ONGs de transparência temem retrocessos em decisões de Dino após acordo entre poderes

20/ago 21:56
Por André Shalders / Estadão

Entidades que militam pela transparência das informações públicas temem possíveis retrocessos com o acordo selado entre os chefes dos Poderes em almoço na sede do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira (20). Representantes da Transparência Internacional (TI) no Brasil e da Transparência Brasil (TB) destacaram que o compromisso firmado entre dirigentes do Executivo, Judiciário e Legislativo não pode significar o abandono de exigências estabelecidas pelo ministro Flávio Dino (STF) para as emendas parlamentares em decisões recentes.

Participaram do encontro na sede do STF nesta terça os presidentes do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL); os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Jorge Messias (AGU); e os onze ministros do Supremo. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, também estava presente.

Após a reunião, foi divulgada nota conjunta anunciando novos critérios para a liberação das emendas parlamentares, cuja execução está suspensa por decisões recentes do ministro Flávio Dino. O texto traz determinações para os três tipos de emendas (individuais, de bancada e de comissão), mas não menciona várias das medidas determinadas por Dino em suas decisões recentes, que foram ratificadas pelo plenário do STF na última sexta-feira, 16. As decisões anteriores de Dino seguem em vigor até que o ministro as reavalie em face do novo acordo.

Tanto a Transparência Brasil quanto a Transparência Internacional participaram da audiência de conciliação promovida pelo ministro Flávio Dino no dia 1º de agosto deste ano com representantes do Executivo e do Legislativo, para dar fim à prática do Orçamento Secreto. As entidades foram responsáveis por apontar a continuidade do Orçamento Secreto após a decisão do STF de dezembro de 2022, que declarou a prática inconstitucional. Como mostrou o Estadão, o Orçamento Secreto continuou operando no governo Lula (PT).

“O principal é entender que nos últimos 20 dias as decisões do ministro Dino sinalizaram de forma muito clara e específica quais seriam as obrigações de todos os poderes envolvidos na formulação e execução das emendas. O que vamos acompanhar agora é se, na implementação deste acordo feito entre os chefes de Poderes, haverá algum retrocesso com relação às decisões (anteriores) do ministro Dino”, diz o advogado Guilherme France, da Transparência Internacional.

Para ele, o acordo não pode significar um retrocesso em relação aos avanços que o ministro Dino havia determinado em suas decisões.

Diretora da Transparência Brasil, Marina Atoji diz que a nota conjunta não deixa clara a extensão da decisão tomada hoje – se irão se sobrepor ou não às decisões de Dino, por exemplo. “De qualquer forma é um pouco estranho que haja um acordo em relação a isso. A gente tem ações (judiciais) correndo (no STF). Esse tipo de diálogo deveria ser feito nos autos dos processos, como aconteceu na audiência de conciliação (do dia 1º de agosto)”, diz ela.

Segundo Atoji, a nota conjunta não traz novidades em relação ao que já estava determinado pelo ministro Dino. “Não se mencionam uma série de requisitos que estão presentes nas decisões dele. Menciona-se só o objeto do gasto. Que é uma coisa que já está na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024; que era uma condicionante para o repasse, e não foi cumprida”, lembra Marina Atoji.

Na nota conjunta publicada nesta terça-feira, os chefes dos três Poderes mantêm a obrigatoriedade das emendas individuais e de comissão, mas com algumas novas regras. No caso das “emendas Pix”, há a obrigação de “identificação antecipada do objeto” (ou seja, no quê será usado o dinheiro); de prioridade para obras inacabadas e de prestação de contas ao Tribunal de Contas da União (TCU).

Para as emendas de bancada, há a obrigação de que sejam “destinadas a projetos estruturantes (…), vedada a individualização” – uma obrigação que já existe hoje, na resolução do Congresso que trata do assunto. Já as emendas de comissão devem ser “destinadas a projetos de interesse nacional ou regional, definidos de comum acordo entre Legislativo e Executivo”.

Os procedimentos mencionados por essa nota deixam de fora pontos que foram determinados por Dino. Um ponto é a proibição dos parlamentares mandarem recursos para fora dos Estados em que foram eleitos. Também não há menção na nota à determinação de Dino de que haja “transparência e rastreabilidade” para as emendas de comissão, e para para os restos a pagar das antigas emendas de relator (RP-9). O ministro também obrigou as ONGs que recebem recursos de emendas a seguir “procedimentos objetivos de contratação” e dar transparência aos recursos recebidos.

No caso das “emendas Pix”, a decisão de Flávio Dino traz detalhes que não estão presentes na nota conjunta. Para que o dinheiro seja liberado, os interessados deveriam fornecer “informações referentes às transferências, tais como: plano de trabalho, objeto a ser executado, sua finalidade, a estimativa de recursos para a execução e o prazo da execução, bem como a classificação orçamentária da despesa”, segundo a decisão de Dino.

Últimas