Mercedes-Benz é condenada a pagar R$ 40 mi por danos morais coletivos em Campinas

04/out 13:41
Por Clayton Freitas / Estadão

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15) condenou a Mercedes-Benz Brasil a pagar R$ 40 milhões por danos morais coletivos cometidos contra operários da fábrica de Campinas, no interior do Estado de São Paulo, que ocorriam desde 2015, segundo a decisão judicial. Ainda cabe recurso da decisão ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

A empresa foi acusada de assédio moral em situações que envolviam diversos funcionários com deficiências físicas ou negras, além de egressos do sistema penitenciário.

Procurada na manhã desta sexta-feira, 4, a Mercedes-Benz Brasil enviou a seguinte nota: “A empresa não comenta processos que estejam em andamento e reforça que adota todas as medidas de respeito, proteção, saúde e segurança de seus trabalhadores.”

Questionada, a empresa não informou se irá recorrer ou não.

A decisão, do dia 24 de setembro, é da 11ª Câmara do Tribunal Regional de Trabalho da 15ª Região. O relator do caso é o desembargador Luís Henrique Rafael, juiz relator de um recurso proposto tanto pela empresa quanto pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas, de Material Elétrico e Eletrônico e de Fibra Óptica de Campinas, Americana e Indaiatuba. O dois queriam reformar uma decisão anterior, em um processo que tramita desde 2019.

Além de manter o valor da indenização, que será revertida para uma instituição indicada pelo Ministério Público do Trabalho, o desembargador impôs que, em caso de descumprimento, a Mercedes é obrigada a pagar a multa de R$ 100 mil por trabalhador vítima de assédio moral ou discriminação, ou multa diária de R$ 10 mil.

A empresa alegou no recurso que se tratava de “fatos isolados”, o que foi rechaçado pelo juiz. “Aceitar as práticas incontroversamente realizadas como “fatos isolados”, como defende a recorrida, representaria grave retrocesso social”, diz, em um trecho do seu voto.

Desembargador cita ‘culto ao capacitismo’

A ação cita trechos de depoimentos de algumas das testemunhas. Muitos funcionários dizem que seus superiores os classificaram como “divergentes” e realocados para funções consideradas menores. Um dos casos é de um trabalhador, empregado pela empresa entre 4 de dezembro de 1990 a 10 de outubro de 1996, que foi reintegrado em 6 de abril de 2004 após o reconhecimento de uma doença ocupacional. Inicialmente, trabalhou como pintor, mas após sua reintegração, foi realocado para funções consideradas “divergentes”, como ajudante no almoxarifado. Por vezes, lavava carros e fazia entregas.

Outro trabalhador era chamado por seu supervisor, de acordo com a ação, de “mau elemento” em reuniões que contavam com a presença de outros colegas. Depois de voltar de um período de afastamento por doença, também foi colocado para fazer outras funções ou mesmo ficar sem fazer nada de forma forçada.

As denúncias indicam também que um líder proferia xingamentos a trabalhadores que voltavam ao trabalho após licença médica. As palavras usadas por ele, segundo a denúncia, incluíam as expressões “negro”, “aleijado” e “vagabundo”.

O supervisor dizia ainda que eles não gostavam de trabalhar. O termo “vagabundos” também era usado por uma médica do trabalho da Mercedes, conforme descrito na ação.

Os depoimentos colhidos pelo sindicato e encaminhados ao Ministério Público do Trabalho informam ainda que o RH da empresa era procurado pelos funcionários. Entretanto, o órgão não encaminhou as denúncias para o compliance da empresa, o que dificultava a investigação interna.

“Verifica-se no comportamento reiterado da recorrida e seus prepostos verdadeiro culto ao ‘capacitismo’ [preconceito contra as pessoas com deficiência, em que se julga que elas não são capazes ou são inferiores], pretendendo estabelecer quais são os corpos adequados e suas possibilidades, assim como quais não são”, escreveu o desembargador no seu voto.

A ação ainda determina que a empresa tome 12 medidas. Elas incluem a proibição de práticas vexatórias, discriminatórias ou humilhantes por parte dos superiores, incluindo xingamentos, apelidos ofensivos, castigos jocosos, rótulos depreciativos, ridicularização, comparações desfavoráveis, metas irrazoáveis, intimidação, instigação de discórdia, ameaças por doença, pressão psicológica e coação.

Essas mesmas medidas também devem incluir os empregados que retornam de reabilitação previdenciária ou egressos do sistema penitenciário. A ação cita que a empresa deve impedir práticas discriminatórias relacionadas a estética, raça, origem, etnia ou doenças.

Deve também criar um programa com diagnóstico do ambiente de trabalho, e realizar palestras semestrais sobre discriminação e assédio moral, além de monitorar os assediadores e adotar práticas para evitar que gestores fomentem assédio moral contra seus subordinados.

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