O drama das instituições disfuncionais

07/03/2020 09:25

A manifestação convocada para o dia 15 de março de apoio ao executivo federal está dando pano para mangas. Compreensível por um lado, e discutível por outro. Qualquer povo tem o direto de ir às ruas se manifestar, mesmo que seja para expressar seu descontentamento em relação aos poderes constituídos. Mais que compreensível, não é mesmo? O discutível partiu da reação dos ditos poderes – congresso, STF e judiciário –, que estão vendo no episódio uma afronta e sério risco ao processo democrático. Este, de fato, deve ser preservado na plenitude. Cabe incluir aqui a grande mídia, jornais e TVs, também alarmada. 

Mas será que estão indo na direção correta? Nas redes sociais, o que se observa é a voz de parte expressiva da população, e não apenas dos bolsonaristas, de apoio à convocação para o dia 15. Mais uma vez, estamos diante de uma situação em que o povo está de um lado e o establishment de outro. Durante a campanha de 2018, essa fissura foi observada claramente. A crença da mídia em sua capacidade de tutelar a opinião pública foi um tiro no pé. As redes sociais tiveram musculatura  capaz de dar seu recado nas urnas em direção à mudança necessária.

Afinal, o que está acontecendo?

Os poderes constituídos e a grande mídia batem na tecla de sua legitimidade baseada na constituição de 1988, cuja elaboração teve, sem dúvida, ampla participação popular. Mas pouco se fala no que ocorreu desde então. Lá se vão mais de três décadas, tempo de uma geração, e o resultado observado não foi nada bom. A população sente na pele os efeitos da corrupção sistêmica, da brutal desigualdade social e a ausência de representatividade de seus supostos representantes nos parlamentos municipais, estaduais e federal. Os abusos continuam.

O primeiro teste a ser realizado é simples. Em qualquer roda de amigos, ou mesmo em pesquisas mais amplas sobre o desempenho do congresso, do STF, do judiciário e mesmo da grande mídia, a insatisfação aguda pode ser verificada a qualquer momento. Ou seja, são poucos os que têm em alta conta estes atores institucionais. O congresso nacional conseguiu a proeza de produzir os parlamentares mais caros do mundo. O efeito cascata se manifestou nas assembleias estaduais e nas câmaras municipais, onde há malversação do dinheiro público. A população em geral engoliu em seco a recente aprovação de R$ 2 bilhões para financiar campanhas eleitorais ao invés de irem para educação e saúde. O voto distrital puro teria impedido essa afronta. Se quiséssemos despejar recursos públicos em campanhas eleitorais, as verbas deveriam ser distribuídas de acordo com as preferências dos eleitores pelos partidos políticos em votação pela internet via CPFs um ano antes das eleições. 

Quanto ao STF e ao judiciário, os desacertos e as gordas mordomias falam por si a sós. Juízes que recebem auxílio-moradia abusam de nossa paciência cívica diante do fato de receberam 40 vezes o salário mínimo, ou bem mais. Dentre outros equívocos grave, a decisão recente do STF criou dois tipos de cidadão no País. Aqueles que não podem ter salário e jornada reduzidos proporcionalmente, o setor público, e aqueles no setor privado que estão sujeitos às intempéries do mercado, e ainda pagam a conta do excesso de funcionários nos três níveis de governo.

Hoje existe ampla literatura sobre instituições disfuncionais: aquelas que não conseguem preservar o interesse público. É dever de todos questionar a legitimidade das nossas por sua incapacidade de velar pelo bem comum. Como demonstramos acima, as causas profundas da manifestação do dia 15 vão muito além dos disputados R$ 30 bilhões.

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