LPs cinquentões apontam direções distintas em ano de arrocho militar

22/05/2022 08:10
Por Julio Maria / Estadão

Criadores falam ao Estadão de suas obras eternas.

Acabou Chorare

Novos Baianos

“Seria um grupo? Uma família? Um time de futebol? Eram libertários e adeptos do sexo e drogas livres, tudo o que a juventude queria, e isso em plena ditadura do general Médici”, diz Nelson Motta. Paulinho Boca de Cantor, um dos integrantes do grupo, amplia: “João Gilberto mudou nossa forma de ver a música. Ao nos conhecer, ele disse: ‘Eu não entendo por que vocês não mostram mais vocês nas músicas.’ Foi assim que o álbum virou essa junção de Brasil com rock and roll”.

Clube da Esquina

Milton Nascimento e Lô Borges

“Imagine que no mesmo lado em que aparece a densa Os Povos tem Paisagem da Janela. Sem nenhuma direção, o álbum acabou ficando surpreendente”, conta Lô Borges. “Eu e Milton éramos diferentes, a música dele era outra. Eu, dez anos mais novo, ouvia Beatles e Rolling Stones enquanto ele já ouvia Miles Davis. Essa equação ficou muito interessante quando Milton, com aquela sabedoria, soube juntar tudo.”

Transa – Caetano Veloso

Caetano: “Me comove que tantos jovens cultuem Transa, o disco que gravamos em quatro dias num estúdio em Londres. Ralph Mace tocou a produção. Era o segundo que eu fazia em Londres e tinha a intenção de lançá-lo lá e no ‘mundo’. Mas como o louco Brasil deu sinais de que eu podia voltar pra cá, eu, que sou louco por esse louco, nem tive dúvidas de que escolhia vir. Mace tinha ficado animado com os shows que fiz por lá com a banda de Transa e me pediu pra esperar ao menos um ano. Mas eu só queria (desde que pra lá fui, expulso pela ditadura) retornar. O disco só saiu no Brasil. Com capa maluca de Álvaro Guimarães. Bateu em brasileiros de várias gerações seguidas. Vale”.

Expresso 2222 – Gilberto Gil

“Um disco de que gosto muito por razões artísticas. O repertório, o modo como foi tratado, as inovações, a guitarra que era a primeira vez que eu tocava com mais intensidade. É um disco do exílio realizado na volta do exílio. Um disco de reintrodução à vida artística e à plenitude das vivências em casa, com a família, com a gente brasileira. É um dos mais importantes da minha carreira por tudo isso, o momento histórico e as circunstâncias da vida pessoal. Era histórico na época. Hoje, é mais histórico ainda.”

A Dança da Solidão

Paulinho da Viola

“Todos nós pensávamos muito sobre isso (a ditadura) e tomávamos certo cuidado”, diz Paulinho da Viola, ao lembrar de seu disco introspectivo. “Essa limpeza dos instrumentos vem de uma procura que fiz desde o primeiro disco. Maestro Gaya disse, depois dos arranjos de orquestra do álbum de estreia: ‘Com você a gente tem que tirar, não colocar’.”

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