Investigado, Bolsonaro leva milhares à Paulista; ato tem críticas ao Supremo

26/fev 07:00
Por Samuel Lima, Pedro Augusto Figueiredo e Zeca Ferreira / Estadão

Um ato convocado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) reuniu milhares de pessoas neste domingo, 25, na Avenida Paulista. Chamada pelo ex-chefe do Executivo federal após a operação da Polícia Federal que investiga a suspeita de tentativa de golpe de Estado no País para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a manifestação mostrou que o bolsonarismo mantém a força nas ruas mais de um ano após a saída de Bolsonaro do Palácio do Planalto.

O evento, desta vez, foi marcado por falas mais contidas dos líderes políticos em razão de restrições impostas no inquérito da PF pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. No entanto, outros protagonistas, como o pastor Silas Malafaia e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, aproveitaram os discursos de cunho religioso para fazer críticas e mandar recados ao STF.

A Secretaria de Segurança Pública do Estado calculou um público de cerca de 600 mil pessoas na avenida, sem registro de incidentes.

Bolsonaro foi o último a discursar. Ele disse sofrer uma perseguição que se intensificou depois que deixou a Presidência, no fim de 2022, falou em “pacificação” e pediu anistia a implicados na Justiça pelo 8 de Janeiro. O ex-mandatário negou liderar uma articulação golpista depois da derrota na eleição presidencial (mais informações na pág. A8).

Bolsonaro foi um dos alvos da Operação Tempus Veritatis e precisou entregar seu passaporte às autoridades. Intimado a depor na investigação, o ex-presidente compareceu na quinta-feira passada à sede da PF, em Brasília, mas ficou em silêncio. O argumento de Bolsonaro para justificar a convocação do ato foi de usar a ocasião para se defender das investigações.

Malafaia – que afirmou ter bancado a manifestação na Paulista e se tornou porta-voz do evento nas duas últimas semanas – fez o discurso mais contundente, com ataques ao STF, ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a Moraes.

‘SANGUE’

Ele disse que o ministro, relator dos inquéritos contra o ex-presidente, “tem sangue nas mãos” por causa da morte de um dos presos pelo 8 de Janeiro na Penitenciária da Papuda. Também citou uma eventual prisão de Bolsonaro.

“Toda essa engenharia do mal, toda essa maldade contra Bolsonaro, covarde, ao arrepio da lei e da Constituição… Presidente, você com Deus é maioria sempre. E eu vou dizer uma palavra que eu disse para você algumas vezes no telefone. Eu não desejo isso para você, mas vou deixar aqui uma palavra. Se eles te prenderem, você vai sair de lá exaltado. Se eles te prenderem, não vai ser para sua destruição, mas para a destruição deles”, afirmou o pastor, que questionou a imparcialidade de Moraes e do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, como juízes da Corte.

“Alexandre de Moraes disse que a extrema direita tem que ser combatida na América Latina. Como um ministro do STF tem lado?”, perguntou. “O presidente do STF, ministro Barroso, disse: ‘Nós derrotamos o bolsonarismo’. Isso é uma vergonha. É uma afronta ao povo.” Malafaia afirmou que não teme ser preso e que vergonha seria “fugir” no momento do que chamou de “a maior perseguição política da história”.

A pedido do próprio ex-presidente e diferentemente de outras manifestações bolsonaristas, faixas e cartazes com ataques ao Supremo não foram identificados pela reportagem. Além de ter o passaporte apreendido, Bolsonaro foi proibido de manter contato com outros investigados no inquérito que apura suspeita de golpe.

Outro alvo da Operação Tempus Veritatis, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, esteve na Paulista por volta de 13h, cerca de duas horas antes do horário previsto para o início do evento, e fez um agradecimento rápido ao público presente na avenida.

‘INJUSTIÇAS’

Michelle abriu os discursos com apelo religioso e reclamando de supostos “ataques e injustiças” sofridos por ela e sua família. “Por um bom tempo fomos negligentes a ponto de falarmos que não poderia misturar política com religião, e o mal tomou o espaço. Chegou o momento da libertação”, disse. “Desde 2017 estamos sofrendo porque exaltamos o nome do Senhor no Brasil, porque o meu marido foi escolhido e ele declarou que era ‘Deus acima de todos'”, declarou Michelle.

O discurso com referências bíblicas foi acompanhado por uma música instrumental de fundo. Em alguns momentos, Michelle falou com a voz aparentemente embargada. O ex-presidente está inelegível até 2030 por decisão do TSE. A ex-primeira-dama é vista como possível aposta eleitoral do PL.

CLIMA

O ato foi divido em dois carros de som: um “vip”, usado por Bolsonaro, Michelle e aliados próximos – como governadores e deputados mais vinculados ao ex-presidente -, e outro para demais autoridades. Por volta de 15h, a reportagem identificou a presença de cerca de 25 parlamentares na manifestação, entre deputados federais e senadores. A tarde de domingo foi de calor e sem chuva em São Paulo.

Os manifestantes fizeram coros pedindo o impeachment de Lula em diversas ocasiões. Na semana passada, parlamentares protocolaram um pedido de impeachment do atual presidente, após ele ter comparado a investida israelense na Faixa de Gaza ao Holocausto. Bandeiras de Israel foram vistas entre o público da manifestação e autoridades políticas.

Enquanto lia trechos da Bíblia, Michelle pediu aos manifestantes que imaginassem um “Brasil liberto”, com “famílias restauradas” e “livre da corrupção”. “Não há portas do inferno que prevalecerão sobre a nossa Nação”, declarou, olhando em direção ao céu. Sem mencionar diretamente a declaração recente de Lula, a ex-primeira-dama pediu ainda proteção divina “dentro dos muros de Israel”.

Ao longo do evento, que durou aproximadamente duas horas, apoiadores do ex-presidente ecoaram o coro “volta, Bolsonaro”.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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