‘O Método Grönholm’ volta com pegada mais crítica, mas sem desprezar o humor

25/06/2022 08:00
Por Dirceu Alves Jr., especial para o Estadão / Estadão

Em março de 2020, o ator Lázaro Ramos tinha na manga três trabalhos prontos que consolidariam a sua faceta de diretor. Eram eles o filme Medida Provisória, marcando sua estreia como cineasta, a peça Antes do Ano Que Vem, monólogo protagonizado pela atriz Mariana Xavier, e a comédia O Método Grönholm, que entrou em cartaz no Rio de Janeiro e foi suspensa dois dias depois por causa do sinal de alerta da pandemia e o fechamento dos teatros.

“Eu fiquei completamente frustrado”, confessa ele. “Como artista, busco realizar obras que registrem o meu tempo e tive medo de que esses temas ficassem obsoletos, já que não tínhamos sequer uma previsão de quando seria possível entregá-los ao público.”

Quase dois anos e meio depois, o ator e diretor respira aliviado e reconhece que seus trabalhos não só conservaram frescor como ganharam novos significados diante dos efeitos devastadores da crise sanitária. O longa Medida Provisória, que trata do racismo, chegou às telas em abril e beira os 500 mil pagantes nas salas de exibição, enquanto o solo de Mariana Xavier, lançado em março, revelou fôlego extra na abordagem da saúde mental depois do longo confinamento causado pela pandemia.

IMERSÃO

Resta saber qual será a reação da plateia ao espetáculo O Método Grönholm, peça do catalão Jordi Galcerán, que estreou na sexta, 24, no Teatro Unimed, em São Paulo, depois de nova imersão de ensaios, sob a direção compartilhada de Lázaro e Tatiana Tibúrcio.

Luis Lobianco, Raphael Logam, George Sauma e Anna Sophia Folch interpretam quatro executivos, desempregados ou em fase de transição profissional, reunidos com sangue nos olhos na sala de recrutamento de uma multinacional para disputar uma vaga na empresa. Trata-se do mesmo texto protagonizado por Lázaro, Taís Araújo, Angelo Paes Leme e Edmilson Barros em 2007, sob a direção de Luiz Antonio Pilar.

Ao contrário do que se pode imaginar, a história não ficou martelando na cabeça do atual diretor ao longo do tempo. Foi Ana Sophia que, em uma conversa informal, sugeriu que seria interessante recuperar O Método Grönholm e entender os novos diálogos possíveis de serem travados. Afinal, em um país que atravessa uma crise financeira a contratação de um profissional por uma grande empresa não significa necessariamente uma garantia de estabilidade.

Para Lázaro, a discussão ética não morre, mas surgiu uma forte reflexão sobre as relações interpessoais. Algumas piadas que faziam o público gargalhar na segunda metade da década de 2000 mudaram de sentido e foram revistas pelo elenco porque o mundo também evoluiu.

“Nos poucos dias em que apresentamos, lá em março de 2020, ficou claro que a plateia considera muito mais risíveis as atitudes do opressor e não se diverte mais com as dificuldades enfrentadas pelo oprimido”, conta ele. “Com a pandemia também ampliamos a discussão sobre prioridades, o valor do tempo e se realmente vale tudo em nome da conquista ou da manutenção do emprego.”

ARROGANTE E PREPOTENTE

O ator Luis Lobianco salienta que seu personagem, Fernando Fontes, o mesmo vivido por Lázaro na primeira montagem, é aquele sujeito arrogante, prepotente, programado para ser o predador no mercado. “Com seu discurso calculado, ele vai preenchendo todos os pré-requisitos necessários, mas chega uma hora em que se mostra vazio e despreparado para lidar com humanidades”, explica o intérprete.

Luis Lobianco concorda com Lázaro que alguns diálogos escritos por Galcerán se apoiavam em questões identitárias e sexistas que se mostraram ultrapassados. “O capitalismo como doutrina moral ainda existe e se esse texto foi pensado de forma mais leve e divertida, hoje investimos em uma leitura crítica e, para reforçar a história, a piada precisa mesmo ser sacrificada”, declara o ator.

Lázaro endossa o colega para reforçar o importante papel da comédia como ferramenta crítica. “Eu não defendo debater temas fundamentais só pela comédia, é preciso ver também espetáculos pesados sobre questões intragáveis, mas, sem dúvida, é um meio mais palatável de atingir o público”, afirma Lázaro.

“Minha meta de vida é realizar trabalhos que sejam úteis para as pessoas, que elas se divirtam e consigam fazer uma revisão dos seus valores”, completa o ator. Sem dúvida, Lázaro Ramos, analisando sua trajetória, está no caminho certo para concretizar esse objetivo.

O Método Grönholm

Teatro Unimed. Al. Santos, 2.159.

6ª e sáb., 21h. Dom., 18h.

R$ 80 / R$ 100. Até 31/7

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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