O Prêmio Nobel de Literatura

24/10/2016 12:00

Quando a Academia Sueca anunciou o nome de Bob Dylan como ganhador do Prêmio Nobel de Literatura na semana passada (13/10), uma polêmica de âmbito mundial deflagrou-se. Os fãs do compositor apoiaram a escolha. Mas outros acharam que a produção literária dele não merecia tal prêmio, uma vez que publicara poucos livros. Porém a sua obra musical, inquestionavelmente, influenciou gerações. A própria Academia explicou a escolha: “por ter criado uma nova expressão norte-americana da canção.”

Nessa declaração, reside um ponto polêmico: há quem não considere letra de música poesia. Por isso os que trabalham com essa forma de composição são chamados letristas e não, poetas. É verdade que há muitas letras medíocres. Há também várias composições que são verdadeiros poemas. 

Pela beleza do seu trabalho, Bob Dylan é considerado um poeta. Tornou-se ícone pela reflexão de suas canções. 

É válido ressaltar que a poesia tem raízes na musicalidade. Basta dizer que o gênero lírico, na Antiga Grécia, era praticado acompanhado por uma lira, um cândido instrumento musical.  T. S. Eliot já afirmara: “A poesia começa, ouso dizer, com um selvagem batendo um tambor numa selva, e ela retém essa essência de percussão e ritmo”. Ele também fez a seguinte analogia: “Se, como James Thomson observou, ‘os lábios apenas cantam quando não podem beijar’, pode ser também que os poetas apenas falem quando não podem cantar.”

Cecília Meireles no poema “Motivo” foi bem explicita: “Eu canto porque o instante existe/ e a minha vida está completa./ Não sou alegre nem sou triste:/sou poeta.”

A Poesia sem “sangue eterno” e sem “asa ritmada” torna-se vazia. Como considerar os versos da canção “As Rosas não Falam” de Cartola apenas como uma letra de música sem poesia?

Homero, Camões, Castro Alves, grandes poetas, construíram suas obras com ritmo melódico que podem ser recitadas com uma sonoridade agradável. A palavra tem imagem acústica e gráfica, carrega consigo uma significação. O trabalho poético consiste em traduzir a vida e promovê-la com arte. Nesse espaço, é possível sonhar a eternidade.

O senhor Robert Allen Zimmerman, nascido em 1941, em Duluth, uma cidade do Estado de Minnesota, nos Estados Unidos, escolheu o seu nome artístico pela musicalidade:                                                                                                                                                                                                        

"Eu havia visto alguns poemas de Dylan Thomas. A pronúncia de Dylann e Allyn era parecida. Robert Dylan. A letra D tinha mais força. Entretanto, o nome Roberto Dylan não era tão atraente como Roberto Allyn. As pessoas sempre haviam me chamado de Robert ou Bobby, mas Bobby Dylan me parecia vulgar, e, além disso, já havia Bobby Darin, Bobby Vee, Bobby Rydell, Bobby Neely e muitos outros Bobbies. A primeira vez que me perguntaram meu nome em Saint Paul, instintiva e automaticamente soltei: 'Bob Dylan'"

Em várias declarações contra a concessão do Prêmio Nobel de Literatura a Bob Dylan, percebi certa reação ideológica, porque ele se tornou ídolo de uma geração que disse não à guerra do Vietnã, que andou pelo mundo pregando a paz e o amor.

Como falei a um amigo: ganhou a Poesia. Esta carrega sentimento. E, nas asas da música, toca a alma com mais facilidade. Quando isso acontece, assusta quem teme as mudanças sociais que visam à conquista da paz entre os homens.

É válido dizer que a poesia não é exclusividade do verso. E a prosa, não “lhe é superior”.


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