Liberdade de expressão e incentivos fiscais
Dentre as muitas facetas da liberdade de expressão, uma está diretamente relacionada com os direitos culturais que tutelam as relações jurídicas no campo das artes, da memória coletiva e do fluxo de saberes. Numa perspectiva ativa, os direitos culturais tratam da liberdade de expressão artística, científica e tecnológica, enquanto na perspectiva passiva estes direitos se referem ao acesso às fontes da cultura. A Constituição brasileira de 1988 afirmou a importância dos direitos culturais no artigo 215 que prevê o dever do Estado em garantir a todos o pleno exercício destes direitos, o acesso às fontes da cultura nacional, o apoio e o incentivo à difusão de manifestações culturais. Assim, as liberdades culturais implicam em abstenções por parte do Estado, como o dever não deve censurar, mas também em auxílios e incentivos, quando o foco é assegurar possibilidades equânimes de criação e de difusão.
O incentivo fiscal é uma forma de benefício concedido pela Administração Pública que direciona a carga tributária de empresas ou pessoas físicas para o desenvolvimento de determinadas áreas, sejam elas econômicas ou culturais. Neste contexto, foi criada a Lei Rouanet para promover criações artísticas e literárias através de normas igualitárias para todos os proponentes de projetos. O mecenato se tornou a modalidade de incentivo mais conhecida e utilizada da Lei Rouanet, dado o risco zero no que tange aos investimentos. No regime do mecenato, a União faculta às pessoas físicas ou jurídicas a aplicação de parcelas de seu faturamento para financiar projetos culturais devidamente aprovados pelo Ministério da Cultura. Trata-se de uma forma de autonomia na aplicação dos tributos pois, ao investir em um projeto cultural beneficiado pela Lei Rouanet, o contribuinte define a destinação da receita do seu imposto. A dedução do percentual do IR pode ser feita através de doação ou de patrocínio, sendo que na doação fica vedada toda e qualquer forma de vinculação para propagação do doador, enquanto no patrocínio é possível expor o nome do patrocinador no produto cultural que está recebendo o incentivo.
Atualmente, questiona-se a eficácia da Lei Rouanet no cumprimento do seu objetivo principal: promover a cultura do país de forma igualitária. Isso porque grandes projetos de apelo midiático e concentrados na Região Sudeste acabam suprimindo o acesso de projetos de menor capilaridade, dada a atração que exercem nos patrocinadores. Neste sentido, o que era para ser uma forma de investimento e promoção cultural acaba se tornando uma parceria “público- privada” em que o dinheiro é público – resultado de renúncia de receita -, mas a destinação só beneficia a poucos. Por esta razão, é preciso ampliar o debate sobre mudanças na Lei Rouanet que impulsionem novos canais de divulgação cultural e que democratizem o acesso aos meios de criação. O aperfeiçoamento dos mecanismos legais de incentivo fiscal promoverá avanços qualitativos e quantitativos no exercício da liberdade de expressão no Brasil.