O comportamento de cada um

27/09/2016 12:00

O fato ocorreu há uns 15 anos quando eu pertencia à ABP, numa cerimônia em que fui apresentado a uma jovem que questionou se eu era poeta. Diante da minha dúvida, insistiu – “Mas como, você não é acadêmico?” e lhe respondi – “Sim, mas quem pode avaliar se sou ou não poeta é quem ler meus trabalhos!”. E a jovem, com um muxoxo, replicou – “Como você é modesto!”, deu-me as costas e  se afastou. Portanto, isto não é modéstia, é consciência de cada um quando começa a rabiscar alguns versos,  para não se arvorar como tal. E o eterno príncipe dos trovadores, Luiz Otávio, assim advertiu – “É uma história bem correta / em tudo o ensino é preciso, / no entretanto, só poeta / quer ser gênio de improviso”. É a vaidade subliminar, de cada um, que  pode levá-lo a tal reação pois, sempre digo – “sem leitura não há cultura”.

Por isso, todos se dizem tementes a Deus, mas serão mesmo, conscientemente? É  muito freqüente ouvirmos pessoas dizer que “confiam” em Deus ou em seu santo de devoção, para resolver seus problemas  – mas o que cada um faz além disto? Dizem que a fé remove montanhas, mas se cada um não colaborar, sozinho ela não as removerá. Assim são as pessoas que vivem reclamando de tudo, mas quando a solução do problema está ao alcance de suas mãos, caem em letargia e esperam que as entidades superiores resolvam tudo, pois é desgastante e, às vezes, até, para evitar serem criadores de caso.

Não me julgo vaidoso com minhas atitudes mas, ao longo da vida e diante de diversas reações, terminamos por nos sentir diferentes dos demais. Nunca senti orgulho de nada, simplesmente uma satisfação interior muito grande, mas as circunstâncias e o comportamento de muitos, diante dos fatos, terminam por nos obrigar, mesmo sem querer, a sentir “orgulho” de nossa postura,  talvez, por não encontrar eco em muitas situações. Aliás, o escritor Fernando Jorge, filho de nosso patrono Salomão Jorge, assim definiu a poesia e que pode ser compreendida de maneira mais abrangente: “ Poesia é acústica, ressonância de nossas emoções” – portanto, todas nossas reações também podem ser consideradas como “ressonância de nossas  emoções”.

Portanto, escrevi, num sonetilho – Migalhas:

“Ame-se disse uma aragem / soprada – como se faz ? / Seria admirar a imagem  / frente ao espelho falaz / para ver uma miragem? / Não ! Isto não satisfaz ! / Há que possuir bagagem / ter-se algo bem mais primaz. /

Amar-se é transpor muralhas, / derrubar todas as grades / reconhecer suas falhas. /

Prezar pelas qualidades / como se fossem migalhas / em respeito as amizades. /

E, para melhor compreender e analisarmos as reações humanas, também podemos nos debruçar sobre os curtos versos de Francisco Otaviano (1825-1899), que tudo diz,  quando escreveu Ilusões da vida:

“Quem passou pela vida em branca nuvem / e em plácido repouso adormeceu; / quem não sentiu o frio da desgraça; / quem passou pelo mundo e não sofreu, / foi espectro de homem, não foi homem, / só passou pela vida e não viveu !”

Poesia, sempre a poesia, a nos trazer ensinamentos e orientações para usufruirmos de uma vivência mais elevada e tirar os pés do chão, ou seja, da materialidade dos desejos, pois ela, sempre ela, espelha a alma de um povo ou de uma geração. Lamentável que os poetas atuais não nos brindem com trabalhos mais sensíveis para nos ajudar a enfrentar as mazelas desta vida. – jrobertogullino@gmail,com

Últimas