O que se sabe sobre a investigação que tem Carla Zambelli e hacker da ‘Vaza Jato’ como alvos

03/08/2023 11:40
Por Isabella Alonso Panho / Estadão

Operação da Polícia Federal (PF) da manhã desta quarta-feira, 2, prendeu Walter Delgatti Neto, conhecido como o hacker da “Vaza Jato”, e realizou buscas e apreensões em quatro endereços, incluindo o gabinete da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP). Os dois são investigados pela PF por uma suposta invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Entre os dias 4 e 6 de janeiro deste ano, 11 alvarás de soltura foram indevidamente inseridos no Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP), plataforma administrada pelo CNJ. Também foi incluído um mandado de prisão falso para o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Delgatti é apontado como autor do ato.

Ele declarou à Polícia Federal e à Procuradoria-Geral da República que recebeu valores de Carla Zambelli para “ficar à disposição” e a relacionou como mandante e financiadora da invasão, o que motivou a operação desta quarta.

Invasão ao sistema do CNJ

De acordo com Delgatti, Zambelli o procurou em setembro de 2022, durante a campanha eleitoral, para uma suposta “consultoria técnica”, que acabou se desenrolando na trama investigada pela operação deflagrada nesta quarta-feira. O hacker disse que a parlamentar “queria que ele invadisse a urna eletrônica, ou qualquer sistema da Justiça, para demonstrar a fragilidade do sistema judicial pátrio”. O encontro, segundo ele, foi em um posto de combustíveis na Rodovia Bandeirantes.

Ele confessou ter invadido o sistema do CNJ, como forma de demonstrar à deputada alguma vulnerabilidade nele. No depoimento, o hacker disse que, quando revelou para Zambelli a possibilidade de emitir um mandado de prisão para Alexandre de Moraes, ela “ficou empolgada” e escreveu o texto que constaria no documento falso. Delgatti disse à PF e à PGR que “fez algumas alterações, pois o português estava meio ruim, e emitiu o mandado de prisão e o bloqueio de valores”.

O hacker afirmou no depoimento que recebeu, por transferências via Pix, R$ 13,5 mil de assessores da deputada. Foram, segundo o hacker, R$ 10,5 mil enviados por Renan César Silva Goulart, que atuaria como assistente parlamentar do deputado estadual de São Paulo Bruno Zambelli (PL), irmão de Carla e ex-secretário da parlamentar; e R$ 3 mil de Jean Hernani Guimarães Vilela, que atua como secretário parlamentar de Zambelli desde maio.

Em entrevista nesta quarta, após o início da operação, Zambelli respondeu que “não participaria de uma piada de mau gosto com Alexandre de Moraes”, ao ser questionada sobre a suposta invasão ao sistema do CNJ. O ministro do STF autorizou as ações da PF.

“Eu sei o que pode acontecer com um deputado que brinca com um ministro do Supremo, haja vista Daniel Silveira, que está preso em Bangu”, disse Zambelli.

Ela disse que “subcontratou” o hacker em novembro, depois das eleições, por R$ 3 mil, e alegou que o objetivo foi fazer reparos no site pessoal dela. “Eu não fraudaria as eleições para o Lula ganhar, e nem seria tão barato assim”, afirmou a deputada.

Relação entre Zambelli e Delgatti

Nas redes sociais, a deputada federal publicou em agosto uma foto de um encontro entre ela e o hacker no dia 28 de julho. “O homem que hackeou 200 autoridades, entre ministros do Executivo e do Judiciário brasileiro. Muita gente deve realmente ficar de cabelo em pé (os que têm) depois desse encontro fortuito. Em breve, novidades”, escreveu Zambelli na ocasião.

Na entrevista nesta quarta, a parlamentar afirmou que conheceu Delgatti por acaso. “Um dia o conheci saindo de um hotel. Ele pediu meu telefone e eu dei”, disse, sem informar detalhes do encontro.

Segundo ela, os dois se reuniram “duas ou três vezes” e, em uma dessas oportunidades, Delgatti teria ido a Brasília, custeado por Zambelli. “Ele disse que tinha provas e serviços a oferecer ao PL”, afirmou.

Encontro com Bolsonaro

Na capital federal, ainda de acordo com Zambelli, o hacker se reuniu com Valdemar Costa Neto, presidente do PL, e com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O encontro, de acordo com a parlamentar, foi em agosto de 2022.

No depoimento à PF, Delgatti disse que o ex-presidente teria lhe questionado se “munido do código fonte, conseguiria invadir a urna eletrônica”. O hacker não conseguiu entrar no sistema do Tribunal Superior Eleitoral.

Zambelli, na entrevista nesta quarta-feira, blindou Bolsonaro. “O presidente Bolsonaro absolutamente não teve nada a ver com isso”, afirmou, sobre a contratação do hacker.

Quem é Walter Delgatti Neto?

Delgatti é ex-estudante de Direito e é chamado pela alcunha de “Vermelho”. Ele ficou conhecido em 2019, por hackear mensagens trocadas entre Sérgio Moro (União Brasil-PR) e Deltan Dallagnol (Podemos-PR), que na época eram juiz e procurador da força-tarefa da Operação Lava Jato, e entregá-las ao jornalista Glen Greenwald.

Por causa do vazamento das mensagens entre Moro e Dallagnol, Delgatti foi preso em 2019. Ele conseguiu o direito de responder às acusações solto. Em junho deste ano, voltou para atrás das grades por descumprir uma das condicionais da liberdade e foi liberado novamente há quase um mês, no dia 10 de julho.

Quem são os outros envolvidos na operação?

Além de Carla Zambelli, o ministro Alexandre de Moraes apontou outros três alvos para busca e apreensão na operação. Dois deles são próximos da deputada: Renan César Silva Goulart e Jean Hernani Guimarães Vilela, servidores comissionados de seu próprio gabinete parlamentar e do gabinete de seu irmão, o deputado estadual Bruno Zambelli. Segundo a investigação, Goulart e Vilela teriam sido os responsáveis pelo envio de R$ 13.500 a Delgatti em pagamento por seus serviços.

Já o último investigado, Thiago Eliezer Martins Santos, é apontado por Delgatti como o autor da inserção dos alvarás de soltura falsos no Banco Nacional de Mandados de Prisão – Delgatti admitiu a autoria da ordem de prisão falsa contra Moraes, mas não dos alvarás de soltura. Santos é programador e foi preso na operação Spoofing deflagrada pela Polícia Federal em 2019 para investigar as invasões às contas de Telegram de autoridades e pessoas relacionadas à operação Lava Jato.

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