Leitores celebram hoje dois clássicos da literatura – ‘Ulysses’ e ‘Mrs Dalloway’

16/06/2021 08:00
Por Maria Fernanda Rodrigues / Estadão

É uma coincidência que neste ano o Bloomsday e o Dalloway Day sejam celebrados aqui ao mesmo tempo. Tradição entre os leitores de James Joyce (1882-1941) há quase um século – o primeiro é de 1924 -, o Bloomsday relembra Ulysses, lançado em 1922 e cuja ação toda, centrada em Leopold Bloom, se passa no dia 16 de junho de 1904, em Dublin. Em São Paulo, o dia é festejado desde 1988. Já o Dalloway Day é um evento mais tímido, e não há um dia exato para sua celebração, já que Virginia Woolf (1882-1941) situou sua história numa quarta-feira, em meados de junho de 1923, em Londres. A festa para seu romance mais célebre começou a trilhar seu caminho no Brasil em 2020 – e segue digital por causa da pandemia, como o Bloomsday.

Nesta quarta, 16, a editora Nós, que está publicando os diários de Virginia, e a The School of Life Brasil (Tsol), as duas que iniciaram as comemorações aqui no ano passado, promovem a aula Dalloway Day at Night, com a editora Simone Paulino e a tradutora Ana Carolina Mesquita e inscrição a R$ 88. Ao longo do dia, haverá ainda uma rodada de vídeos com leituras nas redes sociais da Nós, Tsol e da Gato Sem Rabo, nova livraria de São Paulo que abriga apenas obras escritas por mulheres e que emprestou seu nome de um texto de Virginia Woolf. Participam autoras como Alice Ruiz, Natalia Timerman, Andrea Del Fuego, Prisca Augustoni, Micheliny Verunschk e Aline Bei. E quem passar pelas livrarias Mandarina, da Tarde, da Travessa e Gato Sem Rabo, em São Paulo, e pela Baleia, em Porto Alegre, verá um espaço especial dedicado ao evento.

E o que o romance publicado por Virginia Woolf em 1925 tem de tão especial? “Mrs Dalloway, para além de um marco na literatura – pelo uso do chamado fluxo de consciência, pela concentração da ação narrativa em um único dia, por tratar lado a lado da vida de uma mulher de classe alta e de um ex-combatente traumatizado da Primeira Guerra -, é um livro cuja sinopse não te prepara para a multiplicidade que ele contém.

Porque te oferece uma braçada de experiências simultâneas, de diferentes olhares e sensações sobre a vida, de reflexões sobre o que é estar vivo. É um livro que te arrebata, atordoante”, responde Ana Carolina Mesquita. Ela é a tradutora dos diários e vai trabalhar, agora, nesta que é a obra mais popular da inglesa – a ideia é publicar uma edição comemorativa no centenário.

Antes disso, porém, já em 2022, Simone Paulino pretende lançar, pela sua editora Nós, uma edição especial de Mrs Dalloway em Bond Street. “Virginia Woolf começou a escrever o embrião de Mrs Dalloway em 1922. Além do conto Mrs Dalloway on Bond Street, nessa época ela escreveu outros que viriam a ampliar a ideia desse romance ou que derivaram dele. Então, para dar início à publicação da ficção dela, vamos começar publicando, no próximo Dalloway Day, este texto e a partir dele seguiremos compondo a edição de 2025, acompanhando, digamos, o trajeto da Woolf até a publicação do romance”, explica a editora.

Hoje, há pelo menos cinco edições de Mrs Dalloway no País (Autêntica, Penguin, L&PM, Antofágica e Martin Claret). A tradução de Tomaz Tadeu para a Autêntica abriu a nova fase de Woolf no Brasil, depois do domínio público, em 2012.

Para Tomaz, que lança sua tradução de As Ondas, também pela Autêntica, em julho, Mrs Dalloway tem alguns elementos que o tornaram atrativo tanto para os leitores da época quanto para os de hoje. “Pode-se citar, por exemplo, sua estrutura narrativa, que foge aos cânones então ainda predominantes. Mrs Dalloway centra-se não no que os diferentes personagens fazem ou dizem expressamente, mas nos seus sentimentos, nas suas sensações, nos seus delírios, nas suas paixões. Quem não gosta de dar uma espiada na mente, na psique, na alma alheia? Acrescente-se a isso uma prosa fluente, rítmica, musical, além de outros truques narrativos que Virginia tão bem dominava, e tem-se um livro que ainda atrai e comove”, diz.

Bloomsday

Nesta mesma quarta-feira, a homenagem a James Joyce em São Paulo será realizada pela Casa das Rosas e Casa Guilherme de Almeida. Com transmissão pelo YouTube, o Bloomsday será aberto às 18h30 com uma palestra de Caetano Galindo, tradutor de Ulysses (Penguin), e seguirá com leituras e música. A coordenação é de Marcelo Tápia. “Neste ano ainda pandêmico, escolhemos um tema que dialoga com a circunstância: ‘O homem menos só’, algo que o romance nos propicia com seu mundo onde cabe cada um de nós”, comenta Tápia.

O Bloomsday de Florianópolis, organizado por Dirce Waltrick do Amarante, Clélia Mello e Sérgio Medeiros, será festejado com ações como a criação do jornal O Dia de Hoje, com notícias de junho de 1904 no Brasil e alguns anúncios na Irlanda, disponível em issuu.com/iamcampigotto/docs/o_dia_de_hoje, e leituras no blog Ulysses Polifônico.

“Ler Ulysses hoje é entrar num mundo que nos instiga, provoca e nos faz sentir mais humanos, com nossas virtudes e defeitos, mais vivos, mais iguais aos outros em qualquer tempo, menos abandonados e sós nesta época difícil que vivemos”, finaliza Marcelo Tápia.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Últimas