
Auxiliares do presidente dizem que bastaria um breve recado dele pelo WhatsApp para bolsonaristas promoverem distúrbios como os vistos nos Estados Unidos na ocasião da derrota de Donald Trump. Na avaliação deles, o cenário é de consequências imprevisíveis.
A cruzada para minar a confiança nas urnas eletrônicas, com indicativo de contestação do resultado, levou a uma reação da sociedade civil sem precedentes. Um manifesto em defesa da democracia ultrapassou 100 mil assinaturas. A adesão pressionou o Planalto a procurar um acordo.
Depois de enviarem 88 questionamentos e 15 sugestões de mudança ao TSE, os militares se concentraram em três pontos. Eles exigem testes públicos de segurança com o novo modelo de urna, a UE2020. No teste, a máquina é submetida a tentativas de invasão, para verificar a higidez. As eleições vão usar 225 mil urnas desse modelo, o que equivale a 39% das 577 mil. Somente as antigas passaram pelo teste. O TSE diz, porém, que o novo tipo é mais moderno e seguro.
Os militares cobram incentivo às auditorias por partidos políticos. Apenas três siglas, no entanto, se registraram para fiscalizar a votação: o PL, por insistência de Bolsonaro, o PV e o PMN. Por falta de habilitação técnica, o PL desistiu de contratar uma empresa e vai cadastrar apenas consultores para auditar as urnas.
A terceira e mais complexa proposta das Forças envolve alteração na forma como é feito o teste de integridade das urnas, no dia da votação. Os militares sugeriram que o TSE transferisse o exame para as seções eleitorais e envolvesse eleitores reais, que seriam convidados, depois de votarem na cabine oficial, a desbloquear com biometria uma segunda urna-teste instalada no local. Em seguida, uma “votação paralela” seria conduzida e checada por servidores da Justiça Eleitoral, com uso de cédulas de papel para conferir o funcionamento do equipamento.
Atualmente, esse teste é feito na sede dos TREs, sem participação de eleitores, com gravação e transmissão ao vivo na internet. Nunca houve divergência. Para os militares, porém, o teste não cobre todas as ameaças internas, como vírus que poderiam ser instalados fisicamente na estrutura das urnas ou nos programas que processam os votos e a contagem.