07/jan 08:00
Por Ataualpa A. P. Filho

A inquietude do tempo promove esta expectativa diante do passar dos anos. Mas, para não viver à mercê da sorte ou do azar, é preciso construir, no presente, o futuro. Entre o ontem e o amanhã, existe o agora que o amor eterniza quando vivido na intensidade do para sempre. Nas 24 horas do hoje, temos a oportunidade de efetuar as mudanças para receber o amanhã sem os erros do ontem. São benéficas as motivações que nos levam a desejar um ano de prosperidade. O desejo venturoso é pautado pelos nossos valores. Contudo, há um momento em que a saúde é colocada acima de tudo que o dinheiro pode comprar e a paz é vista como imprescindível nas relações sociais.

O amar e o servir encontram-se no caminho da felicidade, pois carregam o sentido da vida. Conforme o dito popular, “o futuro a Deus pertence”. Porém temos que fazer a nossa parte para o que se deseja venha a ser concretizado. Até as dádivas que provêm da misericórdia divina dependem de nós. Não há salvação sem fé. Temos que fazer por merecer. Se, às vezes, não alcançamos o que almejamos, talvez seja pelo fato de não ter lutado o suficiente para conquistar. A nossa parcela de culpa não pode ser omitida. O só querer não é poder, precisa dos nossos esforços. O querer só tem menos força do que o querer coletivo, uma vez que a união amplia a possibilidade de vitória. O desejo sem luta é inócuo. O aspirar sem transpirar não leva a conquista alguma. Concordo com o que escreveu Carlos Drummond em “Receita de ano novo”:

“Não precisa/ fazer lista de boas intenções/ para arquivá-las na gaveta./ Não precisa chorar arrependido/ pelas besteiras consumidas/ nem parvamente acreditar/ que por decreto de esperança/ a partir de janeiro as coisas mudem/ e seja tudo claridade, recompensa,/ justiça entre os homens e as nações,/ liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,/ direitos respeitados, começando/ pelo direito augusto de viver./

Para ganhar um Ano Novo/ que mereça este nome,/ você, meu caro, tem de merecê-lo,/ tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,/ mas tente, experimente, consciente./ É dentro de você que o Ano Novo/ cochila e espera desde sempre.”

A vida nova depende dos calos das nossas mãos. É certo que, “por decreto de esperança”, a realidade não muda, porém necessitamos desse impulso interior que move sonhos. Por isso gosto desse clima de positividade, dessa energia que sugestiona, que ajuda no resgate da autoestima. O “réveillon”, o despertar para o ano novo, pode ser aproveitado para provocar mudanças. Tenho azucrinado alguns amigos fumantes para que parem com o tabagismo. Qualquer cigarro a menos será lucro.

Novamente brigarei com a balança. Tentarei romper o sedentarismo. Tentarei viajar menos nas leituras para praticar exercício físico. Voltarei a caminhar…

Não sou de ferro, também tenho o meu pecado de estimação: a gula. Preciso fechar a boca não só para manter o silêncio, mas também para regular a minha alimentação. O meu estômago nunca sabe a hora que vai receber alimentos, nem a quantidade. Acho que ele já está habituado à imprevisibilidade.

Diante dos meus erros, não tenho a mínima pretensão de ditar normas de comportamento, nem de estabelecer fórmula para o uso consciente do tempo. Sei que as pessoas têm seus objetivos, são portadoras de ideias que norteiam as atitudes. Por isso que o conceito de felicidade paira sobre a relatividade. Contudo, a liberdade é inerente ao livre arbítrio. As nossas escolhas podem determinar o rumo de nossas vidas.

Os sins e os nãos do dia a dia funcionam como balizamento da nossa travessia. O discernimento provém de um processo reflexivo independente da cor da roupa usada na passagem de ano. A voz da consciência é ouvida com mais acuidade no silêncio da noite. O diálogo no travesseiro é que apascenta a alma, não está vinculado às superstições que se aglomeram nos finais de ano.

Confesso que até hoje me esforço para seguir o versículo de Mateus: “Nãos vos preocupeis com o dia de amanhã. O dia de amanhã terá as suas próprias dificuldades. A cada dia basta o seu peso” (Mt 6,34).

Essa dificuldade consiste no fato de que sempre há problemas do ontem que não são plenamente resolvidos. As pendências dos dias anteriores se somam aos problemas do hoje. Como geralmente precisamos das decisões de pessoas e/ou órgãos proteladores, soluções são adiadas. Por isso, acho que o amanhã deve ser construído no agora. O “não deixar para amanhã o que pode ser feito hoje”, considero proatividade. Sou da geração que cantou “quem sabe faz a hora/ não espera acontecer”. Vamos caminhar de mãos dadas em 2024…

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