Lobos-guarás passam a integrar a fauna da Região Serrana

26/06/2016 07:00

Considerado o maior canídeo silvestre da América do Sul, o lobo-guará é considerado um animal símbolo do Cerrado. Comum em ambientes abertos, a espécie possui hábitos solitários, apesar de formar uma unidade familiar durante o período de reprodução e de criação dos filhotes. Seu surgimento na região de Mata Atlântica se deu pela degradação de seu habitat que, de acordo com dados oficiais, já perdeu metade de sua cobertura vegetal nos últimos anos. 

Além disso, no estado do Rio de Janeiro a transição entre os biomas e a crescente degradação da Mata Atlântica, causada pelo homem ao longo dos anos, deixou grandes ambientes abertos, tornando propícia a vinda dos lobos-guarás para a região, já que a espécie muitas vezes é pressionada a abandonar seu habitat.

Uma pesquisa feita pelo analista ambiental do Instituto Chico Mendes/ICMBio, Bernardo Eckhardt, aponta que em todo o estado do Rio de Janeiro foram registradas 70 ocorrências oficiais envolvendo lobos-guarás. Os dados começaram a ser coletados em 2011 e em Petrópolis já foram registrados seis casos, principalmente nas zonas rurais do município, ou como são chamadas "áreas de pastagem". “Há relatos de pessoas que avistaram o lobo-guará em um condomínio próximo à BR-040 e também na Estrada União e Indústria, que chegou a ser registrado em vídeo em 2014 por um morador da cidade”, revela Bernardo.

O analista destaca que tais relatos podem ser explicados pela crescente ocupação dos espaços naturais. Além disso, por não ser uma espécie agressiva e considerada bastante curiosa, essa proximidade com a área urbana pode se tornar cada vez mais comum. Os hábitos alimentares dos lobos-guarás também são fatores que podem explicar essas ocorrências. Por ser onívoro, ou seja, se alimenta tanto de matéria vegetal quanto animal, esse animal consegue comida praticamente em qualquer lugar, basta encontrar uma oportunidade.

"Esse hábito por vezes coloca o animal em risco. Há relatos de lobos que foram abatidos no município de Areal por estarem predando galinhas e outros animais domésticos de sítios da região. É importante que os moradores evitem criar esses animais soltos para que não haja conflito e a vida dos lobos possa ser preservada, já que é considerada uma espécie ameaçada de extinção", explica Eckhardt.

Bernardo conta que seu primeiro contato com o lobo-guará foi em Petrópolis, quando recebeu um chamado para fazer o resgate do animal, no Retiro da Pedras. Foi nesse momento que decidiu fazer a pesquisa, principalmente pela surpresa de encontrar esse animal silvestre na Região Serrana. "Outro caso que chamou a atenção foi o lobo-guará que apareceu na Estrada União e Indústria e chegou a ser filmado. Em pouco tempo trabalhando no município eu já havia registrado três casos na cidade".

A proximidade com a espécie também foi fundamental para que a pesquisa fosse realizada, bem como para entender como essas populações selvagens vivem na região petropolitana e como se adaptaram ao novo habitat. Inclusive foi possível recolher dados de animais vítimas de atropelamentos e até mesmo da violência do homem, que muitas vezes por medo ou por falta de conhecimento acaba matando os lobos-guarás que aparecem. De acordo coma pesquisa feita por Bernardo, dos 70 casos oficiais já registrados, 18 se referem a lobos mortos ou tirados da natureza, geralmente para serem domesticados.

É válido ressaltar que as pessoas devem evitar ter contato com qualquer animal silvestre. Devem evitar alimentá-lo e também domesticá-lo. Tais ações podem causar uma série de consequências negativas para as espécies, desde alterações comportamentais até transmissão de doenças. "É importante também que a população se conscientize sobre suas responsabilidades quanto a preservação dos animais, incluindo o lobo-guará. Ações simples como o descarte correto de lixo doméstico e evitar a criação de animais soltos no quintal ajudam a prevenir o contato com a espécie", explica Bernardo.

O que a população ainda não percebeu é o privilégio de ter uma espécie como essa em Petrópolis. E, talvez, a vinda desses animais seja uma esperança para sua preservação, já que essa transição exigiu também uma adaptação por parte dessa espécie. Além disso, iniciativas como a do analista ambiental são fundamentais para a criação de ações de preservação dos lobos-guarás na cidade e que no futuro possam servir de exemplo para outros municípios.

Índices de atropelamentos

Com relação ao trecho da BR-040 de Petrópolis até Juiz de Fora, que possui aproximadamente 100km, de setembro de 2007 a fevereiro de 2015 foram 21 lobos atropelados e mortos na rodovia, ou seja, uma média 2,47 lobos/ano. 

Para Bernardo, é de extrema importância destacar que o grande número de registros na BR-040 é em parte devido ao esforço amostral realizado. "Poucas rodovias possuem um banco de dados como a BR-040, construído com um dos melhores sistemas de monitoramento de fauna impactada do país. Vale ressaltar também que já iniciamos um projeto para tentar diminuir os impactos de atropelamentos sobre os lobos e outras espécies, além de conscientizar os usuários da via, bem como os moradores do entorno".

Esse trabalho em conjunto é essencial para os projetos de conservação da natureza. No entanto, é preciso mais envolvimento dos órgãos ambientais e da sociedade como um todo.


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