ONG Luta Pela Paz: formando campeões nos ringues e na vida

11/06/2017 07:00

Quem nunca sentiu a necessidade de pertencer a um grupo ou de se sentir acolhido e aceito? Quem nunca buscou investir em algo que pudesse lhe proporcionar adrenalina e reconhecimento? Foi pensando em necessidades humanas como essas que, há 17 anos, surgia a ONG Luta Pela Paz: projeto que busca acolher jovens de comunidades afetadas pela criminalidade e pela violência por meio de atividades que promovem o respeito e o autocontrole, como o boxe e as artes marciais. Dentre os 130 membros que tornam a iniciativa possível está Diana Bonar, carioca criada em Petrópolis e que, recentemente, foi selecionada para se especializar na área de resolução de conflitos e estudos da paz em uma universidade na Tailândia. Ela é a única brasileira em uma turma de 25 alunos de diversos países.

Sua trajetória dentro do terceiro setor, ou seja, de entidades sem fins lucrativos, começou ainda enquanto estudante de Relações Internacionais. Diana foi, aos poucos, percebendo que gostaria de investir sua força vital, intelectual e espiritual dentro de um trabalho que transformasse vidas. “Comecei a procurar atividades em que eu pudesse investir a minha energia e que, ao mesmo tempo, causassem uma transformação social, fosse ela local, mundial ou, simplesmente, para algumas pessoas”. Foi dentro desse contexto que ela se deparou com a organização na qual vem atuando há 16 anos: A Luta Pela Paz.

A ONG, que existe há quase duas décadas, ampara mais de 250 mil jovens ao redor do mundo com o apoio de instituições parceiras. Para isso, Diana atua como uma ponte entre a ONG e entidades de outros locais. Ela torna possível que sejam capacitadas para atuar nos mesmos moldes do que é pregado pela LPP. No Brasil, a instituição atua no Complexo da Maré, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Ela conta que a organização desenvolveu uma metodologia própria chamada de “Cinco Pilares”: boxe e artes marciais, educação, empregabilidade, suporte social e liderança juvenil. Pilares esses que buscam oferecer aos jovens o suporte necessário para que consigam enfrentar a desestrutura social em que estão inseridos. “As gangues a as drogas funcionam como uma resposta automática às necessidades não atendidas dos jovens. Ao se juntar à gangue, o jovem se sente acolhido, seguro, parte de um grupo. Ele passa a ter dinheiro, adrenalina e armas que dão a ele poder. A Luta Pela Paz foi desenvolvida para que os jovens possam ter essas mesmas necessidades atendidas, mas por meio de uma estratégia diferente” explica ela.

O impacto da Luta Pela Paz

Em comunidades afetadas pelo crime e pela violência, um dos fatores que estimulam o abuso contra a mulher é a desestrutura familiar. De acordo com um levantamento encomendado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e realizado pelo Datafolha, a cada minuto cerca de 503 mulheres sofrem algum tipo de agressão física no país. Durante anos, uma das vítimas foi a mãe de Raissa Lima, moradora do Complexo da Maré e que, desde pequena, via sua mãe ser agredida, tanto verbalmente quanto fisicamente, por seu pai alcoólatra. “Aos 9 anos vi uma luta feminina na TV e pensei que, entrando para as artes marciais, poderia proteger minha mãe. Acabei conhecendo a Luta Pela Paz e lá o esporte foi somado a outros fatores como a paciência e a disciplina. Aprendi a resolver meus problemas na base da conversa e descobri que o tempo é a cura para tudo. Hoje meus pais são separados e não guardo nenhuma mágoa do meu pai”. Ela participa do programa há seis anos e tem, inclusive, interesse em começar sua própria organização. “O judô é um esporte muito caro, as mensalidades são absurdas. Eu tive a oportunidade de treinar de graça ao lado de profissionais que me acompanharam. Tenho muito interesse em montar minha própria ONG. Um espaço que funcione como refúgio para outros jovens que sofrem com problemas familiares. Quero fazer o que fizeram por mim” conta ela.

Um dos objetivos da Luta Pela Paz é desenvolver o potencial dos jovens para que eles possam lidar melhor com suas emoções e, assim, ver o quão capazes são de construir uma vida diferente. Um exemplo de que isso é possível é o caso de Joyce Rocha que, depois de fazer parte do projeto, conseguiu seu primeiro emprego enquanto Jovem Aprendiz. “Tenho 20 anos e, aos 15, passei a fazer aulas de boxe para melhorar minha defesa pessoal. Na época, conheci a aula de cidadania, que lida com o desenvolvimento pessoal dos jovens. Deixei minha timidez de lado e passei a pensar no meu futuro, a me questionar, a desenvolver meu senso crítico. Atualmente faço judô e sou parte do Conselho Jovem, grupo de liderança juvenil da organização. Já fiz vários cursos na área de Administração e agora faço curso de Inglês. O projeto se tornou minha segunda casa, fiz amizades, amadureci e tive oportunidades que eu não teria em nenhum outro lugar. A Luta Pela Paz vem nos ajudando a ser campeões nos ringues e na vida”.

Ao investir em iniciativas como essa, não só os jovens, mas também os colaboradores saem vitoriosos. Ano passado Diana foi uma das 25 pessoas escolhidas pelo Departamento de Estado norte-americano para integrar um programa de fortalecimento do empoderamento de meninas e mulheres ao redor do mundo. Além disso, ela foi, recentemente, selecionada pela Fundação Rotária Internacional para uma bolsa de estudos de 3 meses na Tailândia. Ela irá se especializar na área de resolução de conflitos e estudos da paz, que tem como objetivo a comunicação não-violenta, seja ela interpessoal, intergrupos, da pessoa com ela mesma ou da instituição com o mundo. “Essa Fundação acredita que quanto mais indivíduos investirem em estudos como esse, maior será a possibilidade de haver projetos que foquem no desenvolvimento de iniciativas que visam o entendimento, a tolerância e o respeito entre os povos. Por esse motivo, eles selecionam pessoas no mundo todo anualmente e formam uma rede poderosa de interventores da paz. Este ano eu sou a única brasileira de uma turma de 25 pessoas de diversos países” explica ela.

Para os leitores interessados, Diana compartilhará suas experiências e descobertas na Tailândia na seção de blogs do site da Tribuna de Petrópolis (e-tribuna.com.br). 

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