Morador teme que casa seja demolida na BR
Há quase um ano, o carpinteiro Crisanto Elias da Cruz, de 55 anos, teme sair de casa. Ele tem medo de voltar e encontrar a casa onde mora há 23 anos nas margens da BR-040, próximo da localidade conhecida como Aranha-Céu, demolida. O drama de Crisanto não é único e está longe de chegar ao fim. Marcada para ocorrer ontem, a demolição da casa foi suspensa graças a uma ação do Ministério Público que conseguiu adiar por tempo indeterminado todas as demolições. As ações de remoção são um pedido da Concer, empresa que administra a rodovia.
O Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis, CDDH, entrou com um pedido de suspensão da demolição da residência, mas o desembargador da 1ª Vara Federal julgou o pedido improcedente. Depois disso, a data da demolição foi marcada para 12 de julho. De acordo com as advogadas Daniele Linden e Flávia Valadares, ambas do Projeto Assessoria Jurídica Popular, do CDDH, que acompanham as ações demolitórias desde o início de todo este processo, em 2004, prestando assessoria a todas as comunidades que residem no entorno da BR040, na luta para que o direito à moradia dessas famílias seja mantido. De acordo com a Concer, atualmente existem 250 processos contra moradores na localidade.
“As ordens de demolição começaram a ser expedidas no final de 2015. Diante da possibilidade de demolição, o CDDH entrou com um Agravo de Instrumento, que foi negado pelo juiz. Entretanto, o Ministério Público Federal reforçou o nosso pedido de agravo da decisão e, com isso, a ordem foi suspensa e ficará assim até que esse recurso seja julgado. No momento, seguimos monitorando os casos e aguardando o julgamento do agravo”, responderam.
Ainda de acordo com o CDDH, 59 processos já foram extintos em virtude do trabalho de regularização fundiária realizado pelo Iterj – Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro a partir do Grupo de Trabalho criado pelo Ministério Público Federal e que reúne hoje diversos órgãos, entidades, setores públicos e organizações. Até hoje, apenas uma casa foi demolida, nesse caso, com a concordância do proprietário. Com a última decisão, todas as ordens de demolição já expedidas estão suspensas.
“Os processos são individuais. O que se espera é que todos eles possam ser suspensos até que o Grupo de Trabalho do MPF avance no processo de regularização fundiária e que as casas com possibilidade de regularização não sofram o dano irreparável, que é a demolição”, afirmaram as advogadas do CDDH.
Crisanto nasceu no Espírito Santo, mas mora em Petrópolis há 26 anos. O carpinteiro mora entre os Km 57/58 da BR-040. Ele começou a construir a residência há 23 anos. Nela, plantou 16 pés de manga, abacateiros e bananeiras. O terreno, bem cuidado, tem cercas e portão de madeira. “Tem uns oito meses que vivo apavorado. Já imaginou você sair para trabalhar, voltar e encontrar a sua casa no chão? Há uns quinze dias estava trabalhando em Arraial do Cabo quando um amigo me ligou dizendo que iam demolir a casa. Voltei desesperado. É dessa forma que eu vivo, com medo, pavor”, contou Crisanto.
O morador afirma ainda que não tem para onde ir caso a casa seja demolida. “Não tenho onde ficar, tudo o que eu tenho está nessa casa. Arrumei tudo, tive o cuidado de manter a casa longe da rodovia e do rio. Já passaram técnicos aqui e constaram que a casa não representa perigo. Quero apenas o direito de moradia. Se tivéssemos algo em vista, um terreno, podíamos levar portas, janelas e começar a construir em outro local, mas e o que gastei aqui com tijolos e cimento? Minha vida inteira está nessa casa”.
O apoio do CDDH é o que garante o mínimo de tranquilidade para Crisanto. Segundo ele, reuniões são feitas com os moradores de 15 em 15 dias. O Centro os orienta, apoia e os mantêm informados sobre os trâmites de todo o processo. “Esse é, de verdade, um direito humano. Eles nos ajudam em tudo porque nunca sabemos ao certo o que pode acontecer. Pelo que eu lembro, a última casa que demoliram aqui foi há seis anos, mas a família já tinha saído da residência”, contou.
Crisanto contou que não tem nenhuma alternativa, caso perca a moradia. “Não tenho previsão de nada. Nunca me ofereceram nada. Querem me colocar na rua. A impressão que tenho é de que estão me tratando como cachorro e nem um bicho merece viver nesse pavor. Não tenho como pagar aluguel. A maioria das famílias nessa situação não tem. Nas casas aqui tem muitas crianças, onde esse povo vai morar? Tive o cuidado de colocar cerca viva, cuidar do terreno e hoje fico triste, porque não posso fazer mais nada nesta casa até a decisão final sair”, disse.