Mostra em NY traz a singularidade e a diversidade do artesanato de Alagoas

24/05/2022 08:00
Por Marcelo Gomes Lima, especial para o Estadão / Estadão

Nas duas últimas décadas, o interesse mundial pelo feito a mão não parou de crescer. A princípio, motivado pelo prazer de redescobrir técnicas de produção esquecidas, mas, em boa medida, mais sustentáveis. Depois, pela possibilidade de conceber ambientes cada vez mais personalizados, a partir de um bem dosado mix: de um lado, objetos bem acabados, produzidos industrialmente. De outro, peças artesanais. Imperfeitas por natureza, mas, justamente por isso, únicas.

Nos dias de hoje, porém, um ingrediente a mais veio a se somar à equação: um desejo difuso por autenticidade, que a pandemia só fez acentuar. Executado por artistas populares que perpetuam técnicas ancestrais, o objeto artesanal surge assim como um porto seguro para quem pretende decorar de maneira mais original e autêntica. Um antídoto contra a mesmice. Oferecido, ainda, na maioria das vezes, por preços bem mais em conta do que os dos produtos convencionais.

Apesar de ocupar a posição de segunda menor unidade da federação, o Estado de Alagoas tem se revelado um terreno fértil para a manifestação da arte popular. Com uma paisagem exuberante – que vai do litoral ao Agreste, passando pela Zona da Mata -, por lá podem ser encontrados artesãos que exploram variados materiais: da palha à argila, da madeira ao tecido. Matérias-primas nativas que, recriadas por mãos habilidosas, ganham a forma de cestos, vasos, entalhes e bordados.

Parte integrante do projeto Casa Brasil 2022, realizado pela Apex Brasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), a exposição Alagoas feita à mão, em cartaz até o dia 25 nos pavilhões do Soho Lofts, em Nova York, pretende comunicar ao mundo essa condição singular desse Estado brasileiro.

Com curadoria de Marco Aurélio Pulchério e Rodrigo Ambrosio, designers e pesquisadores com destacada atuação junto a comunidades de artesãos no País, a mostra, à parte apresentar ao público norte-americano um inventário bastante abrangente da rica produção alagoana, pretende demonstrar, na prática, como o objeto artesanal, apesar de reproduzir conhecimentos comuns a muitos, pode acabar revelando visões bastante particulares de mundo. “Além dos povos originários, Alagoas tem forte influência cultural africana e europeia. Soma-se a isso sua geografia bastante heterogênea e o resultado surge na forma de um fazer artesanal multifacetado”, afirma Ambrósio.

MOSTRAS

“Condições, de fato, únicas, que se relacionam diretamente com a temática proposta pela Casa Brasil para suas mostras internacionais este ano, que é “Brasil in Natura, terra adentro”, complementa Pulchério.

“Em Alagoas, podemos encontrar trabalhos de cestaria em palha no litoral sul, esculturas em argila no baixo São Francisco, além de diversos tipos de entalhes em madeira” explica Ambrosio, que mora em Maceió e figura entre os 70 profissionais no mundo elencados por Li Edelkoort, a cultuada trend setter holandesa, no seu mais recente livro, A Labour of Love (Um Trabalho de Amor).

O designer reconhece no artesanato alagoano particularidades notáveis. “Na Ilha do Ferro, o bordado Boa Noite, que só é executado por lá”, diz.

Reunindo, além de novas obras, parte das criações que se destacaram na exposição Alagoas, The Brazilian Artisanal Soul (Alagoas, A Alma Artesanal Brasileira), realizada em Miami, em dezembro passado, na mostra nova-iorquina a diversidade humana surge como tema recorrente. Assim como a representação da fauna e flora locais. Tanto nas obras assinadas por reconhecidos mestres alagoanos, como nas de artistas populares menos conhecidos.”Todo artista popular expressa sua história, costumes e crenças em suas obras, apesar de não possuir, em sua grande maioria, nenhuma formação acadêmica ou formal. Já o mestre também é um artista popular. O que o diferencia é o fato de transmitir seus conhecimentos”, explica Pulchério.

Para o curador, a oportunidade de partilhar um espaço dedicado a produtos made in Brazil só enfatiza o valor artístico e o componente autoral do artesanato. Ao mesmo tempo em que pode sugerir, para profissionais das mais diversas latitudes, um novo olhar sobre saberes muitas vezes esquecidos.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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